Mudanças nas regras para escolha de reitores em universidades federais em todo o País voltaram a ser discutidas em Brasília esta semana. O movimento ocorre em meio à eleição para o cargo nas universidades do País, inclusive na Universidade Federal do Ceará (UFC), a primeira após a polêmica indicação do reitor Cândido Albuquerque, escolhido pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) em 2019, mesmo ficando em último lugar na lista tríplice.
Um projeto protocolado na Câmara dos Deputados, há quatro anos, pelo cearense José Guimarães (PT), prevê que se torne obrigatória a indicação do reitor eleito diretamente pela comunidade acadêmica, através de voto preferencialmente eletrônico.
Com isso, a consulta feita aos membros do corpo universitário teria poderes de uma eleição direta.
O parlamentar apresentou ainda uma emenda ao documento nesta terça-feira (4), que detalha a proposta, elencando medidas técnicas sobre o processo de votação e desempate, por exemplo. A UFC definou que a consulta à comunidade acadêmica para formação da lista tríplice será feita nos dias 25 e 26 de abril.
A lei atual diz que o Executivo não é obrigado a indicar o mais votado na lista tríplice.
Se aprovado e sancionado, esse texto mudará radicalmente o modo como são escolhidos os gestores da instituições públicas de Ensino Superior no Brasil. Ao mesmo tempo, tornará lei uma prática que já ocorre culturalmente no País, na qual o presidente da República tende a nomear o mais votado pela comunidade.
Não foi isso, no entanto, que ocorreu no Ceará em 2019, quando Bolsonaro preferiu José Cândido Albuquerque para o cargo de reitor da UFC, mesmo ele ficando em terceiro lugar na lista tríplice apontada pela instituição.
A indicação ocasionou uma série de protestos, ocupação no campus da universidade e uma batalha judicial.
O que diz o projeto de lei
O texto protocolado pelo deputado cearense em 2019 está na para ser analisado na Comissão de Educação da Câmara, e tem o deputado paulista Ivan Valente (Psol) como relator. O presidente da comissão é o deputado cearense Moses Rodrigues (União Brasil). O parlamentar foi procurado, mas não retornou o contato.
O documento argumenta que "a lista tríplice, que é uma eleição indireta, pelos conselhos universitários, também significa uma possibilidade de alteração do resultado de uma eleição direta, que é a consulta à comunidade acadêmica, formada por docentes, discentes e servidores técnico-administrativos, possibilidade essa que não é
salutar".
Para justificar a proposta, o parlamentar argumenta ainda que "o clamor pela extinção da lista tríplice é uníssono nos ambientes universitários, exatamente pela possibilidade de poder alterar o resultado da escolha direta".
Questionado, Guimarães afirmou que as universidades enfrentam "uma crise de legitimidade" com os novos reitores e menciona a atuação do ex-presidente como um dos fatores para isso.
"Os reitores estavam sendo nomeados muito mais como interventores do que como reitores que representassem a comunidade, foi no auge das intervenções de Bolsonaro", disse o deputado do PT. O projeto foi apresentado na Câmara por Guimarães apenas um mês após a indicação de Cândido Albuquerque.
O deputado afirmou ainda que pretende conversar com o ministro da Educação, Camilo Santana, sobre o assunto.
Ponto a ponto do projeto
- O Reitor e o Vice-Reitor serão nomeados pelo Presidente da República, para mandato de quatro anos, permitida uma recondução, por igual período, após processo de eleição direta, preferencialmente eletrônica.
- Os Diretores e Vice-Diretores de unidades acadêmicas universitárias federais serão nomeados pelo Reitor, observado o mesmo procedimento e as demais disposições desta lei.
- A escolha do Reitor e do Vice-Reitor das universidades federais, realizada por meio de eleição direta pela comunidade acadêmica, será conduzida por comissão eleitoral instituída especificamente para esse fim.
- Os conselhos universitários das respectivas universidades federais disciplinarão acerca da constituição da comissão eleitoral para o processo de eleição direta do Reitor e do Vice-Reitor, devendo observar idêntico peso na composição da comissão eleitoral, entre os representantes da comunidade acadêmica
Eleições na UFC
No dia 22 de março, o Conselho Universitário (Consuni) da UFC se reuniu e definiu que a consulta à comunidade acadêmica acontecerá de 25 e 26 de abril, tendo em vista a elaboração da lista tríplice para reitor e vice-reitor da UFC.
No dia 28 de abril, o Consuni voltará a se reunir, desta vez de forma presencial, para elaborar a lista tríplice que será encaminhada ao Ministério da Educação.
De acordo com a assessoria da instituição, a consulta será eletrônica e remota e será realizada entre 8h e 21h dos dois dias de votação. A categoria de professores terá peso de 70% na apuração dos votos e os servidores técnico-administrativos e estudantes terão 15%, cada.
Duas chapas foram homologadas: a chapa “Unir para Avançar”, que tem como candidata a reitora a Profª Elizabeth Daher, atual pró-reitora de Extensão, e, como candidato a vice-reitor, o Prof. Almir Bittencourt, atual pró-reitor de Planejamento e Administração.
Também a chapa “UFC Viva e Democrática”, que tem como candidato a reitor o Prof. Custódio Almeida, docente do Instituto de Cultura e Arte (ICA), e como candidata a vice-reitora a Profª Diana Azevedo, atual vice-diretora do Centro de Tecnologia (CT).
Polêmica na UFC em 2019
Dos três candidatos concorrentes, José Cândido Lustosa Bittencourt de Albuquerque, ainda atuando como diretor da Faculdade de Direito, foi o menos votado, recebendo 610 votos.
Apesar da baixa preferência entre a comunidade acadêmica da UFC, o nome de Cândido foi apontado como favorito à indicação, por ser o candidato mais alinhado a posicionamentos do presidente à época.
O candidato mais votado pela comunidade acadêmica da UFC foi o então vice-reitor, Custódio Luís Silva de Almeida, com 7.772 votos. Antônio Gomes de Souza Filho, atual pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade ficou em segundo lugar, com 3.499 votos.
Como é de praxe no meio acadêmico, Antônio Gomes de Sousa Filho (o segundo mais votado) retirou a candidatura para que apenas o nome do mais votado fosse enviado a Bolsonaro.
No entanto, Cândido Albuquerque não retirou a candidatura e a diretora do campus de Crateús, Maria Elias Soares, se ofereceu para ocupar a vaga de Antônio Gomes na lista.