Está previsto para os próximos dias o lançamento do programa Voa Brasil, que vai ofertar passagens aéreas a R$ 200 o trecho no País. O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, afirmou que a medida deve entrar em vigor no início de fevereiro, agora com regras um pouco mais claras sobre público-alvo e funcionamento da iniciativa.
O ministro esteve reunido com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta semana, e explicou, em coletiva de imprensa, quem terá direito, em um primeiro momento, a passagens aéreas mais baratas. A expectativa do ministro é de que cerca de 20,6 milhões de brasileiros possam ser beneficiados.
Além de informar detalhes sobre o público, o ministro dos Portos e Aeroportos trouxe mais detalhes sobre como vai funcionar o Voa Brasil. O Diário do Nordeste reúne todas as informações sobre o que se sabe acerca do programa.
Essa é a estimativa de público-alvo que terá direito a passagens aéreas, em um primeiro momento, a R$ 200 por trecho no País com o Voa Brasil
Quem tem direito ao Voa Brasil?
Segundo informações de Costa Filho à Agência Brasil, o programa será destinado, pelo menos no início da medida, para aposentados pelo INSS que recebem até dois salários mínimos mensais (até R$ 2.824) e bolsistas do Programa Universidade para Todos (Prouni).
“A gente espera que o presidente possa anunciar, agora no final de janeiro, mais tardar no início de fevereiro, um programa de passagens a R$ 200, que serão para dois públicos específicos num primeiro momento: aposentados do INSS, que dá em torno de 20 milhões de brasileiros, e também para alunos do Prouni, que atinge 600 mil estudantes”, disse Costa Filho em coletiva de imprensa.
Ainda não há detalhes sobre o número de passagens a serem disponibilizadas pelo Voa Brasil, que serão disponibilizados no dia de lançamento da iniciativa. O programa, que deve entrar em funcionamento até o começo de fevereiro, também não conta ainda com informações sobre como fazer o cadastro, nem como os bilhetes podem ser comprados mais baratos.
O ministro destaca ainda que a expectativa é de que entre 2,5 milhões e 3 milhões de pessoas que nunca viajaram de avião ou não embarcam em uma aeronave há pelo menos 12 meses consigam adquirir passagens aéreas pelo programa.
“Essa é a primeira etapa do programa e, a partir daí, a gente vendo que o programa funcionou, vai tentar cada vez mais, ao lado das aéreas, buscar a ampliação do programa”, pontuou Costa Filho sobre a possibilidade de ampliar para outros públicos o Voa Brasil.
Outro ponto ressaltado pelo ministro foi de que o Governo Federal não pode interferir nos preços de passagens aéreas, cujo valor do ticket atingiu patamares recordes em 2023, em um contexto de lenta recuperação do setor após o período crítico da pandemia de Covid-19. Em setembro deste ano, o preço médio no Brasil por trecho estava em R$ 747,66, valor recorde para o segmento.
Funcionamento e cadastro
O Voa Brasil só deve entrar em vigor no início de fevereiro. Ainda segundo o ministro, o presidente Lula deve participar do lançamento do programa, trazendo ainda mais informações no dia de estreia da iniciativa.
O programa terá um site exclusivo para a compra de passagens, como especificou Costa Filho. Todo o público elegível para ter acesso aos tickets com desconto deverá fazer isso por meio dessa plataforma, em vez de adquirir os bilhetes por meio dos canais oficiais das companhias aéreas.
Também não está estabelecido o tempo de duração do programa nem mesmo quantas passagens serão disponibilizadas. Conforme o Ministério, a intenção é vender os bilhetes mais baratos fora da alta temporada, em dois períodos: de fevereiro a junho e de agosto a novembro, quando tradicionalmente ocorre uma ociosidade média de 21% nos voos domésticos.
Os participantes poderão comprar até duas passagens por ano, com direito a um acompanhante em cada trecho. Os bilhetes deverão ser pagos em até 12 vezes com juros, no valor de até R$ 72 por prestação.
Não há previsão de quando e se o Voa Brasil será expandido para outros públicos, além de aposentados pelo INSS e alunos bolsistas do Prouni. Também não está definido que companhias aéreas vão participar. Conforme o ministro Costa Filho, a queda no preço das passagens está atrelada a políticas que reduzam o preço do querosene da aviação.
“Temos dois problemas que preocupam a aviação: o custo do querosene de aviação e a judicialização”, classificou o ministro. Segundo ele, no Brasil, o combustível representa de 30% a 35% do custo das companhias, enquanto na Europa é em média de 18%. “O governo busca reduzir o custo do querosene de aviação. Já caiu 14%. Queremos combater preços abusivos. Não faz sentido os trechos subirem para R$ 4 mil”, criticou.
