O Ministério Público do Ceará (MPCE) apura denúncias sobre possíveis afastamentos irregulares dos prefeitos de Limoeiro do Norte e Tianguá das suas funções, em decorrência de tratamentos de saúde. Os gestores José Maria Lucena (PSB) e Luiz Menezes (PSD), nessa ordem, são alvo de apuração no sentido de identificar se eles lesaram as leis orgânicas dos municípios e terceirizaram atividades restritas aos seus cargos, como a assinatura de contratos públicos.
Acentua a discussão o fato de os gestores terem rompidos com os seus respectivos vices ao longo do mandato, o que seria uma das causas da falta de regularização das ausências prolongadas, como apurou o Diário do Nordeste.
Em ambos os municípios, as leis orgânicas indicam prazos específicos para que os prefeitos possam se afastar do cargo sem que se seja necessário oficializar o ato. Caso o limite seja ultrapassado, deve-se pedir licença no Legislativo Municipal para que o vice assuma o comando, o que não aconteceu. Entenda melhor os casos a seguir:
Tianguá
Segundo fontes ouvidas pelo Diário do Nordeste, desde agosto de 2022, Luiz Menezes estaria ausente da função devido ao estado de saúde agravado. O afastamento se prolongou por meses e chamou a atenção de políticos e populares. Afirma-se que, raramente, o gestor é visto no municipio, não atende mais os vereadores, nem participa de eventos públicos.
Pelas redes sociais do prefeito, no entanto, é possível ver postagens em que ele aparece desempenhando algumas atividades típicas de suas funções.
Nesse período de afastamento, ele teria realizado procedimentos médicos, incluindo um no Rio de Janeiro, em fevereiro deste ano. Esses momentos, contudo, não foram oficializados. A Lei Orgânica de Tianguá afirma que, em caso de ausência por prazo superior a 10 dias, os gestores do município devem pedir licença à Câmara Municipal, sob risco daperda de cargo ou do mandato.
Nos bastidores, aponta-se que a ex-prefeita e atual primeira-dama e secretária de Administração do município, Natália Félix, é quem estaria fazendo os despachos no lugar do marido, junto a outros familiares. A conduta, contudo, é irregular. Em caso de afastamento prolongado, é o vice-prefeito – no caso, Alex Nunes – quem deve seguir com as funções da Prefeitura.
Nunes e Menezes, entretanto, estão rompidos desde o começo do mandato. Os dois foram eleitos de forma suplementar em 2019 e repetiram o feito no pleito no ano seguinte, mas a relação azedou.
Com as suspeitas levantadas sobre a ausência dos prefeitos, populares enviaram uma representação e denúncia, no início deste mês, com pedido de abertura de sindicância e investigação à Câmara Municipal. A peça foi protocolada e tramitou na Casa, mas foi rejeitada pela maioria dos vereadores.
A reportagem procurou o presidente do Legislativo tianguaense, vereador Elves Lima (PSD), para entender qual foi o entendimento usado na análise dessa questão, mas não recebeu retorno até o fechamento da matéria.
O tema foi levado, então, em forma de Notícia de Fato ao Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), por meio da 7ª Promotoria de Justiça de Tianguá. O processo foi recebido pelo órgão ministerial e encontra-se em fase inicial de análise.
Também foi enviado um pedido de providências solicitando a realização de um exame grafotécnico para verificar se houve falsificação da assinatura de Menezes.
O Diário do Nordeste entrou em contato com a Secretaria de Administração e com o Gabinete da Prefeitura para comentar as acusações e o estado de saúde do prefeito e aguarda retorno.
Limoeiro do Norte
Em etapa mais adiantada, o processo contra o prefeito José Maria Lucena vai avançar mais em 30 de março, quando membros do Executivo do município do Vale do Jaguaribe, incluindo o próprio prefeito e a vice Dilmara (PDT) – rompidos politicamente –, devem prestar depoimento presencialmente sobre a questão.
De acordo com a Notícia de Fato apresentada pelo vereador limoeirense de oposição Rubem Sérgio de Araújo (PL) ao MPCE, José Maria estaria se ausentando da cidade "com frequência e por longos períodos" – incluindo dois meses consecutivos – por causa do seu quadro de saúde.
A peça aponta, ainda, que vereadores da base encontram dificuldade de despachar com o prefeito. Isso, de acordo com o documento, fere a Lei Orgânica do Município, já que o gestor não pode se ausentar das funções por mais de 15 dias sem licença concedida pelo Legislativo.
Além disso, caso se confirme o afastamento irregular do prefeito, o vereador aponta outro problema na denúncia, que é o envio de projetos do Executivo à Casa. Isso, diz o parlamentar, indicaria que os atos do gestor seriam executados por terceiros.
Por isso, além da convocação de membros da administração municipal, o promotor Felipe Carvalho de Aguiar requisitou à Câmara Municipal o envio, dentro de 15 dias, de cópia de todos os atos assinados e remetidos pelo prefeito no decorrer deste ano.
A filha do prefeito de Limoeiro e deputada estadual, Juliana Lucena (PT), disse que o caso representa uma "manobra política da oposição" e que seu pai "nunca parou de trabalhar".
"Meu pai, inclusive, está hoje lá em Limoeiro despachando. Isso foi só manobra política da oposição. Ele faz hemodiálise há 7 anos. Isso é uma manobra política para tentar enfraquecê-lo. [...] Ele sempre continuou despachando e trabalhando", rebateu.
Juliana afirmou, ainda, que o pai prestará depoimento no fim do mês "com certeza". O Diário do Nordeste procurou a assessoria da prefeitura e também aguarda retorno.