Por que o Meireles é o bairro mais caro do Nordeste para comprar imóvel?

De acordo com a pesquisa FipeZap Venda Residencial, Meireles é o bairro mais caro do Nordeste, constatação que está relacionada a fatores históricos e de oferta e demanda

A mais recente pesquisa FipeZap Venda Residencial trouxe dados que não surpreendem quem acompanha o mercado imobiliário ou cobre o assunto: o preço médio do metro quadrado no bairro Meireles (R$ 9.850) é o mais elevado de Fortaleza e dos bairros nordestinos pesquisados para a composição do índice. Atualmente, o estudo coleta os preços dos bairros em 50 cidades brasileiras, sendo cinco capitais do Nordeste.

Apesar de a informação não surpreender, ela levanta uma curiosidade pertinente: por que o Meireles é um bairro tão mais caro. O que a área nobre de Fortaleza possui que as de outras capitais nordestinas não têm? O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Ceará (Sinduscon-CE), Patriolino Ribeiro, explica que a disposição espacial da orla de Fortaleza ajuda a explicar a questão.

O Meireles é um bairro litorâneo com uma beira-mar bem menos extensa que alguns outros bairros litorâneos em frente à praia, como Boa Viagem (Recife), por exemplo. “Recife dá uns 10km de orla. Aqui, temos 3km de orla. Portanto, é uma região menor, sendo disputada pelas pessoas com alto poder aquisitivo”, diz Patriolino.

Se a oferta é, portanto, mais restrita, é comum que os preços subam. A média do preço do metro quadrado no Meireles chega a quase R$ 10 mil, mas os valores vão bem além dessa cifra. De acordo com o presidente do Sinduscon-CE, há imóveis na região cujo metro quadrado chega a R$ 22 mil.

Se para venda os preços são elevados, não seria tão diferente quando se trata de aluguel residencial. Apesar de não ser o aluguel mais caro da cidade (posição ocupada pelo Mucuripe), o Meireles tem o segundo maior valor médio de aluguel residencial por metro quadrado, de acordo com o FipeZap Locação Residencial de outubro: R$ 37,1/m².

A economista do DataZap, Larissa Gonçalves, reforça que a valorização do bairro está relacionada à localização em uma região central da cidade "e que comporta os principais pontos turísticos de Fortaleza".

"Quando avaliamos a tendência que surgiu após a pandemia, da busca por maior qualidade de vida e moradia em regiões mais próximas da natureza, essas características valorizam ainda mais o bairro e a cidade em si. E é isso que explica, em parte, os preços em ascensão na capital cearense e, mais especificamente, em Meireles", diz Larissa. Em Fortaleza, o preço do metro quadrado residencial teve valorização de 5,2% em 2023.

Mas quais são as raízes da supervalorização do bairro? O historiador e autor do livro Fortaleza Belle Époque, Tião Ponte, explica que o Meireles, assim como a Praia de Iracema, é fruto do deslocamento das elites - que até então ocupavam o Centro de Fortaleza - para a região leste litorânea da cidade.

Essa mudança ocorreu quando o Centro de Fortaleza deixou de ser considerado uma boa moradia para os mais abastados, que migraram para o bairro Jacarecanga, primeiramente (1915) e, posteriormente, para Meireles e Praia de Iracema. “Porque ficou muito cheio de gente, carros e de comércio”, pontua o historiador. “A mudança para o leste praieiro contou com uma atraente novidade: o uso do banho de mar como forma de lazer (antes o banho de mar era raramente recomendado, apenas indicação médica)”.

Tião explica que o banho de mar como lazer começou nas cidades litorâneas nos anos 20. “Em Fortaleza, esse lazer e, ao mesmo tempo, o início da ocupação da praia pelas elites ocorreram com a construção da Vila Morena na Praia de Iracema em 1925. Daí se seguiram outras casas de veraneio. Com a valorização do terreno de praia, os pescadores que ali viviam e trabalhavam tiveram que se deslocar para o Mucuripe e para as praias a oeste. A Praia de Iracema antes se chamava Praia do Peixe, pois ali se pescava e se vendia o produto”, detalha.

O Meireles e os clubes

O Meireles passou a ser ocupado pelas elites na década de 40 e sobretudo 50, com a construção de residências “palacianas e clubes elegantes beirando a orla”.

“Náutico, Líbano, Círculo Militar, Comercial e Massapeense, todos com suas belas sedes e dotados de piscinas (grande novidade de lazer da época), construídas no Meireles na década de 50, tido como os ‘anos dourados’”. A exuberância dos clubes que, de acordo com o historiador, Fortaleza chegou a ser conhecida como Cidade dos Clubes.

“Por tudo isso, o Meireles, com a advinda das elites, tornou-se disparadamente o bairro mais sofisticado e caro da cidade, pois era o bairro dos ricos, característica que mantém até hoje. Naqueles meados do século XX era o único, hoje divide esse status com outros bairros ditos nobres a leste e a sul da cidade”, arremata Tião Ponte.