Investimentos: a diferença entre a Fortescue, privada, e o Governo

A empresa australiana, sozinha, investirá R$ 25 bilhões no Hub do H2V do Pecém. Isto significa cinco anos de investimentos do governo do estado do Ceará, cuja máquina administrativa e a seguridade social consumirão 96% do Orçamento de 2024.

Um grande empresário da agropecuária cearense anotou um detalhe do comentário que esta coluna publicou ontem, segunda-feira, 13, sobre a Fortescue, que está pronta para produzir Hidrogênio Verde no futuro Hub do H2V do Pecém, no Ceará, aguardando, apenas, a regulação dessa atividade, tarefa de responsabilidade do Congresso Nacional. 

Ele chama atenção para o fato de que a empresa australiana, só ela, investirá R$ 25 bilhões para, antes de 2030, usando a eletrólise, separar as moléculas da água e passar a produzir Hidrogênio, que será verde porque nesse processo utilizará energias renováveis – solar fotovoltaica e eólica, que são abundantes nesta parte do território nacional brasileiro. 

A mesma fonte diz, perguntando: “Quanto o governo do estado do Ceará investirá em 2024 na saúde, na educação, na infraestrutura e na segurança pública?” Ela mesma responde: “De acordo com o Orçamento Estadual do próximo exercício, já aprovado pelo Poder Legislativo, serão pouco mais de R$ 3,5 bilhões, incluídas as administrações direta e indireta”.

Como o Orçamento de 2024 prevê receitas e despesas no patamar de R$ 37,3 bilhões, o montante previsto para investimento é pouco, muito pouco. Para o custeio da pesada máquina do Governo do Ceará, irão 64% dos recursos orçamentários; para a seguridade social (aposentadorias e pensões) irão 32%. Sobram apenas 4% para investir. É assim também no plano federal. 

Dois terços do orçamento da União tem um exclusivo destino: a manutenção da pesada estrutura administrativa estatal. Há ministério demais, aspone demais, privilégio demais, mordomia demais, luxo demais, carros e aviões demais para serviços públicos de menos. E de baixíssima qualidade, diga-se. Se alguém duvida, consulte as estatísticas da segurança pública, da saúde pública e do transporte público.

As deficiências do serviço público brasileiro – somadas à incapacidade do governo de reduzir seus absurdos gastos – têm inibido o investimento da empresa privada, às voltas com juros altos, com insegurança jurídica, com falta de planejamento estratégico. 

Assim, o que acontece no Ceará, neste momento, com o anúncio de bilionários investimentos privados, pode ser visto como algo atípico, mas perfeitamente adequado ao planejamento da empresa privada nacional e internacional. Há uma transição energética em curso a exigir altíssimos investimentos.

A perspectiva de o Ceará vir a transformar-se num polo mundial de produção do Hidrogênio Verde – tirando proveito do que a natureza lhe deu em vento, sol e mar – pode levar a economia estadual cearense a dar um giro de 180 graus. Mas esse giro quem o dará não será o estado, mas o setor privado.
 
Além da Fortescue, mais três outras empresas – a Casa dos Ventos, a AES e a Cactus Energia Verde – também estão com dinheiro em caixa para começar a produzir H2V no Pecém. As três investirão, juntas, uma montanha superior a R$ 50 bilhões, desde que o Congresso Nacional brasileiro aprove, no curto prazo, a proposta em tramitação de regulação da atividade do Hidrogênio Verde.

São 32 as empresas brasileiras e estrangeiras que celebraram os já famosos Memorandos de Entendimento (MOUs) com o governo do Ceará para a produção de Hidrogênio Verde no Pecém. 

Assim, há mais 28 delas que poderão anunciar o valor dos seus investimentos, desde que o Parlamento aprove a regulação do H2V, o que repercutirá em toda a sua extensa cadeia produtiva, que inclui a indústria de placas solares, a de turbinas eólicas, a de pás eólicas, a de tancagem de combustíveis verdes, a da navegação marítima e a de construção de navios modernos e movidos a hidrogênio, para citar algumas. 

Para sustentar toda essa cadeia, serão necessários investimentos na melhoria da estrutura portuária dos países produtores, e aqui entra o Porto do Pecém, cuja localização estratégica – a cinco dias de viagem dos portos da Europa e da Costa Leste dos EUA e do Canal de Suez – é uma vantagem comparativa a favor do Ceará. 

Por enquanto, parece que estamos a sonhar. Por enquanto.