Empresários e servidor público investigados por 'esquema' de desvio de veículos do Governo do Ceará

Dois empresários e um servidor foram detidos. Duas Hilux do Governo do Ceará foram apreendidas em uma sucata. Os veículos estavam sendo desmontados

Um suposto esquema de desvio de veículos de propriedade do Governo do Ceará é investigado pela Polícia Civil. As autoridades se depararam com casos recentes de furto e receptação de automóveis, que estavam no pátio da Secretaria das Cidades, no Cambeba, prontos para irem a leilão público.

Duas Hilux foram furtadas do pátio e levadas a um desmanche, para serem adulteradas e posteriormente vendidas, conforme as investigações. A suspeita da Polícia Civil é de que empresários e, pelo menos, um servidor público lotado na Pasta estejam diretamente envolvidos na ação, já considerada pelos investigadores como uma organização criminosa.

Nessa quarta-feira (27), dois homens foram presos em flagrante. Thiago Silva Nunes, empresário do ramo do gesso, e Denis Vinícius Rodrigues Xavier, proprietário de uma sucata, em Fortaleza. Outros nomes são investigados pela Polícia Civil, incluindo o de um servidor público, que seria responsável por escolher os veículos e negociar valores na venda paralela dos carros.

[Atualização: 29/07/2022, às 9h03] Após a publicação da matéria, o servidor público, identificado como João Paulo Pontes Vieira, também foi preso, por força de mandado de prisão temporária. Um mandado de busca e apreensão também foi cumprido contra ele. As ordens judiciais foram expedidas pela Vara de Delitos de Organização Criminosa.

[Atualização 29/07/2022, às 16h20] Na tarde desta sexta-feira 29, a Seplag informou que João Paulo se trata de um colaborador terceirizado da Pasta. Ainda conforme a Seplag, o suspeito foi desligado das funções ainda nessa quinta-feira (28)

A Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos e Cargas (DRFVC) é responsável pela investigação. A reportagem apurou que a Polícia suspeita "de mais servidores envolvidos".

COMO FUNCIONA O ESQUEMA

No último dia 20 de julho, os veículos desapareceram do pátio da Secretaria. O servidor suspeito de participar da ação teria, de acordo com documentos obtidos pela reportagem, premeditado toda a ação e feito o primeiro contato com os compradores. 

Conforme versão de Thiago Silva, foi o servidor público quem o procurou informando que teria uma D20, uma Ranger e duas Hilux para vender.

O homem teria dito que ao empresário que os veículos não dariam problema "porque não estavam no inventário dos carros para serem leiloados pelo Estado".

De acordo com Thiago, ele tentou baixar o preço, mas o servidor em questão disse que não tinha autorização para mexer no valor, porque tinha um chefe participando do esquema. Foi então que Thiago procurou Denis Vinicius e ofertou as duas Hilux.

Thiago teria ficado com R$ 10 mil por intermediar compra e venda, enquanto a liberação dos carros ficava a cargo do servidor, com acesso ao pátio da Secretaria. Na data do furto, segundo documentos obtidos pela reportagem, o colaborador teria pedido aos comparsas que esperassem o zelador sair do prédio, para que ele não percebesse a retirada dos automóveis.

Mesmo com os cuidados, uma testemunha presenciou no momento em que os carros foram levados por um guincho, conforme as investigações. Com a placa do guincho, a Polícia conseguiu rastrear a localização e chegou ao motorista. O condutor contou que foi contratado apenas para realizar o frete e que os dois carros foram deixados em uma sucata.

Ele acompanhou os policiais até o endereço da sucata, onde as autoridades encontraram as Hilux já em processo de desmanche. Denis, o proprietário do estabelecimento foi interrogado. De acordo com os policiais civis, na primeira versão, ele disse ter retirado os carros no dia 20, por meio de uma pessoa identificada como 'Tiago', sob pagamento do valor de R$ 30 mil.

A Polícia afirma ter constatado contradições na fala de Denis e o autuou em flagrante por receptação. Na versão do proprietário da sucata, foi Thiago quem ordenou o desmanche. A ideia, segundo os investigadores, era cortar a numeração do chassi, motor e sinais identificadores dos veículos e, em seguida, devolvê-los ao comparsa.

O gestor de patrimônio da Secretaria das Cidades do Estado do Ceará prestou declarações sobre o sumiço das duas Hilux. Segundo ele, os carros estavam estacionados há mais de dois anos dentro de uma área de segurança, no estacionamento de veículos da Seplag, dentro do Centro Administrativo do Cambeba.

A Polícia pediu ao Judiciário que as prisões em flagrante dos suspeitos fossem convertidas em preventiva, sob justificativa de garantir a ordem pública.

APURAÇÃO

A defesa de Denis é representada pelo advogado Túlio Magno. O advogado sustenta que não há requisitos para a permanência da prisão e que seu cliente colaborou com a investigação, dando os esclarecimentos solicitados.

"As acusações lançadas sobre o Denis são prematuras e irresponsáveis, porque produzidas sem a mínima chance de qualquer explicação. Em verdade, Denis foi conduzido a erro pelo servidor público, que garantiu inexistir qualquer ilegalidade na aquisição das duas sucatas veiculares em questão, inservíveis e em desuso, sob a promessa de que em quinze dias todos os trâmites e formalidades lhe seriam repassados", disse Túlio Magno.

Ainda conforme a defesa, a acusação foi irresponsável "sobretudo por ter inobservado toda uma trajetória de vida proba por parte do Denis, empresário exemplar, emissor de notas fiscais em seus negócios, que jamais teve qualquer envolvimento com o ilícito, jamais tendo figurado sequer em outra investigação policial. Cremos no bom senso do Judiciário, e que no transcorrer do processo tudo será esclarecido".

Já a defesa de Thiago Silva afirma que o empresário "é inocente e provará no decorrer da instrução criminal.

A reportagem entrou em contato com a Secretaria das Cidades e com a Secretaria do Planejamento e Gestão (Seplag). A Secretaria das Cidades informou que o servidor em questão é lotado na Seplag.

Por sua vez, a Seplag disse ser de responsabilidade da outra Pasta responder sobre o caso, porque os carros em questão eram patrimônio de gerência da 'Cidades'.