Meireles, Aldeota, Messejana e Centro concentram o maior número de óbitos por Covid-19 em fevereiro

Juntos, os quatro bairros de Fortaleza somaram 48 mortes pela doença somente no mês passado

Messejana, Meireles, Aldeota e Centro foram os bairros que concentraram o maior número de óbitos por Covid-19 em Fortaleza,  no mês de fevereiro de 2021. Juntos, somam 48 mortes, sendo 17 em Messejana, 11 no Meireles, 11 na Aldeota e 9 no Centro.

No período, ainda foram registrados outros 105 óbitos, totalizando 153, mas não há informações sobre os bairros onde eles ocorreram. Os dados referentes ao número de mortes por bairro de residência são consolidados mensalmente e disponibilizados nesta terça-feira (16) pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), por meio da plataforma IntegraSUS.

Chama a atenção que o total de óbitos nos bairros com mais mortes - variáveis a cada mês - em fevereiro é o maior verificado desde maio de 2020 (345). De janeiro para fevereiro de 2021, o número de mortes nos bairros também cresceu 218,75%, saindo de 48 para 153. 

Na classificação de óbitos segundo mês de ocorrência e bairro de residência, a Sesa considera apenas os cinco bairros com maior número de óbitos no período. Contudo, o que seria o quinto bairro é a soma dos locais não informados nesta categoria.

Em toda a Capital, o mês de fevereiro registrou 452 mortes por Covid-19. No Ceará, foram 913 no mesmo período.

Agravantes combinados

A recente alta de óbitos tem como justificativa uma série de fatores combinados, que suplantaram até mesmo os aprendizados sobre a doença e já incorporados pelos sistemas de saúde ao longo da pandemia. É o que avalia o epidemiologista e professor na Universidade Federal do Ceará (UFC), Luciano Pamplona.

"Com o início das eleições, passou a haver uma aglomeração muito importante de pessoas, que casou com as festas de final de ano e o Carnaval. Então, esses cenários já, desde o ano passado, favoreceram uma maior proximidade das pessoas".

Pamplona ainda cita como agravante a entrada de uma nova cepa no Estado, com grau de transmissibilidade maior. "Isso gerou um número de casos muito maior do que a gente imaginava, de forma que a transmissão hoje é muito mais intensa do que em alguns momentos de 2020".

Bairro populoso

No mês passado, Messejana foi o bairro a registrar o maior número de mortes por Covid-19 em Fortaleza. Em maio de 2020, a área também estava entre as cinco com mais ocorrências fatais, somando 51 mortes. De acordo com o especialista, o bairro tende a aparecer mais vezes nas estatísticas por ser populoso, tal como Barra do Ceará, que na ocasião registrava 70 óbitos.

O último boletim epidemiológico divulgado pela Prefeitura de Fortaleza, inclusive, aponta que Messejana tem 45.675 habitantes e 4.855 casos confirmados de Covid-19, com taxa de mortalidade de 238,6 por 100 mil habitantes.  

"Nesses bairros onde há mais gente morando, vai ter mais gente doente e, por consequência, é possível esperar um maior número de óbitos. Isso não está ligado a nenhum tipo de risco específico lá na Messejana, por exemplo", esclarece Pamplona.  

Recorrência em bairro nobre

Dos quatro bairros acima citados, Meireles é o único bairro a aparecer na lista dos que tiveram mais mortes por Covid em janeiro (8) e em fevereiro (11) deste ano, acumulando 19 óbitos.

Por concentrar um grande número de estabelecimentos comerciais, o bairro nobre reúne pessoas com maior poder aquisitivo. No bairro, ocorreram os primeiros registros de transmissão da Covid-19 na Capital. 

"Naturalmente, as doenças que vêm de fora chegam primeiro nos bairros mais ricos porque as pessoas desses locais vão viajar para fora e trazer a doença", diz Pamplona, exemplificando que a dinâmica é a mesma observada durante a epidemia de H1N1. 

"Quando a H1N1 chegou a Fortaleza, nos dois primeiros meses, 90% dos casos se concentravam em Meireles e Aldeota. Somente nos meses seguintes, a doença se espalhou para a periferia". 

'Triste realidade'

Herman Araújo Ladenthin, de 32 anos, foi uma das vítimas da Covid-19. Diagnosticado com autismo, ele vivia em uma casa na região do Centro de Fortaleza.

Ele apresentou os primeiros sintomas da doença no último dia 3, com uma tosse seca, seguida de febre e falta de ar. No dia anterior, a mãe de Herman, a cuidadora Themis Araújo, 62, foi encontrada morta em um apartamento no Bairro de Fátima. 

"Ele foi à UPA do Edson Queiroz, retornou [para casa] depois de medicado, mas o quadro agravou. Levaram ele novamente pra UPA e ele passou dois dias lá [internado]", rememora o professor Ricardo Carvalho Araújo, tio de Herman e irmão de Themis. 

Com o agravamento do quadro de saúde, os profissionais da UPA tentaram intubá-lo e, em seguida, fazer a reanimação, mas ele não resistiu e faleceu na noite do último dia 8 de março. 

"É uma situação muito delicada pra família, mas é uma triste realidade", desabafa o professor.

Maior rigidez

Mesmo com a adoção de medidas mais rígidas contra a Covid-19 em Fortaleza, desde o último dia 5, os resultados ainda não são tão perceptíveis porque o Estado, assim como o Brasil, "nunca fez lockdown", sentencia Pamplona. 

"A população nunca permaneceu toda em casa por 15 dias. Parte da cidade continua normal, com pessoas saindo".

Essa ausência de uma ampla e irrestrita rigidez, completa o epidemiologista, é o que leva o Estado a ter que recuar repetidas vezes no afrouxamento das medidas.

"Quanto mais tempo a gente demorar a aderir a essas medidas de isolamento, mais tempo a gente vai ficar protelando essa meia medida. Ao invés de fazer um lockdown efetivo de 15 dias, em que a população pare e só liberem os serviços essenciais, vamos ficar nos enganando".