Juntar sachês de ketchup e maionese para evitar a compra dos condimentos no supermercado, usar o cabelo como fio dental, optar por fazer serviços de beleza e consertos em casa e até guardar a água do banho para posteriormente dar descarga.
Essas são algumas das práticas utilizadas pelas pessoas que se proclamam muquiranas. Elas buscam estratégias para economizar, principalmente diante da alta da inflação. No Facebook, o grupo Os Muquiranas já acumula mais de 13 mil membros, sendo 1.224 novatos, que entraram na última semana.
Os muquiranas utilizam o espaço de discussão para compartilhar dicas de economia das mais estranhas, desde tomar banho com apenas um copo de água e um lenço, utilizar fios de cabelo como fio dental até uso de cueca velha como pano de limpeza.
A educadora financeira da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin), Juliana Barbosa, explica que o ato de poupar é importante para que cada indivíduo saiba lidar melhor com dinheiro. Ele não deve, contudo, ser ensimesmado: sempre deve haver um objetivo.
Economia de mais de R$ 1 mil por mês
A graduada em administração de empresas Taciana Silva, de 31 anos, começou a buscar economizar por volta da adolescência. Ela calcula que gasta por ano com lazer e procedimentos de estética R$ 132, uma economia total de R$12.220 segundo seus cálculos.
“Meu cabelo sou eu mesmo que corto, economizando R$ 30 a cada quatro meses. Faço minhas unhas com a técnica acrilfix, que consiste em utilizar cola para unhas à base de cianoacrilato com fibra de vidro, só que ao invés do vidro eu uso papel higiênico. Com as unhas gasto por mês cerca de R$ 2, enquanto que no salão a aplicação custaria R$ 100”, cita.
Ela mora com os pais e duas irmãs em Sobral e não possui renda própria, dependendo da aposentadoria dos pais para manter a casa. Segundo ela, o pai a ajuda na economia, mas a mãe e as irmãs nem tanto. Além dos gastos pessoais, ela também busca economizar nas contas de casa.
Eu tomo banho em pé em uma bacia grande pra aparar a água e vou usando ela para dar descarga com outro balde pequeno. Também coloco outra (bacia) na pia quando lavo os pratos para usar na descarga. É uma água com sabão que iria pro ralo. Eu não tenho coragem de dar descarga ou lavar o chão com água potável. Também uso a água que cai do motor do ar-condicionado pra isso".
A economia também entra nas pequenas coisas. Ela conta que utiliza apenas um lado do cotonete para limpar os ouvidos, cortando a parte suja e guardando a limpa para outro momento. Quando vai a mercados e restaurantes, ela pega sachês gratuitos de maionese, ketchup e shoyo para não ter de comprar.
Além disso, ela se inscreve em clubes para ganhar itens de higiene e beleza gratuitamente. Ela também tem o costume de pedir bananas que já estão maduras demais para venda nos comércios e utiliza o alimento para fazer doces em casa.
Conforme Taciana, todas as suas “muquiranices” tem como objetivo torná-la independente financeiramente no futuro. Ela não planeja largar os hábitos.
“Meu objetivo é não ser dependente de terceiros pra fazer minhas coisas e manter minha rotina. Sou recém formada e ainda não trabalhei o suficiente pra economizar para possuir um bem de alto custo ou fazer uma longa viagem, mas também não tenho gastos elevados nem necessidade deles. Não me falta nada”, destaca.
Poupar com objetivo
A educadora financeira Juliana Barbosa ressalta que o poupar e o economizar são importantíssimos, principalmente em um país que não possui esse hábito. Mas, por trás do juntar dinheiro, devem sempre estar os sonhos.
Não é um poupar para acumular, guardar por guardar. Eu gosto de chamar de sonhos, de metas. Você tem que poupar para realizar um determinado sonho, para suprir uma necessidade, para aposentadoria. O principal quando a gente fala de poupar é direcionar esse poupar".
Ela aponta que cada família possui uma realidade financeira e não há como definir exatamente quanto se deve guardar por mês. A educadora financeira indica que se deve guardar pelo menos 10% dos rendimentos mensais.
O máximo deve ser definido de acordo com cada realidade, mas os muquiranas devem tomar cuidado para que a poupança não se torne um distúrbio financeiro.
“A gente precisa entender que tudo na vida é o equilíbrio. Para todas as áreas da nossa vida tem que ter equilíbrio e com dinheiro é a mesma coisa. Eu não posso simplesmente poupar tudo nem gastar tudo, tenho que entender algumas necessidades e entender que eu tenho que poupar dinheiro com objetivos. Para viagem, faculdade, para aposentadoria”, exemplifica.
Juliana acrescenta que o supérfluo em cada orçamento é relativo e é importante se permitir a alguns “luxos”, que podem ser importantes. “Se a gente não vive hoje e aproveita, quando a gente morre o dinheiro fica aí. É preciso equilíbrio”, chama atenção.
Hábito de poupar
Para a atendente comercial Renara Maria, de 29 anos, o hábito de poupar veio desde a infância. Ela conta que sua mãe costumava impor limites em casa para economizar, os quais ela passou a aplicar quando passou a morar com o marido.
Ela conta que chegou a economizar por mês na faixa de R$ 1.500, em uma época que seu salário girava entre R$ 2.000 e R$ 2.500. A economia possibilitou que ela comprasse um carro à vista.
Para economizar, ela mesma faz em casa cabelo e unhas, evitando idas ao salão de beleza. Seu marido conserta e constrói itens para a casa, como móveis e portas.
“Eu pego a água da máquina de lavar e uso para lavar o banheiro, na descarga. Sabão eu misturo com bicarbonato de sódio e, na hora de lavar a roupa, misturo com vinagre, faz render mais o sabão também”, indica.
Renara destaca que percebe no bolso a alta nos preços e que aperta os cintos no final do mês para conseguir manter as contas em dia. Mesmo no aperto, ela ainda consegue juntar entre R$ 200 e R$ 300 todos os meses.
Segundo ela, toda a poupança é feita para que a família possa ter segurança financeira.
Esse é o motivo que faz com que a correspondente bancária Ana Dourado também busque formas de economizar.
“Só compro lanches em delivery se tiver descontos. Só pego Uber em casos de chuva ou emergência. Só compro algo quando encontro promoção e faço estoques de produtos essenciais quando encontro com descontos”, enumera.
Ana calcula que economiza por volta de R$ 2.000 por ano. Mesmo juntando dinheiro, ela consegue trocar de iPhone a cada dois ou três anos, tem reserva de emergência e uma renda destinada para lazer e consegue pagar um bom plano de saúde.