A quebra do SVB ainda é motivo de preocupação? Entenda como a crise pode afetar o Brasil

Especialistas também descartaram nova crise financeira mundial, como a de 2008, após intervenção do governo americano

A crise gerada pela falência do Silicon Valley Bank (SVB), nos Estados Unidos, pode representar uma crise no país norte-americano, mas também deverá servir como alerta para uma mudança de estratégia do Banco Central para uma possível antecipação da redução da taxa de juros no Brasil. A análise foi defendida por economistas ouvidos pela coluna, que destacaram os possíveis impactos no País e no setor de tecnologia nos próximos meses.

O economista e conselheiro do Corecon-CE (Conselho Regional de Economia no Ceará), Ricardo Coimbra, explicou que o SVB acabou sofrendo com cenários de alta de juros nos Estados Unidos e não fez as provisões necessárias para garantir a liquidez necessária para o caso de problemas maiores. A medida acabou levando o banco à falência após a decisão de vender ativos para evitar um rombo maior. 

O cenário ainda se agravou depois da confirmação de problemas em outra instituição financeira no país. Segundo Coimbra, a decisão do governo americano de intervir através do FED (Federal Reserve, banco central dos EUA) e outras instituições reguladoras deve sinalizar ao mercado uma garantia maior de que o sistema financeiro não seja contaminado por completo. 

A iniciativa deve afastar as possibilidades de uma crise financeira semelhante à registrada em 2008, com o banco Lehman Brothers. 

"O forte do sistema financeiro dos EUA são os bancos regionais, então o SVB era concentrado na região de desenvolvimento de startups no Vale do Silício. Boa parte das empresas tinham operações nessa instituição e à medida que a taxa de juros por lá ia aumentando para conter o processo inflacionário, algumas dessas operações começaram a gerar resultado negativo. A empresa tentou fazer operações, mas o mercado desconfiou da liquidez do banco", explicou. 

"Houve uma corrida significativa dos resgates para ter transferências para outras instituições, e o FED agiu rapidamente e mostrou que vai manter o suporte financeiro que for necessário para proteger os credores. Isso mostrou uma forte interferência e de que o FED não deixará isso reverberar para outras instituições, até porque o sistema é muito pulverizados", completou.

Crise financeira global 

Delano Macedo de Vasconcelos, vice-presidente do Ibef-CE (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Ceará), também descartou um cenário semelhante ao de 2008, destacando a evolução do sistema bancário pelo mundo. Ele também apontou que a diferença desta crise nos EUA está no cenário de gestão "inadequada" do risco de liquidez do SVB.

"Depois da crise de 2008, os bancos são/estão mais rigorosamente regulados e mais capitalizados, não acredito que uma crise nos moldes de 2008 tenha chance de ocorrer, embora isso não signifique que o sistema é à prova de falências", explicou..

O problema do SVB está relacionado com descasamento de prazos dos investimentos, que é o descasamento entre ativos e passivos em um cenário de subida de juros, e uma inadequada gestão do risco de liquidez, que resultou em uma crise de confiança, diferente do que aconteceu em 2008"
Delano Macedo de Vasconcelos
Vice-presidente do Ibef-CE

Cortes de juros no Brasil

Para tentar conter a crise, o FED deverá reduzir ou estabilizar a taxa de juros por lá, focando em evitar problemas semelhantes em outras instituições financeiras. Essa postura, segundo os economistas, deverá ter efeitos também no Brasil, com o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central possivelmente mudando a estratégia atual referente à política monetária. 

"O grande impacto que pode ter é vermos uma manutenção ou queda dos juros aqui, na Selic, talvez não nessa semana, mas na próxima. Mas isso pode ser um indicativo de uma tendência de queda de juros no Brasil, movimentando a atividade econômica de modo geral. Isso mostra que o sistema financeiro no mundo está protegido e que as instituições monetárias farão de tudo para manter o controle e evitar uma contaminação de todo o setor financeiro", disse Ricardo Coimbra. 

A perspectiva foi corroborada por Delano Macedo.

"Quanto mais o FED adotar uma postura adaptável e flexível para absorver os impactos causados pelo problema do SVB, mais o Copom tem chances de discutir o corte dos juros mais cedo por aqui, embora outros aspectos do Brasil fazem parte dessa equação do nível da taxa Selic, como o crescimento possível do PIB, o nível de taxas da Selic e seus impactos na inflação, e o endividamento do governo, por exemplo. Não apenas o reflexo do SVB será levado em consideração", disse.

Tendência de queda 

Apesar do cenário de crise gerada pelo SVB, Wilton Daher, conselheiro do Ibef, apontou que a tendência de juros no Brasil já era de redução da taxa Selic, após sucessivas altas e uma elevação da pressão política sobre o presidente da instituição, Roberto Campos Neto.

"Ainda é muito cedo para dizer se teremos um impacto no Brasil dessa crise do SVB. A inflação já está dando sinais de estar controlada então a tendência é de redução dos juros. Sempre há uma chance, mas não com o mesmo impacto da de 2008 até porque ela começou 3, 4 anos antes, com um dos maiores bancos de investimento do mundo. E aqui chegou 7 anos depois, mas até hoje os Estados Unidos sofrem com essa crise", disse.