Um empresário industrial cearense, de categoria cinco estrelas, comentou ontem, falando a esta coluna, que, enquanto o Congresso Nacional não aprovar a proposta do Arcabouço Fiscal e a Reforma Tributária, “nem eu nem um ajuizado homem de negócios ousará investir em novo projeto ou na ampliação do que já existe, pois será um tiro no escuro”.
Ele explicou que há hoje o que chamou de “buraco negro” na política e na economia nacionais, atrasando o reordenamento das contas públicas, a retomada dos investimentos, a volta do crescimento, o reencontro com a segurança jurídica e, consequentemente, o aumento da confiança de quem trabalha e produz.
A mesma fonte preocupa-se com o “jogo de empurra” que fazem, claramente, o presidente Lula e seu “aliado” Artur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, que lidera o Centrão e comanda a pauta legislativa, que avança ou recua de acordo com o seu desejo, que é movido pela fisiologia, algo tradicional da política e dos políticos nacionais.
E o desejo de Lira e do seu séquito é público: indicar, pelo menos, dois dos seus correligionários (ou haveria outra designação?) para igual número de ministérios. Não qualquer ministério, mas aqueles cujo orçamento seja polpudo.
Lira está a prometer para terça-feira, 22, a votação do Arcabouço Fiscal, a nova matriz de gastos do governo. Aprovada em dois turnos na Câmara dos Deputados, a proposta recebeu emendas no Senado, que enxertou no seu texto alguns penduricalhos que tornam mais complicado o que já é difícil: a obtenção de um superávit primário em 2024, para o que será necessário uma receita extra do tamanho de R$ 150 bilhões, algo que parece impossível de ser alcançado.
Os senadores excluíram do Arcabouço Fiscal (que limita os gastos do governo) várias grandes despesas como as do bilionário Fundeb – o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação.
Como se não bastasse, a Reforma Tributária, também aprovada em dois turnos na Câmara, está tramitando no Senado, onde, igualmente, ninguém conseguiu ainda explicar ao contribuinte mais inteligente como ficarão os impostos no Brasil, onde há meio século impera um manicômio tributário feito para tornar ricas as bancas de advocacia e os escritórios de “planejamento tributário”, assim mesmo, entre aspas.
“Como investir em meio a essa pornográfica união do pior da política com os mais horrendos grupos de interesse que, juntos desde o Descobrimento, praticam, por meio de lobbies, o triste esporte de assaltar o Tesouro Nacional (e os estaduais, também)?”, indagou o industrial.
O governo, por iniciativa do seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está trocando o teto de gastos pela nova matriz fiscal, cuja meta – repita-se – é zerar o déficit em 2024, obter um superávit de 0,5% em 2025 e de 1% em 2026. Beleza. Falta combinar com os russos do Centrão, providência que, mais uma vez, foi adiada por causa de nova viagem do presidente Lula, desta vez à África do Sul.
“Com um governo gastador como o que está aí, essa meta tem zero chance de ser alcançada em 2024”, apostou o empresário.
Ele explica que “a questão é semelhante à que se passa na nossa casa, onde as despesas não podem superar as receitas, pois quando isso acontece o chefe da família tem de entrar no cheque especial, que cobra juros elevados, e a solução é cortar gastos, simples assim”.
Se o governo gasta mais do que arrecada, o déficit cresce, assim como crescem a dívida e os juros cobrados pelos seus financiadores – hoje a relação dívida-PIB é da ordem de 78%.
Apesar de o ministro Haddad dizer e repetir que o governo Lula 3 tem compromisso com a austeridade fiscal, o que ele tem produzido, até agora, são mais despesas, reduzindo a esperança de que, no próximo ano, as contas públicas estarão equilibradas, algo que, segundo a opinião da maioria dos economistas, só acontecerá por milagre.
As divergências que separam o comando da Câmara dos Deputados do Palácio do Planalto prejudicam duramente a economia. Se não fosse a performance dos setores do agro, a economia brasileira estaria enfrentando problemas ainda mais severos. A indústria, com as exceções que confirmam a regra – e a Embraer é uma delas – enfrenta dificuldades por causa de sua baixa produtividade que tem origem na carência de investimento na inovação tecnológica.
A vizinha e caótica Argentina é um exemplo do que acontece com governos sem responsabilidade fiscal.
Do ponto de vista de quem, à distância e pela imprensa, acompanha o dia a dia do governo, a impressão que se colhe é de que o ministro Fernando Haddad parece ser a voz solitária que clama no deserto pela aprovação das reformas de que o Brasil precisa para entrar nos eixos da normalidade econômica e financeira.
E nada acontecerá sem que o Parlamento preste, o mais rapidamente possível, a sua indispensável colaboração.