O Superior Tribunal de Justiça (STJ) adiou na última semana a decisão se o rol de procedimentos definidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) deve ser considerado exemplificativo ou taxativo.
A decisão deve ser definida em um prazo de até 90 dias, quando o tema entrará em pauta novamente. O julgamento do STJ pode ter impacto imediato sobre usuários de planos de saúde, sobretudo pessoas com necessidade de tratamentos específicos.
A ANS possui uma lista de mais de 3 mil tipos de consultas, exames, terapias e cirurgias com cobertura obrigatória por parte dos planos de saúde. Hoje, contudo, segurados que precisam de algum procedimento que não está na lista conseguem entrar na justiça para garantir a cobertura do plano.
Caso o STJ julgue o rol de procedimentos como taxativo, as operadoras de saúde terão de cobrir apenas os itens definidos pela lista da ANS.
Taxativo ou exemplificativo?
Duas visões sobre como interpretar o rol de procedimentos da ANS divide os ministros do STJ: se ele é uma lista fixa ou apenas sugestiva.
“O taxativo é uma lista fechada e se não estiver lá a pessoa vai ter que pagar do próprio bolso. O exemplificativo é o que temos hoje, o plano de saúde tem que cobrir independentemente de estar ou não no rol da ANS”, resume advogado especializado em direito médico e mestre em direito pela PUC-SP, Washington Fonseca.
Para o presidente da Associação Cearense de Defesa ao Consumidor (ACDC), Thiago Fujita, a interpretação da lista como taxativa dificulta o acesso do consumidor a procedimentos mais específicos, afetando sobretudo pessoas com doenças graves ou necessidades especiais.
Ele acrescenta que a lista não tem atualização há algum tempo. Limitar a cobertura dos planos de saúde, segundo ele, faz com que o segurado precise arcar do próprio bolso para ter acesso a procedimentos que podem ser importantes para a vida do paciente.
Entretanto, existe uma preocupação muito grande de se engessar a cobertura de saúde observando que estamos lidando com a saúde e a vida do consumidor. Quando há uma recusa, muitas vezes o consumidor tem que ir à justiça e, sendo exemplificativo, o juiz tem a interpretação de quem deve decidir [a cobertura ou não] é o médico
Washington pontua, ainda, que a decisão do STJ pode levar um número maior de pessoas em busca do SUS, que pode ficar sobrecarregado.
“A questão é que se essa decisão do taxativo permanecer, as pessoas vão continuar pagando pelo plano de saúde, mas se tiver alguma doença que não conste do rol, vão ter que pagar do próprio bolso. As pessoas vão ter uma tendência maior de migrar e procurar o SUS mesmo com plano de saúde”, explica.
Preço dos planos de saúde
Washington Fonseca considera que não deve haver qualquer alteração sobre o preço dos planos de saúde a depender da decisão do STJ.
Ele afirma que as operadoras não irão baixar os preços ou diminuir reajustes, mesmo diante do menor número de procedimentos a ser coberto caso a lista seja considerada taxativa.
O advogado compara a situação com a decisão sobre pagamento de despacho de bagagens, no setor aéreo. “Foi dito que o preço das passagens diminuiria, mas não foi isso que vimos”, defende.
“Diminuição dos preços não é algo que o consumidor poderá esperar. O que eles podem é dizer que os reajustes terão uma perspectiva menor porque tem previsibilidade. Mas eu que trabalho há 15 anos no direito do consumidor, não acredito”, ressalta Thiago Fujita.
Em nota, a ANS defendeu que o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde tem caráter taxativo. E, sendo exemplificativo, poderia haver impacto na definição de preços.
Vale destacar ainda que, além da falta de padronização das coberturas, o caráter exemplificativo do rol - por não conferir previsibilidade quanto aos procedimentos e eventos que podem vir a ser utilizados - tenderia a elevar os valores cobrados pelas operadoras aos seus beneficiários, como forma de evitar a sustentabilidade de suas carteiras
Ações regulatórias
Segundo a agência, a lista serve como base para que possam ser aplicadas ações regulatórias, como fiscalização do atendimento das coberturas, cobrança de ressarcimento ao SUS e definição das margens de solvência e liquidez das operadoras.
A ANS também reiterou que “vem aprimorando sistematicamente” o processo de atualização do rol, para que ele seja ágil, acessível e esteja de acordo com o que há de mais moderno na medicina.
“Assumir que o rol seja meramente exemplificativo significa, no limite, atribuir a cada um dos juízes do Brasil a prerrogativa de determinar a inclusão de cobertura não prevista em contrato ou no rol de cobertura mínima, o que traria o aumento da judicialização no setor de saúde e enorme insegurança ao setor de saúde suplementar, na medida em que seria impossível mensurar adequadamente quais os riscos estariam efetivamente cobertos. O que impacta na definição do preço dos produtos”, destaca.