O Ceará conta uma extensão de cerca de 20 mil hectares de manguezais. São pelo menos 22 municípios com a presença do ecossistema, considerado um importante berçário de espécies marinhas e que consegue mitigar, também, possíveis impactos gerados por catástrofes naturais. Os cinco tipos de mangues presentes no território cearense são protegidos pelo Código Florestal e considerados fundamentais na garantia de renda de pescadores artesanais.
Na data em que se comemora o Dia Internacional de Proteção aos Manguezais (26 de julho), o biólogo Pedro Belga, presidente da ONG Projeto Uçá, que atua com ações de preservação no estado do Rio de Janeiro, partilhou a experiência carioca com o Sistema Verdes Mares e como o projeto pode contribuir na construção de políticas públicas e tecnologias de intervenção no Ceará.
Projeto Uçá
O Projeto UÇÁ conta com o patrocínio do Programa Petrobras Socioambiental e atua na Baía da Guanabara, no Rio de Janeiro. A base do projeto se desenvolve no recôncavo da Baía, na Área de Proteção Ambiental de Guapi-Mirim. Nas décadas de 50 a 70, a região perdeu mais da metade da cobertura vegetal do ecossistema de manguezal.
“Apesar de atuarmos nos limites de uma Unidade de Conservação Federal, os impactos são cotidianos. Na bacia contribuinte estão 15 municípios que somam uma população e aproximadamente 10 milhões de pessoas. Os problemas passam pelas escalas econômica, ambiental e social”.
P - Pedro, gostaria que me contasse quais os trabalhos desenvolvidos no Rio de Janeiro e quais os principais resultados do Projeto?
Pedro Belga - Na tentativa de dirimir esses impactos, o Projeto UÇÁ, em oito anos, já restaurou 182 mil metros quadrados de manguezais, tendo plantado mais de 61 mil árvores de mangue. Conduz a maior operação de limpeza contínua do estado em área de mangue. Já retirou 35 toneladas de lixo em uma faixa de 28 ha do ecossistema.
Fomentamos o Turismo de Base Comunitária, oferecendo cursos e qualificações para comunidades tradicionais da região, a partir de soluções baseadas na natureza, e ferramenta de sustentabilidade.
Conduzimos um importante trabalho de educação ambiental. É a partir dela que conseguimos sensibilizar a sociedade (crianças, jovens, adultos e lideranças comunitárias) sobre a importância desse ecossistema para a economia local. São centenas de famílias que vivem da catação do caranguejo na região e milhares de famílias que vivem da pesca artesanal. Duas grandes atividades econômicas que necessitam totalmente de uma ecossistema em equilíbrio.
P - E quais os impactos práticos que esse conjunto de ações traz?
Pedro Belga - Além de envolver diversas comunidades pesqueiras, que são parceiras e atuam no projeto, desenvolvemos pesquisa científica para nortear políticas públicas locais. Desde 2013, já foram produzidas quatro dissertações de mestrado, 20 TCCs de graduação, dois TCCs de pós-graduação, dezenas de artigos e resumos. Atualmente temos um doutorado e um mestrado em andamento.
A soma de todas essas atividades é a criação de exposições itinerantes que promovem a divulgação científica com linguagem simples, tendo mobiliado desde 2015, mais de 150 mil pessoas para a questão da conservação dos ecossistemas costeiros
P - Como esse tipo de experiência pode ajudar a criar estratégias no Ceará?
Pedro Belga - O projeto UÇÁ atua em ambiente de grande conurbação, assim como as áreas de manguezal do Ceará. Acreditamos que alguns de nossos resultados podem ser vistos como tecnologias sociais. Por exemplo, as ações que envolvem a comunidade local e povos tradicionais como pescadores, catadores de caranguejo e quilombolas.
Essas tecnologias sociais, a partir da parceria com o Ecomuseu Natural do Mangue e envolvimento do poder público, pode permitir uma troca de saberes e experiências, que podem levar a resultados bastante significativos para a conservação dos manguezais do Ceará.
Semana de Preservação
O pesquisador, considerado referência no País, participou, nesta sexta (24), de evento promovido pelo Ecomuseu Natural do Mangue, com apoio da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento do Semiárido da Assembleia Legislativa e da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema).
Entre as sugestões surgidas no encontro, que aconteceu de forma virtual por conta da pandemia de Covid-19, está a de criação de um Plano Estadual de Preservação dos Manguezais. A proposta, segundo a Sema, é gerar uma articulação junto aos 22 municípios cearenses com a presença do ecossistema, além da Assembleia Legislativa, entidades governamentais ligadas ao meio ambiente e o Museu do Mangue.