O Ministério Público do Ceará (MPCE) apresentou alegações finais acerca de um caso de racismo sofrido por uma delegada, dentro de uma loja Zara, em Fortaleza. O órgão pede à Justiça que o ex-gerente do estabelecimento, Bruno Filipe Simões Antonio, seja condenado.
No último dia 29 de setembro, a promotora da 93ª Promotoria de Justiça de Fortaleza anexou aos autos que, para o MP, "a materialidade e a autoria delitivas estão comprovadas". Anteriormente, o órgão já tinha sido contra um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) ao ex-gerente, que nunca chegou a ser preso pelo crime.
Para os advogados assistentes de acusação, Leandro Vasques, Afonso Belarmino e Marina Torquato, "os memoriais do Ministério Público foram cirúrgicos ao apontar a diferença de tratamento oferecida a clientes brancos e à vítima, que é negra, principalmente, a partir da análise das imagens das câmeras de videomonitoramento da Loja Zara. Além disso, a instrução processual com a colheita dos testemunhos foi decisiva para demonstrar a materialidade delitiva, inclusive, o depoimento seguro da vítima não deixou pairar qualquer dúvida sobre a existência do crime de racismo".
"Diante desse farto conjunto probatório, espera-se que o juízo acolha as alegações finais da Promotoria e as desta Assistência da Acusação, prolatando a merecida sentença condenatória"
A defesa de Bruno Filipe não foi localizada pela reportagem.
FILMAGENS
Na versão de Bruno Filipe e da loja Zara, Ana Paula foi impedida de permanecer no local porque estava com a máscara abaixo do queixo, o que não era permitido por prevenção ao contágio por Covid-19. Entretanto, o gerente atendeu normalmente uma cliente branca pouco antes de expulsar a delegada, negra.
A acusação se vale de imagens de videomonitoramento da loja, que capturaram o momento do crime e demonstram a diferença de tratamento dada a clientes brancos da loja e a Ana Paula Barroso, delegada vítima de racismo.
"Cabe ressaltar que essas imagens são retiradas do relatório técnico, em que constam mais de dez outros clientes sem máscara, alguns se alimentando, outros não, os quais não foram abordados nenhuma vez para advertência quanto ao uso correto do EPI naquele mesmo dia 14/09/2021", segundo a promotora.
"Inexiste motivo para que somente a vítima Ana Paula Silva Barroso tenha sido a única impedida de acessar a Loja Zara naquele dia senão sua cor e aparência", conforme a acusação.
INVESTIGAÇÃO
Bruno foi indiciado pela Polícia em outubro de 2021. Na época, o então delegado geral, Sérgio Pereira, revelou que testemunhas (entre ex e atuais funcionários da Zara) relataram, durante a investigação, que a marca tinha o código "Zara zerou".
O código era disparado no alto-falante da loja quando entrava um cliente fora do padrão desejado pela loja, o que poderia colocar a segurança em risco. Conforme as investigações, eram alvos do alerta "Zara zerou" pessoas negras e julgadas como "mal vestidas".
Para o Ministério Público, ao se negar a atender ou receber a vítima, não houve outra razão fundamentada que não fossem as próprias características físicas dela. "Diante de todos os elementos juntados aos autos, nota-se a prática de crime resultante de discriminação ou preconceito de raça, cor ou etnia com latente diferenciação de tratamento entre clientes do estabelecimento comercial", disse o órgão acusatório, na denúncia.