As condições para financiar imóvel nunca estiveram tão boas entre o fim de 2020 e o primeiro semestre de 2021. Com a Selic atingindo 2% ao ano, menor patamar histórico, os juros ficaram mais baixos para quem queria realizar o sonho da casa própria.
O cenário muda um pouco para 2022. Em março de 2021 o Banco Central começou um novo ciclo de altas na taxa básica de juros, que fechou o ano em 9,25% e a previsão é que o número chegue a dois dígitos em 2022.
A alta da Selic impacta diretamente nos juros cobrados para financiamentos, tornando o crédito mais caro tanto para quem quer financiar um imóvel como para as incorporadoras que precisam tomar recursos para construir. O resultado é um maior custo final, o que desincentiva o consumo.
O preço dos imóveis também começa 2022 pressionado, incentivado pela maior procura no último ano. Para o coordenador do curso de negócios imobiliários da FGV, Alberto Ajzental, o cenário de 2022-2023 não estará tão favorável para o financiamento imobiliário quanto 2020-2021.
Pandemia e o mercado imobiliário
Após um ciclo de quedas que vinha desde 2016, a Selic chegou ao menor patamar histórico em agosto de 2020 e se manteve nesse nível até o início do ano passado. A política monetária previa incentivar o consumo em meio a desaceleração da economia na pandemia.
Ao mesmo tempo, em que os juros imobiliários ficaram mais baixos, ocorreu uma maior busca por imóveis por parte da população de média à alta renda.
“Com o isolamento as pessoas passaram a valorizar mais os imóveis residenciais, buscaram maior área, conforto e atualização do bem. Isso influenciou o aumento de demanda”, reflete Ajzental.
Ele calcula que, do ponto de vista econômico e financeiro, uma variação de 2,3% na Selic altera 1% o custo efetivo total do mercado imobiliário. Esse 1% a mais ou a menos pode atrair ou afastar cerca de 1 milhão de famílias de renda qualificada.
O economista da DATAZAP+, Pedro Tenório, explica que três fatores podem levar a um aquecimento do mercado imobiliário: renda familiar, preço dos imóveis e juros imobiliários. Segundo ele, os dois últimos estimularam o aumento da demanda em 2020 e 2021.
Conforme dados do DATAZAP+, a média da taxa de juros imobiliários foi de 7,3% em 2020, alcançando a mínima de 6,6% em maio do ano passado. Mas, em novembro de 2021 o número voltou a subir, chegando a 7,7%.
Por 2020 e 2021 ter sido bom para comprar imóvel, as pessoas compram mais e isso pressiona preços. O Fipezap [índice que calcula inflação do mercado imobiliário] fechou 2021 em 5,3%, maior número desde 2014. Teve uma relativa valorização dos imóveis e a taxa de juros aumentou. Ou seja, aquele momento que era extremamente favorável perdeu a favorabilidade
Juros, custos e incerteza
Alberto ressalta que o preço dos imóveis também deve ficar mais caro devido ao maior custo das incorporadoras para produzir, tanto pela maior taxa de juros de empréstimos como devido à inflação de diversas matérias-primas cotadas em dólar.
“Desde que a inflação e a Selic começaram a subir, vai ter um custo de construção mais alto por conta de financiamento, do custo das commodities. O bem vai ficar mais caro para comprar e o financiamento vai ficar mais caro. 2022 e 2023 não vão ser o mesmo ambiente do que foi nos últimos anos, que teve um fator comportamental e juros nunca antes vistos”, percebe.
Ele chama atenção que a inflação deve começar a mostrar um arrefecimento em 2022 – a expectativa do último boletim Focus é que o IPCA feche o ano em 5,03%, bem abaixo dos 10,06% em que terminou 2021.
Mesmo que a inflação possa cair nos próximos meses, o efeito sobre a Selic é mais lento. Ajzental projeta que deve demorar pelo menos 6 meses para a taxa básica de juros chegar a um patamar de 1 dígito – para o Focus, a Selic deve fechar 2022 em 11,75%.
Somado a isso, Pedro Tenório destaca que o cenário atual de incertezas traz perspectivas menos favoráveis ao financiamento imobiliário.
“Do lado das ponderações e dos riscos, tem uma maior polarização política que não tem tanta certeza. O Banco Central americano está indicando que vai iniciar um ciclo de alta de juros mais forte e mais rápido que o esperado. Quando isso acontece, os bancos centrais tendem a acompanhar para manter equilibrado”, diz.
Vale a pena financiar?
Pedro indica que, quem precisa de um imóvel e não tem como esperar por muito tempo deve buscar o financiamento o quanto antes, já que a perspectiva é de novos aumentos na Selic e, consequentemente, nos juros.
A gente está em um pico de Selic, vai ter um CET [Custo Efeitvo Total] de pico. Tem uma linha de pensamento que fala para esperar cair e outra linha de argumentos que fala para comprar e quando cair pede portabilidade. Eu esperaria 5 a 6 meses para comprar em uma taxa mais barata
Para quem dispõe de um dinheiro guardado de entrada, disciplina, educação financeira e tempo, a melhor opção é investir os recursos para entrar com financiamento em um momento mais favorável, a partir do segundo semestre de 2023, na análise do economista do DATAZAP+.
Quem quer financiar agora deve tomar cuidado na escolha da linha de financiamento. Na opinião dos especialistas, a opção pré-fixada + TR é a mais vantajosa, por trazer uma maior previsibilidade.
Caso IPCA e Selic caiam no futuro tornando as condições de juros mais vantajosas em outras linhas, é possível optar pela portabilidade.
“Eu não compraria nunca na modalidade IPCA. Porque quando compra modalidade IPCA, o céu é o limite, você não sabe quanto pode a vir inflação. Eu não ganho e não tenho receita em IPCA e quando a inflação sobe é porque a economia está ruim”, justifica Alberto.
A modalidade vinculada à rentabilidade da poupança traz maior segurança já que a taxa fica limitada a 0,5% ao mês quando a Selic sobe acima de 8,5%.