Conhecida pelo turismo religioso e por estar sob os olhos de Padre Cícero, Juazeiro do Norte mantém uma tradição política histórica: a Cidade nunca reelegeu um prefeito em seus 112 anos de emancipação. Com a aproximação da disputa eleitoral, o "tabu" vira desafio para o atual gestor, Glêdson Bezerra (Podemos), e esperança para a oposição.
Desde julho de 1911, quando o então vilarejo ganhou independência do Crato, e Padre Cícero foi escolhido como primeiro prefeito, a cidade teve 46 mandatários. Alguns deles até retornaram ao Poder Executivo Municipal, mas nunca em um mandato subsequente. Naquela época, no entanto, reeleição ainda não era permitida.
Foi a partir de 1997 que os chefes de Executivos Municipais puderam disputar um segundo mandato consecutivo. Ainda assim, o feito até hoje não foi alcançado por nenhum político em Juazeiro do Norte.
O tabu
Em 6 de outubro de 2024, mais de 184 mil eleitores do município estão aptos a ir às urnas para eleger a pessoa que irá comandar a Prefeitura de Juazeiro do Norte pelos próximos quatro anos, conforme dados mais recentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Com a aproximação do pleito, as articulações já estão a todo vapor.
De um lado, o prefeito Glêdson Bezerra tenta atrair aliados e cumprir promessas para conseguir entrar na história da cidade como o gestor que quebrou o "tabu". Do outro, ex-gestores e lideranças políticas da região se unem para perpetuar a tradição, pelo menos por mais quatro anos, e tirar do grupo o novo prefeito.
Declarado abertamente como pré-candidato à reeleição, Glêdson Bezerra classificou o fato histórico de Juazeiro como "coincidência", em entrevista concedida em agosto à live PontoPoder, do Diário do Nordeste.
Agora, ele já articula alianças para enfrentar a eleição num cenário complicado. O gestor é filiado ao Podemos, legenda que passou a ser comandada pelo prefeito de Aracati, Bismarck Maia, a nível estadual, no ano passado, e embarcou na base aliada do Governo Elmano de Freitas (PT).
Glêdson, todavia, não integra a base aliada do petista, apesar de ter se aproximado do ministro Camilo Santana (PT) e do deputado estadual Fernando Santana (PT) em 2022 — este último atualmente está distante do prefeito e integra grupo que articula candidatura de oposição na Cidade.
Questionado sobre a relação com os petistas, o prefeito esclareceu que votou em Camilo e Fernando Santana em 2022, mas que o distanciamento foi ocorrendo devido a cobranças do gestor ao Governo Estadual. De toda forma, ele diz que já não acreditava na possibilidade de apoio político deles ao seu nome.
"A rigor eu votei no Camilo, eu votei no Fernando Santana. E, lá atrás, o que tinha de melhor para dar eu, eu dei. Eu dei meu apoio, meu voto. Isso não faz com que eu seja subserviente. Começaram a interpretar que eu estava me distanciando porque eu estava cobrando o Governo Estadual. Eu vou continuar cobrando, sim. Eu só sei fazer política dessa forma, vou continuar cobrando com muita humildade", declarou.
Articulações
Sobre a permanência no Podemos para a disputa, Glêdson Bezerra disse que deve continuar na sigla, desde que a agremiação garanta a "liberdade" para o gestor firmar alianças em torno de seu nome.
"Se eu tiver liberdade para fazer a minha coligação com quem eu achar que devo, eu não tenho por que sair do Podemos. Agora, se tiver algum tipo de restrição, eu avaliaria a possibilidade de sair do meu partido", ressaltou.
O prefeito acrescenta, inclusive, que já teve conversas sobre o assunto com o presidente estadual da legenda, Bismarck Maia, que teria assegurado a "liberdade" de alianças. O diálogo também foi estendido ao senador Cid Gomes (PDT), uma das principais lideranças políticas do Estado e que participou da articulação de Bismarck Maia para o comando do Podemos Ceará.
"Desde quando nós estamos dialogando, isso está posto à mesa de forma tranquila. (...) A conversa com o Cid é muito tranquila. Ele sempre me atende muito bem, um gentleman, a gente não se aprofundou nos debates sobre eleição municipal. A única conversa que a gente teve foi essa, que eu tenho que ter liberdade, e ele disse que iria dar certo"
Sobre o assunto, Bismarck Maia alegou que o Podemos tem interesse em manter a Prefeitura de Juazeiro do Norte e que não vê motivos para o Glêdson Bezerra não sair candidato pela legenda.
"Meu dever institucional é de apoiá-lo. Ele tem uma ligação muito boa com a presidente nacional do partido, a Renata Abreu. Não vejo motivo para ele não ter direito à reeleição. O Podemos tem interesse em manter essa prefeitura e também tem interesse em aumentar o número de prefeituras no Ceará", declarou Bismarck Maia.
