Advogado de Juazeiro do Norte é condenado a quase três anos por crimes de homofobia e racismo

O réu enviou áudios em um grupo de WhatsApp defendendo o assassinato da população LGBTQIA+ e proferindo outras ofensas contra negros

Um advogado de Juazeiro do Norte, na Região do Cariri, foi condenado a quase três anos de prisão em regime semiaberto por insultos proferidos em um grupo de WhatsApp contra gays e mulheres negras. Além disso, o réu deve pagar 56 "dias-multa", o equivalente a R$ 2,6 mil. Os valores serão destinados ao Judiciário cearense.

O julgamento do jurista, que não teve sua identidade revelada, foi antecipado em 21 meses a pedido da Defensoria Pública do Ceará (DPCE), que representa uma das vítimas.

"Como estávamos falando de mais de três anos entre o ato e a data para a qual a audiência havia sido marcada, solicitamos a antecipação e tivemos uma conclusão do Judiciário refirmando a decisão do Supremo [Tribunal Federal] de que homofobia é racismo e punindo uma pessoa por isso, além do racismo em si contra pessoas negras. A sentença representa uma resposta do estado brasileiro a esse advogado, dizendo que o ato reprovável dele constitui crime", explicou o defensor público Aluizio Jácome, um dos que atuaram no processo.

Segundo a Defensoria, além da ação criminal, agora julgada, o advogado responde a uma ação civil pública que pode resultar em indenização às vítimas por danos morais.

O que aconteceu?

O crime aconteceu no dia 31 de julho de 2022, em um grupo de WhatsApp chamado "Resenhas do Futebol". À época, um homem se posicionou politicamente em favor da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência da República e, em resposta, o advogado enviou nove áudios defendendo o assassinato da população LGBTQIA+ e, dentre outras manifestações de racismo, dizendo que "nego é tudo seboso". Confrontado pelo administrador do grupo, o acusado reiterou as ofensas.

Se sentindo pessoalmente ofendido, o interlocutor procurou, então, a assistência jurídica da Defensoria Pública, que endossou denúncia oferecida ao Ministério Público do Ceará (MPCE) contra o advogado, e relatou à Justiça que as falas já haviam sido proferidas em outras situações. O acusado, por sua vez, afirmou não se lembrar do ocorrido, negou ser racista ou homofóbico e alegou ser alcoólatra. 

Decisão judicial

O juiz Gustavo Henrique Cardoso Cavalcante compreendeu, no entanto, que os áudios comprovaram o cometimento dos crimes e acolheu os argumentos da Defensoria e do Ministério Público. Na sentença, ele escreveu que o conteúdo das mensagens demonstram "gravíssimas manifestações homofóbicas e preconceituosas, mal-amparadas em juízos pré-concebidos e com o intento depreciar a essência da população LGBTQIA+ e das mulheres negras".

Além disso, o magistrado reforçou que as manifestações do advogado não se caracterizam como "liberdade de expressão" pois, em nenhum momento, visam "enriquecer qualquer debate jurídico travado naqueles dias, mas tão somente atingir, menosprezar e desumanizar duas distintas populações, historicamente discriminadas".

O sentimento de supremacia do agressor implica sua incapacidade da harmônica convivência com o outro, tudo dissimulado sob as vestes de pretensa cultura, preferência política, suposta intelectualidade, pseudo-cientificidade, dentre outros elementos que, conectados ou não, conduzem à arrogância, ao radicalismo, à ortodoxia política e religiosa, ao ódio e, finalmente, à indiferença à vida humana".
Gustavo Henrique Cardoso Cavalcante
Juiz responsável pelo caso

Injúria racial

Em 2019, o STF reconheceu que atos ofensivos praticados contra a população LGBTQIA+ podem ser enquadrados como injúria racial.