Tombado, clube Náutico tem obra de Hard Rock Cafe aprovada em Conselho do Patrimônio de Fortaleza

Segundo o projeto avaliado, o empreendimento é temporário e alteraria muro da fachada voltada para a Avenida Beira-Mar, além de parte de quadra desativada

Tombado pela Prefeitura de Fortaleza há mais de 10 anos, o clube Náutico Atlético Cearense passa por mais uma discussão sobre a preservação arquitetônica do espaço. Desta vez, o Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Histórico-Cultural (Comphic) aprovou a implantação de um novo empreendimento do Hard Rock Cafe Fortaleza em parte da estrutura do local.

Conforme publicação no Diário Oficial do Município (DOM) de 16 de outubro, no mês de agosto, o grupo se reuniu para avaliar uma proposta de intervenção no muro da fachada do clube voltada para a Avenida Beira-Mar, bem como em trecho das quadras que estão no entorno da área protegida.

A ideia inicial era implementar um stand de vendas do Hard Rock Cafe no espaço que não é mais utilizado pelo clube, abrindo espaço para a fachada e implementando paisagismo e área de convivência. 

No Náutico, a área tombada é apenas a parte histórica da torre, onde fica o Salão Nobre, voltada para a Av. Abolição. A necessidade de o projeto passar pelo crivo do Conselho leva em consideração o entorno da parte tombada. 

Originalmente, haveria a instalação de uma guitarra gigante para sinalizar o local, mas o plano foi negado pelos conselheiros. A proposta acolhida foi manter o equipamento na mesma altura do muro, segundo a arquiteta Júlia Jereissati, conselheira do Comphic e conselheira superior do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) no Ceará.

“Não é um restaurante, não é uma megainfraestrutura. O que vai ser utilizado é uma parte já desativada das quadras inferiores. Não interfere efetivamente em nada da estrutura da casa, nem dos formatos, em hipótese alguma”, disse em entrevista ao Diário do Nordeste.

Imagens obtidas pela reportagem mostram como ficaria a intervenção:

'Contas não fecham'

Segundo Jardson Cruz, presidente do Náutico, a gestão busca equilíbrio financeiro para dar manutenção adequada ao clube, cujo IPTU cobrado pelo Município está em torno de R$380 mil por mês. Atualmente, o local é alugado para eventos e tem o desafio de se manter aberto para sócios e projetos sociais atendidos por lá. 

“Vai ser mais uma renda para o Náutico, mas longe de, com isso, alcançarmos o equilíbrio financeiro”, argumenta Jardson.  “As contas realmente não fecham. Esse empreendimento é um dos que vai para lá no sentido de amenizar a questão dos impostos”.

Conforme representantes da empresa na reunião, o tempo de contrato do empreendimento seria de dois anos e ficaria em um espaço “obsoleto”. Após o tempo de contrato, os muros do Clube seriam levantados para sua forma original.

O Hard Rock Cafe Fortaleza informou que o ponto no Náutico está no planejamento de expansão comercial da empresa, mas ainda não foi decidido o que será instalado no local e nem quando será inaugurado.

Júlia Jereissati, representante do IAB-CE, reforça que o projeto garantiria sobrevida ao clube. Além disso, pontua que houve uma proposição de que as pedras originais do muro sejam guardadas para uma possível reinstalação após o fim do contrato.

Em nota, a Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza (Secultfor) confirmou a permissão da mudança. "Para aprovação, foram realizadas alterações a partir de recomendações da Coordenação de Coordenação de Patrimônio Histórico-Cultural (CPHC) da Secultfor, para preservar a originalidade da edificação", ressalta.

Agora, o projeto deve passar pelos trâmites administrativos de licenciamento da construção. 

Como foi a discussão?

Na reunião de agosto, os conselheiros presentes à reunião questionaram que as imagens apresentadas não deixavam claro como a obra iria impactar o bem tombado, tanto pela guitarra como pela nova iluminação. 

Além disso, perguntaram se a Secultfor teria um parecer prévio sobre a intervenção, uma vez que as obras ocorreriam dentro da poligonal de tombamento, mas a Pasta ainda esperava um posicionamento do próprio Conselho.

Devido à falta de informações naquele momento, o projeto não foi aprovado. Os conselheiros do Comphic aguardaram o envio de imagens e materiais complementares para analisar a questão com mais propriedade.

Complicações anteriores

Essa não é a primeira vez que há um embate entre patrimônio e sustentabilidade financeira no Náutico. Em 2013, foi anunciado o projeto “Novo Náutico”, que envolvia o arrendamento de parte do espaço para a construção de um hotel, shopping center e torres empresariais. 

Porém, um grupo de sócios contrários recorreu judicialmente para barrar a execução. Foram anos de disputas até que o projeto foi descontinuado. Em 2020, foram planejadas melhorias no Clube, com a instalação de teatro, cafeteria e dois restaurantes. 

História do Náutico

Agremiação criada para a prática de esportes, o Náutico Atlético Cearense foi fundado em julho de 1929, com instalações simples em um terreno alugado na Praia Formosa, onde hoje é o centro de Fortaleza. Após alguns anos, os sócios transferem as atividades para uma nova sede de alvenaria em terreno na Rua Barão do Rio Branco, onde permanece até 1944.

Com uma campanha de atração para novos associados, a agremiação passou a planejar sua terceira sede - a atual e definitiva -, iniciada em 11 de janeiro de 1948. O projeto arquitetônico coube ao húngaro Emílio Hinko, responsável por importantes obras na cidade.

Nos traços, se observa forte influência da arquitetura europeia. Esse prédio original, cuja parte social foi inaugurada em julho de 1952, foi o espaço de interesse para o tombamento municipal, 60 anos depois.

Em 1954, foi concluído o “Salão Nobre”; cinco anos depois, seria a vez do parque aquático. Entre os anos 1950 e 1960, o Náutico promoveu diversos eventos lúdicos e sociais na cidade, incluindo competições esportivas, bailes de carnaval, concursos de Miss, exposições de arte e eventos filantrópicos. Também sediou cerimônias como casamentos, formaturas e lançamentos de livros.

A partir dos anos 1980, o Clube começou a sofrer mudanças administrativas; perdas de associados e sócios e a concorrência com outros espaços e formas de lazer na Capital em plena expansão.