“Talvez não seja a melhor política”, afirma especialista
Para a economista Carla Beni, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), o Voa Brasil tem a característica de deixar as passagens aéreas em preços mais acessíveis, mas abrange um público específico e nas condições definidas pelas empresas do setor.
“Ele é um programa que é um recorte por enquanto. O foco é em um grupo relevante. (…) As companhias aéreas vão selecionar assentos, dias, absolutamente tudo o que interessa para eles para colocar no site do Voa Brasil, que são obviamente os horários que têm uma procura mais baixa. A pessoa vai viajar de madrugada. Isso foi uma solicitação do Governo para as companhias aéreas, mas também é uma demanda das próprias companhias aéreas para o Governo, que não está colocando nenhum valor”, diz.
A ideia é compartilhada pela professora doutora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Viviane Falcão, pesquisadora na área de transporte aéreo e aeroportos. Ela defende que “talvez não seja a melhor política para estarmos viabilizando uma nova demanda no transporte aéreo”, mas elogia a medida enquanto política pública.
“A gente pode estar levando para o transporte aéreo uma demanda que não estava utilizando o transporte devido às condições financeiras. Vai colocar uma classe de pessoas que não estava acostumada com isso. A gente está falando de uma situação atípica, da pandemia, muita agressiva no setor aéreo”, explica.
Aliado a isso, há um baixo número de companhias aéreas no Brasil, hoje representadas no mercado nacional pela Azul, Gol e Latam. Principalmente pela demanda estar alta em um contexto pós-pandemia, onde a crise atingiu o setor, o professor de Economia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), Gildemir da Silva, acredita que as empresas estão se recuperando.
“Temos três companhias aéreas [nacionais] que hoje transportam de uma forma bem peculiar. Creio que essas empresas estejam ganhando bastante dinheiro, porém, com o resultado pandêmico, elas estão com déficit grande nas contas, e agora tentam compensar com a possibilidade de aumento no preço”, afirma o docente.
Outros gargalos
Os três especialistas ouvidos pelo Diário do Nordeste concordam que há uma demanda social na criação do Voa Brasil, mas a medida trazida ainda é insuficiente para o atual cenário de preços de passagens aéreas pouco acessíveis para a grande maioria da população.
“É uma demanda artificial. Não sei se ela tem efeito redutor de preços, mas podem surgir, nas companhias aéreas, voos especializados nesse tipo de pessoas, como aposentados pelo INSS”, defende o professor Gildemir da Silva.
Mesmo com os voos lotados saindo de diversas cidades do País, como em Fortaleza, Carla Beni acredita que o preço dificilmente deva baixar em um futuro próximo para o público geral, que não está incluso no Voa Brasil, principalmente pelo fato de as pessoas continuarem comprando bilhetes com ticket médio bem acima do normal.
“Tem demanda. As passagens subiram absurdamente e as pessoas estão pagando. Enquanto as pessoas estiverem pagando o preço alto das passagens, não vai fazer sentido as empresas reduzirem esse preço. As empresas sobem o avião com 99% de capacidade no preço cheio delas”, critica a economista.
Assim como destacado pelo ministro Costa Filho, o querosene de aviação segue como problemática para reduzir efetivamente o preço das passagens aéreas. Viviane Falcão define que, além de trabalhar para a queda nesse produto, é preciso estimular a competitividade do setor no País.
“O Governo está preocupado com o preço das passagens aéreas, isso é claro, e essa política traz o intuito de auxiliar, mas acho que não seja o foco. Entendo que tem outros programas que talvez facilite mais, como a entrada de novas companhias aéreas. A gente poderia ter uma baixa no preço de passagens com mais concorrência, uma diminuição do querosene da aviação, que é cerca de 30% do custo do combustível”, projeta a professora da UFPE.
Ainda de acordo com a especialista em transporte aéreo, é preciso que a aviação brasileira tenha um olhar diferenciado para grandes áreas ociosas, sobretudo para a aviação regional, que Viviane Falcão define como subutilizada no País.
A aviação regional tem muitos problemas de não ter opções de companhias aéreas. A gente tem cidades no Brasil que só são ligadas por uma companhia aérea, isso faz com que os preços de passagens fiquem muito altos. Acho que existem outras maneiras de a gente expandir a demanda para o transporte aéreo, não só a classe de aposentados e estudantes com o Prouni, mas tem muita gente que precisa de subsídio para pegar o transporte aéreo.