"Proteja suas amigas"… grita a frase escancarada de teto ao chão em um dos espaços da Pinacoteca do Ceará. A obra das "Terroristas del Amor", coletivo formado pelas artistas visuais cearenses Dhiovana Barroso e Marissa Noana, muito nos ensina em poucas palavras. Longe dali, frases de homens pronunciadas e disseminadas em tempo real e mundo afora cruzam as (des)fronteiras do Big Brother Brasil 23 em desacato não apenas a mulheres lá de dentro, mas a tantas outras daqui.
"Já vai levar umas cotoveladas na boca" é apenas uma delas, dita por Gabriel Tavares, em um diálogo tipo corriqueiro, em tom de brincadeira (?), a Bruna Griphao, com quem ele tem um relacionamento (?) na casa.
Volto à frase da Pinacoteca e penso: nossas mulheres precisam de uma proteção que começa, antes de tudo, pela parceria, numa espécie de chacoalhada que reforce o quanto a força feminina parece que tem sido domesticada a um modo masculino, de forma que os corpos e mentes - e corações - são desensinados e se habituam a serem seres não-livres. Presos a sentimentos e obrigações que não nos convêm - ou não deveriam.
De onde vem tanta autoestima masculina? Aqui não quero generalizar, mas por que alguns homens se julgam tão superiores? A resposta é um percurso histórico-cultural, eu sei, mas cabe uma reflexão mais pontual, não sobre esse autoamor dos homens, e sim sobre o que pode contrapor essa realidade tão sedimentada. Quero aqui falar da potência da mulher. E começo com o conselho de Pitty…
Vira a mesa
Assume o jogo
Faz questão de se cuidar
Nem serva, nem objeto
Pensando em tudo isso, rememoro que vivo muito bem entrelaçada numa rede de mulheres incríveis que me inspiram, me ensinam e me fortalecem absolutamente todos os dias da vida. Afilhadas, sobrinhas, mãe, companheira, irmãs, tias, avós, primas, cunhadas, amigas, e mais… uma força feminina resistente e pulsante digna de toda admiração possível. (Será que elas já sabem disso?)
E cada vez que me deparo com certos posicionamentos me pergunto: 'por que nós mulheres somos continuamente treinadas (forçadas) a vivermos das migalhas do universo masculino?'
Vendo alguns trechos do BBB23, afora outras edições do reality com comportamentos semelhantes, minha reflexão vai ainda mais além que a do parágrafo anterior: 'como é urgente ensinar, desde muito cedo, às crianças-meninas das nossas vidas, que a potência da mulher independe de qualquer referencial masculino que se possa ter ao longo de qualquer tempo.
Essa força-identidade-poder é natural, vem de dentro, da natureza que nos forma e nos faz capazes de ir cada dia mais além. Se a gente quiser. Claro que as interferências masculinas sempre estarão presentes, mas não precisam ser dominantes no sentido do nosso próprio ser-existir.
Seja nosso caminho no rumo do amor, da profissão, entre a realidade, nossos sonhos e desejos mais longínquos, temos a total capacidade de seguirmos firmes, recebendo não migalhas, mas completudes que também são capazes de vir dos homens, sendo eles maridos, namorados, pais, amigos, irmãos, patrões, colegas de trabalho… sejam eles quem forem e independemente dos espaços que tendem a ocupar em nossas vidas.
E se a autoestima do homem tem sido tão cultivada e disseminada, também digo: mulheres, nunca é o bastante lembrar que não, de maneira nenhuma, nos cabe jamais levar "cotoveladas". Mas vale muito também reforçar que não nos cabe nem ao menos ouvir pronunciarem certas falas sobre nós, nossos corpos, nossas profissões; qualquer de nossas escolhas.
Homens não são nossos donos; submissão, violência e pressão psicológica não é brincadeira nem sinônimo de afeto. Amor é outra coisa. Qualquer tentativa de dominar nossas falas, corpos e mentes é violência. E nada mais!