Quatro policiais militares foram condenados pela Justiça Estadual à prisão e à exclusão da Polícia Militar do Ceará (PMCE), em razão de uma acusação de integrarem uma organização criminosa que protegia um braço da facção paulista Primeiro Comando da Capital (PCC) na região do Bom Jardim, em Fortaleza. Entre os acusados, está um PM que também atuava como advogado.
A decisão foi proferida pela Auditoria Militar do Estado do Ceará no último dia 18 de outubro. Confira as penas individuais dos réus:
- Subtenente PM José Wellington Braga Teixeira - 4 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, pela prática do crime de integrar organização criminosa;
- Sargento PM Jeovane Moreira de Araújo - 7 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial fechado (em razão também de responder a outro processo criminal), pela prática dos crimes de integrar organização criminosa e corrupção passiva;
- Sargento PM José Albuquerque de Sousa - 7 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, pela prática dos crimes de integrar organização criminosa e corrupção passiva;
- Soldado PM Dickson Ferguson Soares de França - 10 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes de integrar organização criminosa, corrupção passiva e associação para o tráfico.
Um quinto policial militar, o sargento Antônio Almeida de Aguiar, acusado pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) pelos crimes de integrar organização criminosa, tráfico de drogas, associação para o tráfico e corrupção passiva, foi absolvido pela Justiça, por falta de provas para condená-lo.
Apesar da condenação por outros delitos, José Wellington foi absolvido do crime militar de usura, enquanto Dickson Ferguson foi absolvido da acusação de tráfico de drogas.
A Auditoria Militar definiu ainda que os quatro PMs condenados devem perder a graduação militar e que Jeovane Araújo e Dickson Ferguson devem ser presos preventivamente, em razão dos crimes cometidos e de responderem a outros processos criminais.
Procuradas pela reportagem, as defesas de José Wellington Braga Teixeira e José Albuquerque de Sousa preferiram não se manifestar sobre a condenação; já as defesas dos outros policiais militares não responderam às mensagens ou não foram localizadas, até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto para manifestações posteriores.
[Atualização: 23/10/2024, às 10h41] Após a publicação da reportagem, a defesa do sargento Jeovane Moreira de Araújo, representada pelos advogados Jander Viana Frota e Christiane Pinheiro Diogo, emitiu nota em que afirma que, "inconformada com a sentença condenatória em desfavor de seu constituinte", a defesa "interpôs Recurso de Apelação, ao Tribunal de Justiça do Ceará, com o intento da reforma da sentença vergastada e consequente absolvição do 1º Sarg. Jeovane Moreira Araújo".
Ligação entre PMs e traficantes
Os policiais militares foram alvos de uma fase da Operação Gênesis, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MPCE, para combater a ligação de agentes de segurança do Estado com traficantes para cometer crimes no Estado.
Segundo a sentença judicial, os PMs têm relação com um chefe do PCC em Fortaleza, Márcio Pereira Perdigão, "atuante principalmente no bairro Bom Jardim e adjacências, com especialização também no tráfico de drogas ilícitas, mas também como cometimento de outros delitos graves como outros homicídios, ameaças, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, com a participação de agentes públicos militares".
Historia a exordial acusatória que essa organização criminosa comandada por Perdigão alicia policiais militares que se tornam membros e que tem como missão o impedimento de qualquer obstáculo ao funcionamento desse grupo delituoso."
A Justiça detalha ainda que os policiais militares integravam a organização criminosa entre 2016 e 2017, quando "utilizavam dos cargos que ocupavam, de diversas formas: para influir nos atos administrativos praticados por outros policiais (ST PM José Wellington Braga Teixeira); colaborando para que o policiamento favorecesse o grupo criminoso e o tráfico, mediante pagamentos (1º SGT PM Jeovane Moreira de Araújo); auxiliando na atuação do grupo e servindo como 'laranja' (SD PM Dickson Ferguson Soares de França)".
Já o sargento José Albuquerque de Sousa agiria cobrando e recebendo vantagens indevidas de uma mulher investigada, "responsável financeira pelo pagamento dos policiais militares sob ordens de Márcio Perdigão com o fito de facilitar o comércio das drogas ilícitas no Bom Jardim e bairros próximos (1º SGT PM )", segundo a decisão judicial.
Familiares de Márcio Pereira Perdigão foram absolvidos pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), em setembro deste ano, depois de serem condenados na Primeira Instância por integrarem uma organização criminosa. Os desembargadores acataram um recurso que pedia "pela nulidade da sentença por estar embasada em devassa ilícita de smartfone com violação a intimidade, onde foram acessados dados do aplicativo WhatsApp sem autorização, bem como devido à ausência de autorização para interceptação".
PM atuava como advogado
A reportagem apurou que Dickson Ferguson Soares de França, soldado da Polícia Militar do Ceará, também trabalha como advogado. Ele está inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Rio Grande do Norte (OAB-RN) - Subseção Goianinha, segundo o Cadastro Nacional dos Advogados (CNA).
Conforme o CNA, Dickson Ferguson está com a Situação Regular junto à OAB-RN e tem o endereço profissional no bairro Parque Iracema, em Fortaleza, apesar de responder a processos criminais. O policial militar foi preso em dezembro de 2017.
A Ordem dos Advogados do Brasil - Secção Rio Grande do Norte foi questionada por que o policial militar foi aprovado na Ordem, mesmo sendo agente de segurança estadual e respondendo a processos criminais no Ceará, mas o Órgão não se manifestou, até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto para manifestação posterior.