Na disputa pela Prefeitura de Fortaleza, o PDT decidiu pela neutralidade partidária no 2º turno entre André Fernandes (PL) e Evandro Leitão (PT). Com parlamentares e demais lideranças do partido livres para anunciar posicionamentos individuais, o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio (PDT) decidiu apoiar a candidatura do PL.
No anúncio, feito no último sábado (12), ele indicou "voto útil" em André Fernandes contra "arrogante e soberba hegemonia política e administrativa" do PT no Ceará. Na sequência, embarcou na campanha do PL, inclusive com a participação em atos e gravação de peças publicitárias favoráveis a Fernandes.
Junto dele, também embarcaram na candidatura do PL a ampla maioria da bancada do PDT na Câmara Municipal de Fortaleza — inclusive vereadores eleitos para o primeiro mandato em 2024 — e quatro deputados estaduais. Posicionamento na contramão dos dirigentes partidários do PDT, Carlos Lupi (PDT) e André Figueiredo (PDT), que anunciaram apoio a Evandro Leitão.
O apoio de Roberto Cláudio foi exaltado por André Fernandes, que apesar de admitir ter críticas à gestão do ex-prefeito, ressaltou iniciativas e a experiência do ex-prefeito como gestor, além do conhecimento de Roberto Cláudio sobre a estrutura da Prefeitura de Fortaleza. Atualmente, o Paço Municipal é comandado pelo aliado e apadrinhado de Roberto Cláudio, o prefeito José Sarto (PDT) — terceiro colocado na eleição de Fortaleza e que afirmou que ficará neutro no 2º turno.
Cientistas políticos entrevistados pelo Diário do Nordeste apontam os benefícios para André Fernandes da conquista do apoio do ex-prefeito de Fortaleza, principalmente ao agregar capital político e experiência em gestão no discurso do candidato do PL. "O Roberto Cláudio ainda tem um capital político significativo, ainda tem uma popularidade, ainda tem obras reconhecidas, ele é uma figura carismática. Todos esses elementos agregam", resume a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres.
Por outro lado, ela aponta o apoio a André Fernandes como uma "estratégia arriscada" para Roberto Cláudio. Coordenador do Doutorado em Políticas Públicas da Uece, Emanuel Freitas pontuou, por exemplo, que "o André dizia que Roberto Cláudio fazia parte desses políticos que deviam ser superados".
Além disso, as recentes movimentações de lideranças do PDT indicam um novo racha dentro do partido, apenas meses depois da saída do senador Cid Gomes (PSB) e do grupo político liderado por ele após disputa interna pelo comando estadual da legenda.
Experiência e capital político
André Fernandes tem dado destaque à conquista do apoio de Roberto Cláudio a sua candidatura. Durante o Debate PontoPoder, nesta quarta-feira (16), Fernandes destacou que ligou pessoalmente para o ex-prefeito em busca de trazê-lo para a campanha.
"Dizendo que, com a experiência dele e com a gestão que ele teve aqui em Fortaleza, mesmo sendo um crítico ao partido e a algumas decisões tomadas por ele, eu precisava da ajuda dele para que ele viesse a mudar o nosso plano de governo e me ajudar com essa experiência", disse.
Monalisa Torres pontua que é exatamente essa "experiência agregada" o principal benefício recebido por André Fernandes com o apoio de Roberto Cláudio. O que ajuda, inclusive, a rebater críticas recebidas do adversário.
"Um dos grandes pontos de diferença que o Evandro tenta demarcar com o André é a questão da experiência, que o André seria um jovem inexperiente, que, portanto, não teria condições de conduzir e de gerir uma cidade como Fortaleza. E o Roberto Cláudio vem na contramão desse discurso dizer que: embora ele seja jovem, ele tem com ele ou poderia contar com a experiência de outros gestores", demarca Torres.
O conhecimento da máquina pública é outro elemento que tem sido ressaltado por Fernandes a respeito do novo cabo eleitoral, a quem coloca inclusive como fiador de uma das promessas de campanha: a de universalizar o ensino em tempo integral nas escolas de Fortaleza.
"Conversei com o ex-prefeito Roberto Cláudio e eu disse: 'Prefeito, existe a possibilidade da gente universalizar o ensino básico em Fortaleza nos próximos quatro anos? Já que você tem a ciência do caixa que Fortaleza tem, do fluxo que entra e que sai, receitas e despesas, do PIB aqui em Fortaleza', que hoje é em torno de R$ 14 bilhões. E ele disse: 'sim, André, tem como fazer. Pode prometer e, no que for necessário, nós ajudaremos você a cumprir essa promessa'".
