"O meu marido tem dois empregos!". Quem alguma vez já viu a série Todo Mundo Odeia o Chris já ouviu a célebre frase de Rochelle Rock, mãe do protagonista. O orgulho dela poderia ser ainda maior se a família do programa vivesse no Brasil hoje pois Julius, o marido, poderia usar os dois empregos para se aposentar.
Isso porque a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deste País estabeleceu que, "após o advento da Lei 9.876/1999, e para fins de cálculo do benefício de aposentadoria, no caso do exercício de atividades concomitantes pelo segurado, o salário-de-contribuição deverá ser composto da soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto previdenciário".
Ou seja, o cálculo da aposentadoria deve considerar contribuições em atividades concomitantes, desde que respeitado o teto.
O julgamento. ocorrido sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.070) consistiu em definir a aplicabilidade do artigo 32, e seus incisos, da Lei 8.213/1991, em relação às alterações legislativas na forma de cálculo do salário-de-benefício do segurado que exerceu atividades concomitantes, especialmente as trazidas pela Lei 9.876/1999.
O relator, ministro Sérgio Kukina, explicou que a redação original dos incisos I, II e III do artigo 32 da Lei 8.213/1991 estabelecia que a soma integral dos salários-de-contribuição, para fins de apuração do salário-de-benefício, somente seria possível nas hipóteses em que o segurado reunisse todas as condições para a concessão individual do benefício em cada uma das atividades exercidas.
Lei de 1999 alterou metodologia do cálculo
Segundo o ministro, o objetivo da lei de 1991 era impedir que, às vésperas de implementar os requisitos necessários à obtenção do benefício, o segurado exercesse uma segunda e simultânea atividade laborativa apenas para obter uma renda mensal inicial mais vantajosa, já que seriam considerados os últimos salários-de-contribuição no cômputo de seu salário-de-benefício.
Entretanto, a alteração trazida pela Lei 9.876/1999 mudou a metodologia de cálculo e passou a considerar todo o histórico contributivo do segurado, com a ampliação do período básico.
"A renda mensal inicial passou a refletir, de forma mais fiel, a contrapartida por ele suportada ao longo de sua vida produtiva, além de melhor atender ao caráter retributivo do Regime Geral da Previdência Social", disse o magistrado.
Ainda conforme o ministro, a partir dessa alteração, voltou ao debate a possibilidade de se somarem as contribuições vertidas em razão de trabalho concomitante para o cálculo do salário-de-benefício. Sérgio Kukina lembrou que a Lei 10.666/2003, em seu artigo 9º, extinguiu a escala transitória utilizada para a definição do salário-de-contribuição dos contribuintes individual e facultativo.
Soma dos salários-de-contribuição em atividades concomitantes
Além disso, lembrou o relator, a Primeira Turma, em 2019, concluiu pela necessidade de revisão do entendimento anterior da corte, para admitir que pudessem ser somados os salários-de-contribuição vertidos no exercício de atividades concomitantes, sempre respeitado o teto previdenciário (julgamento do REsp 1.670.818).
"Lícito concluir que a substancial ampliação do Período Básico de Cálculo (PBC), como promovida pela Lei 9.876/1999, passou a possibilitar a compreensão de que, respeitado o teto previdenciário, as contribuições vertidas no exercício de atividades concomitantes podem, sim, ser somadas para se estabelecer o efetivo e correto salário-de-benefício, não mais existindo espaço para a aplicação dos incisos do artigo 32 da Lei 8.213/1991, garantindo-se, com isso, o pagamento de benefício que melhor retrate o histórico contributivo do segurado", afirmou.
Sérgio Kukina ressaltou ainda que, a partir da Lei 13.846/2019, foram revogados os incisos I, II e III do artigo 32 da Lei 8.213/91, eliminando qualquer dúvida acerca da forma de cálculo do benefício, na hipótese de exercício de atividades laborativas concomitantes, devendo ser somados os salários-de-contribuição, observando-se tão somente, no que couber, o disposto em seus parágrafos 1º e 2º, e no artigo 29 da Lei 8.213/1991.