Dez anos de Beyoncé e Paul McCartney: por que Fortaleza não recebe mais grandes shows internacionais

Câmbio elevado e a ainda baixa oferta de voos internacionais para Fortaleza inviabilizam a atração de artistas internacionais para o Ceará, com shows limitados ao Sul e Sudeste

Quem estava em Fortaleza entre 2009 e 2014 teve a possibilidade de assistir a estrelas como Beyoncé, Paul McCartney, Jennifer Lopez, Elton John, Evanescence e vários outros artistas que vieram a capital cearense para se apresentar.  

Dez anos depois, a realidade para quem quer ver ao vivo atrações internacionais inclui acrescentar ao preço do ingresso um custo de passagens aéreas e hospedagem. Isso porque, quando os artistas vêm ao Brasil, os shows ficam concentrados em São Paulo e Rio de Janeiro, chegando no máximo a destinos como Brasília, Curitiba ou Belo Horizonte.  

O sumiço de atrações internacionais no Nordeste e em Fortaleza nos últimos anos têm explicações econômicas e logísticas. Com o dólar mais caro, o pagamento dos cachês dos artistas se tornou, muitas vezes, inviável para produtores cearenses. 

A pouca infraestrutura para eventos de grande porte e a menor oferta de voos internacionais para Fortaleza após a pandemia também são questões que fizeram com que artistas que vieram ao Brasil nos últimos anos como Coldplay, Harry Styles e Guns N' Roses, não pousassem na capital cearense. 

Custos elevados 

O presidente da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape-CE), Colombo Cialdini, explica que o contexto socioeconômico no início dos anos 2010 propiciou a vinda de atrações internacionais para Fortaleza. A disponibilidade de voos para Fortaleza também facilitava a logística. 

No passado, o poder aquisitivo das pessoas era maior, havia uma estabilidade socioeconômica maior. Se tinha um investimento feito pelo governo do Estado que transformou o Estado em um grande hub aéreo, se tinha para cá voos da Europa, das Américas”.
Colombo Cialdini
Presidente da Abrape-CE

A situação começou a mudar desde antes da pandemia, com crises políticas que trouxeram um contexto de instabilidade para investimentos. Com isso, grandes patrocinadores de eventos passaram a ter mais cautela. 

O sócio diretor da D&E, Douglas Santos, acrescenta que o câmbio é um ponto central para a atração de artistas internacionais.  

Ele participou da organização dos shows como o do Black Eye Peas, Jack Jonckson, George Benson, Evanescence, David Guetta e A-ha. Naquele período, o dólar girava em torno de R$ 2 e R$ 2,60, enquanto hoje a cotação está em torno de R$ 5. 

“Tem um dólar a aproximadamente R$ 5, é você pagar 5 vezes o valor de um cachê quando você transforma. Fica bastante discrepante quando se compara com atrações nacionais que também tem uma força de público muito grande. Isso impacta também na precificação do ticket”, aponta. 

Outra questão é a malha aérea, um aspecto prejudicado sobretudo depois da pandemia. Com menos voos disponíveis e custos altos de passagens e para o transporte de equipamentos, normalmente apenas produtoras maiores do Sul e Sudeste têm caixa para bancar. 

“Nós sempre temos o desejo de trazer o que o público quer consumir, hoje o consumidor tem que se deslocar para outros lugares para assistir a esse show. Nosso desejo era trazer essas oportunidades para cá, mas infelizmente fica apenas no desejo”, lamenta. 

Para ele, o cenário atual é de adaptação. Ele espera que mais shows internacionais possam vir a Fortaleza em 2024, quando as produtoras de eventos estiverem mais bem recuperadas do impacto da pandemia. 

“Todo o setor de eventos foi o mais sacrificado da pandemia, desestabilizou muito todas as empresas. Esse cenário do internacional tem que antecipar muito todos os pagamentos, antes mesmo de vender os ingressos. Precisa ter um suporte de caixa para conseguir fazer esse investimento”, diz. 

Infraestrutura e logística 

Trabalhando na área de eventos desde 2009, o sócio do Grupo 2FX, Kleiton Holanda, já ajudou a trazer para Fortaleza artistas como DJ Tiesto e DJ Claptone, mas reconhece que já há algum tempo Fortaleza deixou de ser um destino para shows internacionais. 

Ele conta que há dez anos havia uma preferência dos próprios artistas em fechar várias cidades em um mesmo país durante a turnê. Hoje, em vez do número de cidades, é priorizado o número de apresentações. 

Hoje os artistas em maior expressão mundial, preferem fazer mais sessões dentro de uma mesma cidade que tem um maior potencial de receber o público de todas as regiões do Brasil, pois os shows acabam se tornando mais viáveis no ponto de vista de custos com estruturas já que permanecem montadas, na logística dos artistas, etc".
Kleiton Holanda
Produtor de eventos

Ele afirma que não enxerga perspectivas de melhoras e pontua que a falta de infraestrutura e espaços adequados para recepcionar grandes shows é um dos grandes problemas da capital cearense nesse quesito. 

“O único local apto a receber grandes eventos internacionais, mesmo sobrecarregado de jogos, é um espaço administrado pela iniciativa pública [Castelão] que não consegue fazer uma gestão empresarial adequada como um ambiente de grandes eventos, ao contrário por exemplo do Allianz Park [em São Paulo], estádio que consegue fazer uma final de campeonato em um dia e um show para 40 mil pessoas no outro ou vice-versa, devido à competência dentro de sua operacionalização”, critica. 

A reportagem do Diário do Nordeste demandou à Secretaria dos Esportes para saber detalhes da gestão do Castelão. Em nota, a pasta informou que a expectativa é receber no ano de 2023 um total de dez grandes shows. 

"O último evento realizado no estacionamento externo foi o show do Gustavo Lima, no último sábado (2), que recebeu um público de 40 mil pessoas. Nesses últimos dias, em paralelo ao show - com a montagem da estrutura do evento - o equipamento foi destaque na operacionalização, mesmo com a redução de vagas de estacionamento, recebeu jogos com público de 40 mil torcedores e teve a operacionalidade concluída com excelência, com a saída de torcedores e recebimento do público para o grande show", destacou.