O presidente da Câmara Arthur Lira voltou a culpar os impostos estaduais pelos aumentos nos preços dos combustíveis na última segunda-feira (27). A fala foi proferida ao lado do presidente Jair Bolsonaro e ainda prometeu pautar no Congresso o projeto que prevê um valor fixo para o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). No entanto, especialistas avaliam que a medida não deve interromper as altas de preços.
A secretária da Fazenda do Estado, Fernanda Pacobahyba, esclarece que não houve aumento da alíquota do ICMS sobre os combustíveis. Ela tornou a atribuir a culpa dos reajustes à política de preços da Petrobras.
Desde 2016, os preços dos combustíveis da Petrobras acompanham a variação do valor do barril de petróleo no mercado internacional e do dólar. É a chamada política de paridade internacional (PPI).
A titular da Sefaz lembra que as correções da estatal já acumulam altas de 43% neste ano sobre o diesel e 52,4% sobre a gasolina.
"É ridículo. Qualquer veículo de imprensa sério está noticiando o aumento do diesel a partir de hoje. Aí vem dizer que a culpa é do ICMS? Ainda cabe isso nessa discussão?", questiona.
"A gente pede que a Petrobras mude a sua política de preços. Enquanto isso, a empresa deve alcançar recorde de lucro esse ano a custa da população sofrendo", acrescenta Pacobahyba.
Sobre possível redução da alíquota do ICMS para amenizar o impacto ao consumidor final, a secretária avalia não ser uma medida justa, tendo em vista que geraria um ônus nos cofres públicos.
"Por que os estados, que não criaram o problema, têm que resolver? Os estados vão diminuir a suas arrecadações pra Petrobras ter mais lucro?"
Em relação à proposta de valor fixo, ela também esclarece que alguns estados sairão perdendo, apesar de o argumento do Governo Federal de não haver prejuízos.
Isso aconteceria porque há uma variedade considerável de alíquotas no País. Para chegar a uma média, os estados com alíquotas menores teriam de elevar um pouco suas cargas tributárias, enquanto os estados com alíquotas maiores, teriam de reduzi-las.
"Alguém vai perder e alguém vai ganhar. Agora, e essa perda de arrecadação, quem é que compensa?", conclui Pacobahyba.
Livre concorrência
O advogado tributarista Schubert Machado lembra que o ICMS foi criado ainda na Constituição de 1988 e, desde então, representa quase 30% do preço dos combustíveis. Apesar de ser uma boa parcela do valor total, ele ressalta que o imposto não é o que causa as elevações.
"Os fatores que fazem elevar o preço da gasolina são os mais diversos. A política de preços da Petrobras é que vai indicar isso. Embora se diga que já foi quebrado o monopólio dos combustíveis, ainda existe de fato o monopólio da Petrobras com relação a combustível", argumenta.
Para ele, as principais causas para o aumento de preços são a alta do dólar e do preço internacional do petróleo, variáveis usadas pela Petrobras como base para os reajustes, assim como o interesse da estatal em manter a margem de lucro.
Tendo isso em vista, Machado acredita que apenas com a abertura do mercado no segmento é que haveria uma baixa nos valores, com licença liberada de importação e comercialização de combustíveis.
"A Petrobras vai ter que concorrer com o mercado. Hoje, ela diz o preço que ela quer, o que é bom para ela, o que não é. Isso não é saudável, transparente para economia", ressalta.
O especialista afirma que a possibilidade de interferência governamental nos preços da Petrobras não é uma boa solução e avalia que um preço fixo do ICMS não resolve o problema e, se o preço continuar subindo no ritmo atual, logo a medida não terá mais efeito.
Alíquota pesada
Já o consultor na área de petróleo e gás, Bruno Iughetti, corrobora com o discurso de Lira e defende a criação de uma taxa fixa do ICMS. Segundo ele, a atualização quinzenal da parcela do imposto é um dos fatores que puxa o preço dos combustíveis para cima.
Ele explica que a cada 15 dias é feita uma pesquisa de mercado nos postos para verificar o preço médio e, assim, realizar a incidência do ICMS.
"É aí que o ICMS tem um peso grande, porque é aplicado o percentual em cima do preço médio obtido pela pesquisa nos postos de gasolina. Isso realmente destoa", afirma.
Iughetti defende que, a exemplo de outros impostos, como o PIS/Cofins, seja criada a taxa fixa para o ICMS. A medida faria com que o consumidor soubesse exatamente o valor do imposto pago por litro de combustível.
"Talvez não gere um preço menor, mas é uma questão de médio prazo que fará com que o consumidor saiba exatamente quanto ele está pagando de ICMS no litro da gasolina. Como também acabará resultando, se for descontinuado o uso do preço ponderado médio ao consumidor final, com a redução do preço da gasolina e dos demais derivados", ressalta.
O economista e consultor econômico Henrique Marinho também avalia que a alíquota média de 27% incidente sobre os combustíveis é pesada. No entanto, ele nega que os aumentos sejam em decorrência do imposto e não vê como uma taxa fixa pode estabilizar os preços.
Assim como Pacobahyba e Machado, ele atribui a responsabilidade das elevações à política de preços praticada pela Petrobras.
"O Governo fica alegando que o culpado é o ICMS, mas não é, porque ele está fixo. O que faz o combustível chegar mais caro na bomba para o consumidor é a elevação que a Petrobras faz - e que ela até precisa fazer, não vou dizer que seja por maldade", afirma.
Marinho esclarece que parte da culpa também pode ser atribuída ao Governo Federal, que não tem conseguido dar tranquilidade ao mercado interno, fazendo o dólar puxar os preços dos combustíveis.
"Então, é muito fácil o Governo Federal culpar os estados, porque o imposto é alto. Mas o que está acontecendo, na verdade, é o presidente da Câmara tentando assumir um protagonismo que não é dele"
Solução em três instâncias
Marinho acredita que os preços só serão controlados quando os três lados envolvidos - Governo Federal, estados e Petrobras - cederem um pouco e chegarem a uma solução conjunta.
Sobre a política de preços da estatal, ele avalia que o único problema é a apropriação do preço internacional do petróleo. Segundo ele, o petróleo extraído no Brasil possui um valor mais baixo que o praticado no mercado externo.
"O que a Petobras está fazendo é se apropriar do preço internacional. Então, haveria como manter um preço menor. Claro que teria um lucro menor, os acionistas iriam reclamar, porque a briga também envolve o mercado financeiro", destaca.
Confira os componentes do preço da gasolina cobrado na bomba