Ainda segundo Bismarck, a possível candidatura de Glêdson não deve atrapalhar a relação do Podemos com Governo Elmano de Freitas, tendo em vista as peculiaridades da Cidade. Ele, todavia, ressalta que as articulações ainda estão em andamento e não descarta uma aliança com o grupo governista até lá.
"Nós do Podemos estamos na base do Governo. Ainda está muito cedo para definir quem estará com quem, mas é um cenário que ainda pode evoluir muito e ser muito diferente do atual. (...) Teoricamente, já está tendo articulações para que a gente possa ter uma união em Juazeiro, mas, caso não seja possível, não terá problema nenhum para nossa relação com o Governo"
Pretensões de apoio
Glêdson, inclusive, pretende reunir diferentes lideranças em torno de seu nome. Uma delas, inclusive, é o senador Cid Gomes (PDT).
"Eu vou pedir o apoio dele (Cid Gomes), eu vou tentar, é um grande quadro, nós temos um projeto em Juazeiro que precisa ser continuado para o bem da cidade", ressaltou.
Além de Cid, Glêdson tem conversado também com o deputado federal André Figueiredo (PDT) e Ciro Gomes (PDT). Os dois, no entanto, estão rompidos com Cid devido a aproximação defendida pelo senador com o Governo do Estado.
Para o prefeito de Juazeiro, o racha entre os pedetistas é algo "entre eles". Por isso, ele não descarta nenhum. Além deles, o gestor também quer juntar siglas como União Brasil, Novo e PL em torno de seu nome — já que tem nas legendas aliados como o senador Eduardo Girão (Novo) e Capitão Wagner (União).
"Nós temos um diálogo muito fluído com a federação PSDB/Cidadania, Novo, PL, União Brasil, PP e PDT. Eu vou tentar entendimento com o PDT, eles não apalavram nada a mim, não, mas todos os outros já apalavram alguma coisa a mim. Mas acho que o PDT pode se aproximar", acrescentou.
Grupo de oposição
Em paralelo, um grupo de lideranças da base governista de Elmano está se unido para lançar uma candidatura em Juazeiro do Norte.
O time é formado pelos ex-prefeitos Raimundão, Arnon Bezerra (PDT), Dr. Santana; pelo vice-prefeito, Giovanni Sampaio (PSB); pelo deputado federal Yury do Paredão (MDB); pelos deputados estaduais Fernando Santana (PT), Davi de Raimundão (MDB); pelo ex-deputado estadual Nelinho (MDB); pelo ex-deputado federal Pedro Bezerra (PDT); pelo presidente da Câmara Municipal, Capitão Vieira (PRD), entre outros.
O grupo ainda não definiu, no entanto, quem deve ser o representante na disputa. O nome deve aglutinar apoio do arco de alianças, do governador Elmano e do ministro Camilo Santana, além de ter apelo popular. Até lá, todos são possíveis candidatos.
Ainda conforme Davi de Raimundão, a união ocorre por insatisfação com o comando do município. Segundo ele, Glêdson tem se "isolado", o que tem impactado no município.
"Toda vida que eu encontro com ele, eu digo: 'rapaz, vá lá no meu gabinete, leve alguma reivindicação', mas ele é um gestor que quer estar só. Os principais municípios que você vê se destacando são aqueles que dialogam com o Governo Federal, com o Governo do Estado, com os deputados", declarou Davi de Raimundão.
Sobre tanto nomes dentro do grupo que já se colocam como pré-candidatos na disputa, Davi de Raimundão fala que pesquisas serão levadas em consideração, bem como o aval de Camilo e Elmano.
"Eu já disse que meu nome está à disposição. Fernando Santana também já disse que, se for para o bem, também está à disposição. Todos estão com o nome à disposição. Quando existe um grupo, tem que ter lá na frente uma união em torno desse nome. Eu acho que a aproximação com o Governo do Estado, o que tiver melhor nas pesquisas, ter boas propostas, o que juntar todos os itens, aí a gente vai definir. E isso logicamente vai passar pela mão de Camilo, Elmano"
Ex-deputado estadual e assessor especial do Governo do Ceará, Nelinho fala que o objetivo é replicar o amplo arco de aliança do Governo do Estado em torno da candidatura do grupo à Prefeitura de Juazeiro do Norte. (...) Nós podemos apoiar um candidato do PT, do MDB... a linha é essa. A nossa articulação está muito boa, tem essa sinergia de união e esse grupo vai se manter assim até o final. Nós temos bons nomes, grandes lideranças", frisou Nelinho.
Nelinho e Davi de Raimundão compuseram chapa juntos na eleição de 2020 em Juazeiro do Norte, mas ficaram em terceiro na disputa. Além deles, os outros nomes mais ventilados do grupo são de Fernando Santana e Yury do Paredão.