Quem passa pela rua esburacada, na periferia de Fortaleza, consegue ouvir as gargalhadas constantes de Yarley Ara e Rayssa Bezerra e sua família. Com pouco espaço para o silêncio, a casa pequena possuía o aconchego de quem está acostumada com o barulho de quem é feliz. O influencer que ganhou visibilidade com os bordões "Bufo, querida" e "Trava na beleza" tem mais de cinco milhões de seguidores no Instagram e mais de 215 mil no TikTok.
É mais gente seguindo o cearense que a população das cidades de Brasília, Fortaleza, Belo Horizonte ou Manaus. É um dos influencers de maior destaque no Ceará, fazendo participação, inclusive, em programas como Encontro com Fátima, na Globo. Embora hoje muitas pessoas o acompanhem, sua caminhada até o sucesso demorou para chegar.
A história de Yarley e Rayssa é contada na série de matérias que Diário do Nordeste publica sobre o mercado de criadores de conteúdos e sobre influenciadores digitais da periferia de Fortaleza. Até sábado (5), vamos divulgar, a cada dia, o perfil de um influencer e mostrar como eles chegaram ao sucesso nas redes sociais.
O jovem de 20 anos começou fazendo vídeo de maquiagem no YouTube. O canal tinha apenas 16 inscritos, que segundo Rayssa, esses 16 eram ele mesmo. “Eu pegava o celular do povo daqui de casa e saia me seguindo. Quando tinha vídeo de pergunta e resposta, era eu mesma que fazia as perguntas”. Aos 12 anos ele passou a trabalhar montando pula-pula em festas, ganhando R$ 30 por evento. Na adolescência, chegou a vender vestidos em uma loja no Centro de Fortaleza.
“Minha mãe vem de uma família muito simples, tudo que eu tive foi por muito esforço dela. Eu nunca tive pai, mas ela supriu esses dois lados muito bem feito, e se eu me tornei esse homem hoje foi graças a ela”,
No início da carreira de digital influencer, Yarley chegou a fazer divulgação de graça ou trocava por produtos. Depois passou a cobrar R$100. Hoje, ele diz orgulhoso: "sou o provedor da casa". Aposentou a mãe, que trabalhava como auxiliar de serviços gerais e fazia faxinas. Colocou a irmã Rayssa para estudar em escola particular, comprou uma casa para a família e abriu a "Loja das Irmanzonas”. “É incrível, estar podendo proporcionar tudo que minha mãe me proporcionou, lógico que não é nem 1% do que ela fez por mim”.
Adotando o bordão que identifica os seguidores do seu perfil, a loja conta com produtos como blusas e chaveiros, que possuem as principais gírias do influenciador. Além da loja, Yarley também é sócio de uma agência de comunicação e gerenciamento de carreira, responsável por agenciar influenciadores locais, como a Emmas, de quem dirigiu a versão do clipe “Ama Sofre Chora”, da cantora Pabllo Vittar. “É uma forma que eu encontrei de ajudar pessoas que, assim como eu, sempre sonho em viver com isso. Assim nós damos oportunidades e trazemos para o foco”, ressalta.
Posicionamento
Com profunda gratidão pela mãe, Ariete Bezerra, o jovem reforça que ela os escolheu para amar. “Eu não sei se as pessoas sabem, mas eu sou adotado. Todos nós aqui em casa somos, e esse é o maior significado da vida. Porque quando você gera uma criança, você tem obrigação de amá-la porque você gerou, mas quando você adota, você está escolhendo ela para ser amada”.
Embora ele se defina como “homem gay”, ele afirma que não tem público definido. “Eu quero entrar na casa das famílias, seja lá qual seja. Quero que eles se identifiquem comigo e me aceitem. Eu sei que tenho uma responsabilidade muito grande com as coisas que eu falo, e eu sei que tenho uma bandeira e representatividade por ser gay, mas não é o ponto x”.
A alegria e a auto-estima é que parecem ser a bandeira do jovem. O conteúdo que ele costuma produzir- geralmente ao lado da família- são bem-humorados e fazem o apelo a aceitação. Inclusive seus bordões famoso "Trava na beleza" e "Faz cara de garota, pose de garota" surgiram para que a irmã caçula superasse o bullying que sofria na escola e se aceitasse.
Sonho vem do cinema
Pelo que ele se lembra, desde criança gostava de “aparecer”, mas o deslumbre pela comunicação em massa se deu precisamente na primeira vez em que ele sentou na poltrona de um cinema. Ao ver a tela e a reação do público ao filme, ele foi tomado pela sensação de “é isso que eu quero fazer, quero deixar as pessoas assim”.
No começo, ele foi bastante criticado, contando apenas com o apoio de sua mãe. “Quando você bota na cabeça que quer um determinado sonho, você tem que confiar em você, e ir atrás. Não adianta ficar: ‘meu Deus por favor’, Deus quer, mas você tem que ir atrás. Hoje, quando eu já tenho certo “sucesso”, eu recebo apoio das pessoas que antes não me deram. Gente que nunca falou comigo agora fala”, pondera.
Hoje, ele sustenta a casa por meio da internet e pode realizar não apenas os seus sonhos, mas também de todos os que ama, como os da sua irmã Raíssa, que aos nove anos já tem seu próprio celular, coisa que ele só foi ter após juntar dinheiro trabalhando e com ajuda da sua mãe.