Obrigar Uber a contratar motoristas pode reduzir remuneração, projeta sindicato no Ceará

Presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativos do Ceará (Amap-CE), Rafael Keylon, acredita que passageiro sofrerá o menor impacto da medida

A Justiça condenou a Uber a realizar a contração dos motoristas que atuam pela plataforma, além de pagar R$ 1 bilhão em danos morais. A empresa já anunciou que deve recorrer da decisão, mas, caso seja implementada, o presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativos do Ceará (Amap-CE), Rafael Keylon, acredita que pode prejudicar os colaboradores da plataforma. Passageiros também podem ser impactados. 

Ao ser obrigada a estabelecer uma relação com os condutores, a empresa passar a ter que arcar com direitos trabalhistas, como férias e folgas remuneradas, o que pode reduzir a margem de lucro. Atualmente, a Uber fica com até 40% do valor de uma corrida, mas se for estabelecer um vínculo, o representante da categoria no Estado analisa que esse percentual deve subir. Keylon foi entrevistado pela Rádio Verdes Mares nesta sexta-feira (15), 

A Uber vai ter que administrar esse dinheiro que ela está tirando do motorista: tirar a porcentagem dela, também a de folga remunerada e a de férias do motorista. A gente teme que isso vai fazer a Uber tirar ainda mais do motorista. Daqui a pouco, ele vai ter dividindo meio a meio o valor com a Uber."
Rafael Keylon
Presidente da Amap-CE

Impactos para passageiros

Rafael destaca que, caso seja implementada a decisão, a plataforma também terá direitos como empregadora. Ou seja, poderá, por exemplo, demitir os motoristas, já que eles seriam funcionários. Essa possibilidade, em conjunto com o repasse menor de dinheiro, pode gerar, inclusive, a redução da oferta de colaboradores e uma queda na qualidade do serviço.

"Não existiria mais aquela questão de rodar somente nos finais de semana. Não. Ela [Uber] contrataria quem ela julgasse que fosse ficar rodando só por ela. Claro, isso ainda está no campo da suposição. [...] O aplicativo não vai bloquear, ele passa a só demitir. Se você não pegar as corridas que ele quer, se você cancela demais, ele só mandaria a sua demissão e acabaria o vínculo", projeta Keylon.

Para o representante da Amap-CE, além da redução na oferta de condutores, os usuários ainda poderiam observar o aumento de 10% a 15% no valor pago pelas corridas. No entanto, esse impacto seria menor se comparado ao que os colaboradores devem sofrer.

"A gente sabe que essa relação comercial entre passageiros e aplicativos requer uma vantagem. Não existe só um aplicativo, e o passageiro vai chamar o que estiver mais barato. Então, essa briga entre aplicativos para manter o passageiro vai fazer com ele não sofra tanto. Quem é que vai sofrer? O motorista", acredita. 

"A julgar pelos aumentos que a gente teve nos últimos anos, em relação ao que é pago ao motorista e o que é oferecido ao passageiro, a gente imagina que os aplicativos, por causa dessa concorrência [entre eles], não vão querer repassar essa situação do aumento para os passageiros", afirma o representante dos motoristas.

Há chances de a Uber deixar o Brasil?

Ainda à Rádio Verdes Mares, Rafael rechaça a possibilidade de a empresa deixar o Brasil, ou qualquer outra que atua no setor de transporte por aplicativo. Ele analisa que, mesmo com a obrigação de vínculo empregatício, essas plataformas continuariam tendo lucro suficiente

"O principal meio de transporte do Nordeste, do Norte, do Brasil, com exceção de poucas cidades, é transporte por aplicativo. O maior case de sucesso dos aplicativos é no Brasil. [...] Mesmo pagando vínculo trabalhista, ainda é vantagem para qualquer aplicativo ficar."
Rafael Keylon
Presidente da Amap-CE

Por fim, ele destaca que, caso a Uber decida sair do País, existem discussões sobre projetos de lei que criariam aplicativos públicos brasileiros do tipo. "Qualquer empresa que criar um aplicativo, após a Uber, terá sucesso".

O que diz a Uber

Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a Uber afirmou que irá recorrer da decisão da Justiça. A empresa disse ainda que "não vai adotar nenhuma das medidas elencadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados".  

"Há evidente insegurança jurídica, visto que apenas no caso envolvendo a Uber, a decisão tenha sido oposta ao que ocorreu em todos os julgamentos proferidos nas ações de mesmo teor propostas pelo Ministério Público do Trabalho contra plataformas, como nos casos envolvendo Ifood, 99, Loggi e Lalamove, por exemplo", dizia nota.

A Uber disse ainda que essa decisão utiliza-se de um entendimento isolado e que não considera as evidências concretas apresentadas. "A Uber tem convicção de que a sentença não considerou adequadamente o robusto conjunto de provas produzido no processo e tenha se baseado, especialmente, em posições doutrinárias já superadas, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal", pontuou.

Por fim, a plataforma reitera que no Brasil não há legislação regulamentando o novo modelo de trabalho intermediado por plataformas.