Tempo médio de processos do júri no Ceará é maior do que no Brasil

O diagnóstico divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostrou que a tramitação de um caso de crime contra a vida nas varas do Júri cearense leva cerca de quatro anos e 10 meses; no Brasil, são quatro anos e quatro meses. Magistrado explica estratégias adotadas para reverter este quadro

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(Atualizado às 22:34)

O Tribunal do Júri, instituído no Brasil há quase dois séculos, é exemplo de quando a vontade popular prevalece. A cada crime contra a vida, um colegiado de jurados sorteados para compor o conselho de sentença é responsável por dizer se determinado réu é culpado ou inocente. No Estado do Ceará, este tipo de julgamento acontece com uma frequência que, para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), está abaixo do esperado.

Segundo o Diagnóstico das Ações Penais de Competência do Tribunal do Júri do CNJ, o tempo de tramitação nas ações penais de competência do júri nas varas do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) é maior do que a média nacional. Entre o início da ação penal até a sentença condenatória, o Ceará leva, em média, quatro anos e dez meses para concluir o processo. Enquanto isto, no Brasil, como um todo, a demora é de quatro anos e quatro meses.

Comparado aos outros estados do País, a média cearense é a sétima pior. No topo do ranking das federações com mais tempo desde início e fim estão Bahia, com cinco anos e sete meses; Mato Grosso, cinco anos e cinco meses; Alagoas, também cinco anos e cinco meses; Rio Grande do Sul, cinco anos e dois meses; Piauí, cinco anos e dois meses; e, com número igual ao do Ceará, está Roraima. Os tribunais mais ágeis neste quesito estão no Paraná, Acre e Minas Gerais.

O diagnóstico do CNJ feito a partir de dados dos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018 mostra também que a média de condenações proferidas no TJCE é menor se comparada à média do País. No período analisado, o Tribunal cearense apresentou como resultados dos casos: 39% de condenações, 18% de absolvições e 43% de extinção de punibilidade dos réus. Em âmbito nacional, o percentual de condenações é de 48%.

O desembargador Henrique Jorge Holanda Silveira, coordenador do Setor de Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública do Poder Juduciário estadual, explica que o Tribunal do Júri se trata de algo complexo, com duas fases. Conforme o magistrado, na primeira fase se colhem todas as provas, ouvem as testemunhas e procede interrogatório dos réus. Depois disto, o juiz decide pela pronúncia ou impronúncia, o que significa se a caso vai ou não a júri popular. "Lá é decidido por jurados, é a sociedade julgando seus semelhantes, sete pessoas totalmente imparciais", acrescentou.

Decisões

De acordo com o magistrado, o alto índice de extinção de punibilidade pode ser resumido em três fatores: prescrição, falecimento do acusado e abolitio criminis - quando a lei que tipifica criminalmente o fato é revogada. Henrique Holanda pontua que, dentre os quesitos, o mais comum é o acusado vir a morrer. O desembargador argumenta que devido à abrangência das facções criminosas, dias depois de uma morte, não é raro que o responsável por aquele primeiro crime seja executado.

"É uma geração de muitos jovens, que cometem o delito, e uma semana depois é morto. Então, o processo já é extinto porque ele faleceu", afirmou Holanda. Sobre as absolvições, o desembargador pontua que o papel da Justiça não se resume a absolver ou condenar, e sim decidir pelo correto: "Baixa ou alta condenação, baixa ou alta absolvição não interessa para a Justiça. O que interessa é fazer Justiça".

Já na tentativa de dar celeridade aos processos, o TJCE informou vir adotando uma série de estratégias. Conforme o órgão, as edições da Semana Estadual do Júri e o programa Tempo de Justiça são exemplos de ações que incentivam a redução do tempo até que aconteça o julgamento.

O Tempo de Justiça consiste em uma parceria entre o Tribunal, vice-governadoria, Ministério Público, Defensoria Pública e Ordem dos Advogados do Brasil-Secção Ceará (OAB-CE). Dentre os casos de repercussão mais recentes que foram contemplados com o Tempo de Justiça estão a morte da travesti Dandara dos Santos e uma tentativa de chacina ocorrida no bairro Padre Andrade, em Fortaleza.

Nos dois casos citados, os julgamentos no Tribunal do Júri aconteceram, aproximadamente, um ano depois que os autores dos crimes foram identificados. Para o desembargador, um ano, da data do fato do homicídio, com autoria conhecida, até o julgamento final, é uma meta do Judiciário. A promessa é que o programa Tempo de Justiça se expanda a outros municípios do Ceará. A previsão dada pelo magistrado é que ainda neste ano o projeto chegue às cidades de Sobral, Crato, Juazeiro e Barbalha.

Sobre o resultado das semanas estaduais do júri, tendo a última edição delas sido realizada neste mês de junho, Henrique Holanda destacou os resultados positivos. A IV edição aconteceu por meio de uma mobilização dos servidores em prol de julgar em um curto espaço de tempo o maior número possível de casos. Para o período de 10 a 14 de junho de 2019, foram agendados 172 julgamentos em 68 comarcas do Ceará, além das cinco varas existentes na Capital.

O levantamento do TJCE mostrou que durante a IV semana, em Fortaleza, foram realizados 22 julgamentos de casos de crimes dolosos contra a vida. O resultado parcial referente a todo o Estado mostra que aconteceram, pelo menos, 107 julgamentos. O número tende a aumentar quando o restante das comarcas informarem oficialmente ao Tribunal de Justiça o que foi realizado em cada local. Na terceira edição, o TJCE registrou 83 julgamentos.

Na conclusão do diagnóstico, o CNJ destacou que, no geral, "os processos de competência do Tribunal do Júri merecem atenção especial no contexto geral da jurisdição criminal por terem objeto a tutela do bem jurídico penal mais valioso do ordenamento jurídico brasileiro: a vida".