Sair do modo robozinha foi minha decisão de Ano Novo antes do Ano Novo

Ainda no ano passado, a ressaca da ida ao Brasil trouxe a já conhecida ansiedade de novembro com mais força. O mês que antecede o período de Natal e a noite de Ano Novo não é lá amigo de muita gente. Eu mesma, que sempre gostei dessas datas, comecei a me ver cada vez menos pronta para atravessar esse espaço de tempo meio limbo.

A mistura de estar longe da família, agravada pela tristeza sem trégua da pandemia e o cansaço que vai tirando uns romantismos do caminho. Até as luzes na rua, que antes me enchiam os olhos, às vezes pareciam uma celebração chorosa do buraco em que nos enfiamos. Foi por conta desse combo que resolvi mudar a forma com que eu passaria o final do ano de 2021 e minha resolução foi simples: me fazer perguntas e respondê-las com honestidade.

Primeiro: resolvi aceitar e dizer em voz alta pela primeira vez que a exagerada troca de presentes me incomoda. Eu moro na Inglaterra e aqui não tenho amigo-secreto (amém!), mas os britânicos levam o Natal a sério, a lista de presentes é gigantesca e, claro, como eles dão muitos presentes, esperam receber o mesmo em troca.

O que acontece é que, semanas antes do Natal, meu termômetro de ansiedade já está explodindo para dar conta da lista. Não apenas comprar, mas tentar agradar todo mundo. A pressão me fazia mal há tempos, eu não aproveitava o processo, encarava como um grande fardo.

Fora que, nesse ano, mais do que nunca, ver a árvore cheia de pacotes me pareceu sem sentido e me deixou impaciente a imagem de receber um punhado de coisas novas que eu iria fingir que gostei. Foi quando resolvi intervir e pedi à minha família daqui, com carinho, que, para mim, priorizasse presentes que não fossem objetos (livros liberados, por motivos óbvios), mas experiências.

Deu certo e foi o Natal que saí com mais coisas que gosto de fato: ingressos para cinema, cartão de membro de galeria, vouchers para livros, ticket para shows. Menos acúmulo, mais coisas para lembrar - se a Covid deixar acontecer.

Não parou por aí. Na noite do dia 24, quando a ceia de Natal é, geralmente, minha responsabilidade, resolvi calcular o jantar sem exageros. Éramos seis pessoas e fiz comida em boa porção, mas sem mirabolância ou ostentação: arroz com castanhas e passas (sim!), farofa, pernil, legumes e uma sobremesa. Quase tudo na medida certa, sem quinze pratos diferentes, sem grandes sobras e sem pensar que a meta era deixar todo mundo com o botão da calça aberto.

Por fim, o mais difícil, mas o mais aliviante: assumir que eu não precisava viajar ou ir a festas de Ano Novo para ficar bem, ainda mais considerando o meu momento. Eu não queria viajar, eu não queria ir a festas.

Confirmei isso me fazendo perguntas: eu quero mesmo fazer isso ou quero finjo que sim porque outros vão fazer? Eu quero ir a festas de Réveillon ou vou me forçar a ir porque todos vão? Eu quero fazer as malas, testes mil ou iria apenas para não ser a única que não viajou, para não parecer triste na sala de casa, sendo que é exatamente a sala da minha casa que me apetece?

Obedeci minhas respostas, identifiquei de onde vinha a pressão interna e meu Réveillon foi calmo, sem ansiedade: dormi bem durante o dia, delivery de sushi à noite, filme na Netflix, um prosecco para celebrar, vi os fogos na calçada e dormi de novo.

Movi o meu fim de ano a perguntas e questionamentos. Saí do automático, daquele modus operandi que nos enfiamos porque o entorno nos diz que sim e a gente nem checa se é isso mesmo que quer.

E saí daquela semana Natal-Ano Novo com uma prática que quero manter: sempre que eu puder, a cada vez que eu entrar no modo robô, paro um pouquinho, me lanço umas perguntas, respondo pra mim mesma e decido a partir de então. Um 2022 mais honesto, mais respeitoso e mais sereno é o que desejo, pra mim e pra gente.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora.