Escrevo este texto com rara felicidade. Mesmo atrapalhados por vários problemas, sobremaneira, as inabilidades do Governo anterior, os primeiros dados do Censo 2022 começaram a ser divulgados (ufa!).
Para nós pesquisadores, e também cidadãos/cidadãs, corresponde a uma excelente notícia sabermos das condições socioeconômicas e demográficas mais atualizadas do nosso povo. Teremos a partir de agora matéria-prima para produzirmos novos estudos, retomarmos modelos de análise da sociedade e do território nacional.
De quarta-feira, dia 28 de junho, para cá, muito já se publicou sobre as descobertas apontadas nos dados referentes as contagens demográfica e de domicílios: 1) a população brasileira é menor do que se espera em 2021; 2) a taxa geométrica anual de crescimento demográfico foi a menor já registrada; 3) o número médio de pessoas por domicílio reduziu-se; 4) o número de domicílios elevou-se a taxas superiores às do crescimento populacional; 5) a população da região Nordeste diminuiu proporcionalmente frente à composição nacional; 6) o Centro-Oeste foi a que mais percentualmente cresceu; 7) Fortaleza se tornou a cidade mais populosa do Nordeste, etc, etc.
Por sua vez, o que mais me chamou atenção foi o fortalecimento da urbanização nas chamadas concentrações urbanas. Primeiro, é preciso dizer que tais espaços se formam a partir de um conjunto de municípios cuja dinâmicas econômica e espacial estão umbilicalmente associadas, em outras palavras, representam um território intensamente urbanizado. Esses espaços se organizam sob a polarização de uma cidade mais complexa, como por exemplo, Fortaleza, Salvador e Recife.
Falando nelas, as três principais cidades nordestinas perderam população se comparamos os dados do Censo de 2010 e 2022. Salvador apresentou redução incrível de 9,6%, deixando assim de ser a mais populosa da região. Contudo, se analisarmos os demais municípios que compõem a coroa metropolitana perceberemos que houve ganho populacional significativo. Na Região Metropolitana de Salvador, constatamos esse aumento em Lauro de Freitas e Camaçari; na RMRecife, anotamos o caso de Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho; na RMFortaleza, listamos as situações de Eusébio, Itaitinga, São Gonçalo do Amarante, Caucaia e Aquiraz.
O que pode explicar tais diferenças na distribuição populacional? Penso que esse indicador deixa evidente a importância dos espaços metropolitanos e dos municípios mais integrados à cidade polo. Também significa heterogeneidade na distribuição das oportunidades de moradia e emprego em outros espaços urbanos, geralmente transformados por novas condições de mobilidade urbana, especialmente baseada no transporte individual. Outra explicação se desenvolve quando analisamos o papel do Estado, mormente na construção de infraestruturas e na produção de moradia popular.
Em complementação, estratos de classe média e média alta tem trocado espaços mais densos nas capitais por condomínios horizontais nas bordas metropolitanas. Essa última possibilidade, a meu ver, foi deveras turbinada pelo período pandêmico e pelo desejo em habitar em áreas com menor densidade demográfica.
Os próximos dados a serem divulgados nos ajudarão a refletir mais sobre essas hipóteses. A partir deles, poderemos qualificar não só quantitativamente as concentrações metropolitanas. Muito além disso, teremos condições de entender o conteúdo social, os níveis de renda e as características do entorno dos domicílios.
Por enquanto, fica óbvio que a queda demográfica nas capitais indica o que os teóricos já mencionaram. Entramos de vez na era da metropolização da vida urbana. O que isso representa? Urgência nas políticas públicas integradas e capazes de resolver problemas na escala das metrópoles, pois esta é a nova escala de vida do Brasil urbano. Tomara que os elaboradores do Plano Diretor de Fortaleza e os gestores da Secretaria das Cidades estejam atentos a estes dados.