Ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Raul Araújo abriu, nesta quinta-feira (29), divergência no julgamento que pode deixar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) inelegível. Enquanto o ministro Benedito Gonçalves, relator do processo por suspeita de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, votou pela condenação do ex-mandatário, Araújo votou favorável a Bolsonaro.
O voto empatou o placar do julgamento. Logo depois dele, o ministro Floriano de Azevedo Marques votou pela inelegibilidade de Bolsonaro, fazendo o placar do julgamento ficar 2 a 1, pela condenação do ex-presidente. Ainda faltam quatro ministro da Corte votarem. A expectativa é de que a análise do Tribunal seja encerrada ainda nesta quinta - o julgamento ocorre desde o último dia 22 de junho.
Voto divergente no Tribunal, Raul Araújo foi nomeado como ministro do TSE em setembro do ano passado, após indicação do Pleno do Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde deve atuar até 2024. Ele já atuava desde 2020 na Corte como ministro substituto.
Existia uma expectativa de que o posicionamento do ministro fosse favorável a Bolsonaro, já que, em outras ocasiões, ele tomou decisões mais alinhadas ao bolsonarismo e ao ex-presidente. É dele, por exemplo, a liminar que proibiu manifestações políticas no festival Lollapalooza em março de 2022.
A decisão ocorreu após a cantora Pabllo Vittar fazer, durante apresentação no festival, manifestação em favor do então pré-candidato a presidência da República, Lula (PT). Na época, o PL acionou o TSE contra o Lolapalloza, ocasionando o veto a manifestações políticas no festival. A liminar de Araújo acabou derrubada dois dias depois pelo Pleno do TSE.
Quem é Raul Araújo?
O ministro do TSE é natural de Fortaleza e teve atuação no Judiciário cearense antes de ser indicado para a Corte eleitoral.
Ele é formado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e em Economia pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Ele é ainda especialista em Ordem Jurídica Constitucional, pelo curso de mestrado em Direito Público da UFC, além de professor licenciado da Unifor.
No Ceará, atuou como advogado, promotor de Justiça e foi Procurador-Geral do Estado do Ceará. Ele atuou como desembargador do Tribunal de Justiça do Ceará até ser indicado, em 2010, para o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Neste Tribunal, integra a Corte Especial, a 2ª Seção e a 4º Turma - desta última, já foi presidente entre os anos de 2013 a 2015. Também foi Corregedor-Geral da Justiça Federal, entre 2017 e 2018.
Julgamento de Bolsonaro no TSE
A ação contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, ajuizada pelo PDT, faz referência à reunião realizada por Bolsonaro no Palácio da Alvorada que reuniu dezenas de embaixadores estrangeiros.
Na ocasião, o ex-presidente e então candidato à reeleição fez diversas acusações contra o sistema eleitoral brasileiro e as urnas eletrônicas sem, contudo, apresentar provas. Ele também proferiu ataques contra ministros do TSE - incluindo o então presidente da Corte, Edson Facchin - e do Supremo Tribunal Federal (STF).
Relator do processo, Benedito Gonçalves apontou que houve configuração de abuso de poder político no uso do cargo de presidente por Bolsonaro. O relator afirma ainda que a divulgação de inverdades sobre a lisura dos resultados das eleições pode ter impulsionado os atos de 8 de janeiro.
O voto, de mais de 400 páginas, aponta ainda que Bolsonaro estimulou tensões institucionais e "acirrou a crença de que a adulteração de resultados era uma ameaça que rondava o pleito de 2022".
Segundo a votar, Raul Araújo divergiu do relator e votou contra o uso da "minuta do golpe" no processo. O magistrado argumentou que, na reunião de Bolsonaro com embaixadores, em julho do ano passado, foram apresentados "fatos sabidamente inverídicos" e que já foram já desmentidos pelo próprio Tribunal.
Além disso, o ministro reconheceu que o evento teve caráter eleitoral, mas defendeu que os temas abordados pelo ex-presidente, como o voto impresso, poderiam ser discutidos. "Numa democracia, não há de ter limites ao direito fundamental à dúvida. Cada cidadão é livre para duvidar". Por fim, julgou "improcedente" o pedido de condenação.
Na sequência, votam os ministros André Ramos Tavares, a vice-presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, o ministro Nunes Marques e, por último, o presidente do Tribunal, ministro Alexandre de Moraes.
Depois de Araújo, o ministro Floriano de Azevedo Marques deu início ao seu voto, que desempatou o placar com mais um favorável à condenação do ex-presidente por abuso de poder político e desvio de finalidade dos meios de comunicação do Governo. O magistrado entendeu que o encontro entre Bolsonaro e embaixadores "não se tratou de um evento inserido na agenda de relações institucionais externas brasileiras".
"O caráter eleitoral era central naquela atividade [...] Se aproximou muito de um discurso de comício em praça do interior", pontuou, alegando que esse fato afasta a tese da defesa de que o encontro se tratou de um ato regular da presidência da República. E, diferentemente de seu antecessor na votação, ele considerou válida a inserção da "minuta do golpe" no processo e reforçou a responsabilidade que teve o ex-mandatário em utilizar a competência pública para propagar inverdades sobre o sistema eleitoral brasileiro.