Durante anos eu tive problemas com o espelho. Muito mais pelas histórias que me contavam sobre a imagem da mulher, do que com a imagem da mulher de frente a mim a cada passeio pela tela de reflexos. Hoje, meu espelho revela-me um mundo de possibilidades, e o próprio universo também se abre a mim como um “espelho, espelho nosso”.
Com o tempo, e as experiências de vida, amor e arte, aprendi a ver outras mulheres como espelho. Vivo em uma família repleta delas. Mãe, irmãs, uma avó que já partiu e outra que permanece em coragem; 4 tias maternas e 1 paterna, além de inúmeras referências de amor e vida mundo afora. Cada uma se faz ou se fez espelho pra mim em algum momento da vida.
Hoje, vendo a Missão Artemis que, dentre outras experiências, se dispõe a levar uma mulher à Lua daqui uns anos, revejo-me entre os tantos espelhos que me cercam todos os dias e como desejo que todas as mulheres sejam e se vejam feito espelhos, entre nós. Reflexos coletivos que nos permitam ir muito além do que nos dizem.
A mulher ir à Lua será um feito histórico-científico importante, mas é também uma metáfora sobre até onde podemos ir: muito mais à frente do que tudo que pensamos, e sobre o pensam para nós. Nossos limites estão sempre sendo transpostos porque eles nos foram impostos, e nós não aceitamos, ainda que resistir venha doendo há tantas gerações de nós.
Porque não estamos aqui para permanecer - a menos que esse seja o nosso desejo. Estamos aqui para incontáveis missões, sejam elas interespaciais ou para romper nossos mundos, e os espelhos que já vêm com imagens programadas sobre nós, sem que, muitas vezes, nem tenhamos a chance de descobrir quem somos, o que queremos, até onde podemos ir.
A Lua é apenas um dos destinos onde temos plenas condições de chegar, desde que haja oportunidade. Todas nós, absolutamente todas, temos ainda a real chance de chegar muito mais longe quando nossas rotas interiores são por nós conhecidas e exploradas. Cultivadas segundo nossas vontades. Mas acredito que seguir sozinha também não seja o nosso destino.
Acredito que seguir de mãos dadas a outras mulheres, por meio de desafios, incentivos, projetos e resistência é o nosso lugar no mundo, é o nosso espaço, são as nossas missões: espaciais, terrestres ou interiores. Tudo aqui precisa ser coletivo para que o caminho se prolongue por muitas gerações.
Muitos caminhos de volta nos são abertos, e podem continuar existindo, mas é nosso direito não seguir, ou apenas ir em frente. Todo dia é dia de missão.