O ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, foi ouvido pelos senadores no segundo dia de depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, nesta quinta-feira (20).
Além das negociações para compra das vacinas, parlamentares voltaram a questioná-lo a respeito do colapso no sistema de Saúde de Manaus.
O depoimento foi interrompido na quarta-feira (19) para a sessão plenária do Senado. Apesar da previsão de que retomasse no mesmo dia, o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM) preferiu adiar os trabalhos devido ao número de inscritos para questionar o ex-ministro.
Com a proximidade da chegada dos 30 dias de trabalhos do colegiado, Aziz também pediu ao senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, um relatório preliminar dos primeiros dias das investigações.
Segundo Aziz, muitos não se lembram do primeiro dia de audiência realizado pela comissão, e o relatório servirá para que a população "saiba muito bem o que já apuramos, e aquilo que vai estar constando do relatório final", disse.
Confira cinco temas que dominaram o segundo dia de depoimento:
1. Colapso da Saúde em Manaus
No segundo dia de depoimento, muitas das questões direcionadas a Pazuello foram sobre o colapso do sistema de Saúde de Manaus, capital do Amazonas.
Ele confirmou a participação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na decisão de não intervir na crise de oxigênio ocorrida em janeiro deste ano.
A intervenção federal foi solicitada pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), no dia 15 de janeiro. À época, o esgotamento do estoque de oxigênio medicinal levou o sistema de saúde regional a um colapso. Pacientes com Covid-19 morreram pela falta do insumo.
"Na reunião ministerial, o governador foi chamado, apresentou sua posição e houve uma decisão nessa reunião de que não seria feita a intervenção", disse Pazuello, sem especificar a data do encontro. "O presidente da República estava presente. A decisão foi tomada nessa reunião", completou.
O ex-ministro também responsabilizou a empresa White Martins, fornecedora de oxigênio na cidade, e a Secretaria de Saúde do Estado pelo colapso.
"Da nossa parte fomos muito proativos".
Ao ser indagado sobre quando foi informado sobre a falta do insumo, Pazuello voltou a se contradizer. Primeiro, ele disse que só soube do problema na noite do dia 10 de janeiro.
Contudo, documento oficial, encaminhado pelo Ministério da Saúde à Câmara dos Deputados, informa que Pazuello tratou do assunto no dia 7 de janeiro, em conversa por telefone com o secretário estadual de Saúde de Manaus, Marcellus Campêlo.
Confrontado com o fato, Pazuello mudou a versão. Disse que tratou do tema, mas falando "exclusivamente" de apoio logístico para transporte de tubos. No dia anterior, havia afirmado que não tratou do assunto oxigênio no telefonema.
As contradições acabaram irritando senadores. O relator Renan Calheiros apontou mentiras no depoimento. "Já tivemos uma primeira amostragem das contradições. O depoente em 14 oportunidades mentiu flagrantemente", afirmou.
2. Compra de vacinas
As negociações para compra das vacinas também foram abordadas pelos senadores. O presidente da CPI questionou Pazuello a respeito da carta enviada por representantes da Pfizer ao Ministério da Saúde e autoridades do Executivo federal.
O militar confirmou que a carta chegou ao Ministério em setembro. Questionado sobre por que a carta não teve resposta, o ex-ministro afirmou que as negociações com Pfizer estavam acontecendo desde abril. "Isso não começou com a carta", respondeu.
Pazuello também negou ter tratado sobre a compra de vacinas com o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten.
O ex-ministro afirmou que pressionou para que a Pfizer diminuísse "as cinco cláusulas impeditivas". "A minha posição com a Pfizer era que ela flexibilizasse para o Brasil, porque não tínhamos lei para isso", afirmou.
Ele também foi indagado sobre o episódio em que foi excluída da minuta de uma Medida Provisória o dispositivo que daria segurança para a compra da vacina da Pfizer.
Pazuello fugiu de atribuir a responsabilidade da exclusão a uma única pessoa. Segundo ele, foi uma decisão do "Governo" e dos ministros envolvidos na discussão da MP, porque não haveria consenso entre as assessorias jurídicas sobre o artigo, segundo ele.
O ex-ministro também disse que não se reuniu com empresários para tratar de compra de vacinas durante o período em que administrou a pasta da Saúde. "Posso ter recebido um CEO, posso ter recebido alguém que também é um empresário, mas para cortesia de tomar um café", afirmou.
Segundo Pazuello, isso ocorreu porque a decisão sobre a compra da vacina era da área técnica do Ministério e "deve estar restrita ao escalão administrativo que está negociando a compra", disse.
3. Estados e municípios
Decisão do Supremo Tribunal Federal (CPI) foi criticada, novamente, por Eduardo Pazuello. Segundo ele, "muitos" itens do plano nacional de contingência de Covid-19 não foram implementados "pela própria posição de que as decisões seriam de estados e municípios".
A decisão, no entanto, não impedia a atuação da União no combate à pandemia.
O ex-ministro afirmou ainda que a responsabilidade pela situação da pandemia é de todos "os níveis" de gestão.
"Todos os gestores em todos os níveis são responsáveis. Há responsabilidade em todos os níveis, claro que há, cada um no seu nível".
Ele ainda negou que fosse o único ou principal culpado pela crise sanitária: "claro que não".
Pazuello alegou que as decisões eram compartilhadas com gestões estaduais e municipais. "Quando falo em decisões como ministro, falo em decisões combinadas em tripartite; não tomei decisão sozinho no Ministério enquanto estive lá", disse.
4. "Tratamento precoce"
O ex-ministro voltou a afirmar que não comprou hidroxicloroquina - um dos medicamentos defendidos pelo presidente Jair Bolsonaro como parte de "tratamento precoce" contra a Covid-19.
"Não comprei um grama, não fomentei o uso, distribuí o que me foi pedido. Para mim é uma grande discussão médica", disse.
Pazuello disse, por outro lado, que não há como calcular o impacto da defesa de Bolsonaro ao uso do medicamento. "Ele coloca sempre, na grande maioria das vezes, com a prescrição do médico, tem um grau aí de prisma na coisa", argumentou.
O ex-ministro voltou a responsabilizar a médica cearense Mayra Pinheiro, secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, pelo aplicativo TrateCov - o aplicativo receitava hidroxicloroquina até para bebês.
Apesar dos registros de eventos oficiais para lançamento do aplicativo, Pazuello afirmou que um hacker atacou a plataforma e a incluiu na rede digital do Governo.
O uso de medicamentos ainda sem eficácia comprovada acabou sendo o centro de bate-boca entre governistas e oposição ainda no começo do segundo dia de depoimento.
O senador Marcos Rogério (DEM-TO) apresentou vídeo descontextualizado em que gestores estaduais, como João Doria (PSDB) e Flávio Dino (PCdoB), aparecem falando sobre o uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19.
Rogério alega que os integrantes da CPI não querem investigar os governadores. O vídeo apresentado, no entanto, é do período em que os testes para verificar a eficácia do tratamento ainda estavam sendo realizados.
5. Uso da máscara
O ex-ministro se desculpou por ter entrado sem máscara em shopping de Manaus, no fim de abril. Contudo, apesar de afirmar ser favorável ao uso da máscara, ele questionou a eficácia da medida.
O ex-ministro afirmou que a posição da Organização Mundial da Saúde (OMS) foi marcada por "idas e vindas" durante todo o ano passado. "Eu acredito que as medidas preventivas sejam necessárias, não quer dizer que eu não escorregue em nenhum momento da vida", afirmou.
Ele também foi flagrado sem o acessório no Senado Federal, durante um dos intervalos do depoimento.