Em entrevista concedida à TV Verdes Mares, no entanto, André Fernandes fez ressalva sobre o apoio do agora aliado. "O fato de o ex-prefeito Roberto Cláudio ter aderido à nossa campanha (...) não significa que eu simplesmente mudei meu discurso", ressaltou.
Emanuel Freitas fala sobre como, mesmo na campanha de 2° turno, parte do discurso de Fernandes não mudou. "O André tem falado de superar os políticos que estão aí há 30 anos. E nesses políticos que estão aí há 30 anos, inclui-se o Roberto Claudio, já que, de 1994 para cá, ele foi prefeito por dois mandatos", pontua.
E isso inclui, inclusive, medidas adotadas durante o período em que Roberto Cláudio comandou a Prefeitura de Fortaleza.
"O próprio legado do Roberto Cláudio, como a Agefis, as ciclofaixas, ciclovias, a questão de a AMC trabalhar a fiscalização, tudo isso era herança do Roberto Cláudio que ele dizia que tinha que ser superado, que tinha que ser abandonado, descontinuado pela prefeitura".
Por outro lado, Monalisa Torres aponta que a presença de Roberto Cláudio, ainda assim, reforça a "narrativa de mudança" de André Fernandes, elemento pontuado pelo candidato do PL em diferentes ocasiões. "Meu discurso sempre será o mesmo: temos que renovar e inovar em várias áreas de Fortaleza", disse ele em entrevista à TV Verdes Mares.
"Embora o Roberto Cláudio tenha apoiado o Sarto, com esse posicionamento contra a hegemonia do PT — porque esse é o discurso que o Roberto Cláudio tem levantado —, ele se coloca como antagonista, como um crítico, uma das vozes que questiona essa possível hegemonia do PT e como isso poderia ser prejudicial para a cidade", argumenta Monalisa Torres.
Riscos do apoio e a divisão do PDT
Apesar de importante, existem também limites no apoio concedido por qualquer liderança política. "Todo o capital político, toda a transferência de voto, ela tem um teto", defende Monalisa Torres.
"Eles influenciam, mas o seu percentual de influência não é tão alto. Ele é importante, porque indica inclusive a força do candidato, simbolicamente, que ele tem mais apoios, que ele agrega mais pessoas, que mais pessoas o reconhecem como uma liderança, como alguém com condição de governar. Então, simbolicamente todos esses elementos entram na conta. Mas o resultado objetivo disso, que é o voto, essa transferência de voto, tem um teto".
Ela aponta ainda o apoio de Roberto Cláudio a André Fernandes como uma "estratégia arriscada", adotada não apenas por ele, mas também por vereadores e deputados estaduais do PDT. E que insere o partido em uma nova divisão interna, apenas poucos meses depois da saída de Cid Gomes.
"Tem uma certa herança de brigas internas que vão precisar ser resolvidas. Agora entra nesse meio, obviamente, o futuro político do Roberto Cláudio", considera Freitas. Ele destaca que, no posicionamento adotado agora, venceu o antipetismo que vem sendo adotado pelo ex-prefeito e também pelo ex-ministro Ciro Gomes a despeito do antibolsonarismo, apesar de esse ser um grupo também criticado pelos pedetistas.
O que não chega a ser inesperado, completa Torres. Ela não descarta, inclusive, uma participação direta dos pedetistas em eventual gestão de André Fernandes.
"Até porque a própria Prefeitura, quando a gente olhava a composição do Governo Sarto, tinha essa base governista bem ampla, que incluía inclusive nomes da direita e da centro-direita. Então, não seria algo completamente surpreendente, ou novo, ou inimaginável, dado histórico de composições do PDT na Prefeitura de Fortaleza. Mas eu não sei, por exemplo, se o Roberto Cláudio entraria ou participaria de um eventual governo André Fernandes", diz.
"Mas assim, eu acho uma estratégia arriscada porque, se o PDT, essa ala do PDT mais próximo a Ciro e Roberto Cláudio, tem essa pretensão de se consolidar como oposição no Estado ao PT, essa oposição vai ficar muito mais difícil de ser consolidada, construída e reforçada", finaliza Torres.