Meses depois do anúncio de retirada do Mausoléu Castelo Branco do Palácio da Abolição, em Fortaleza, a família do primeiro militar a assumir a presidência do Brasil durante a ditadura após o Golpe Militar em 1964, o cearense Humberto de Alencar Castelo Branco, quer levar os restos mortais - do militar e da esposa Argentina Viana - de volta ao Rio de Janeiro. Em agosto de 2023, o governador do Ceará, Elmano de Freitas, informou sobre a mudança no monumento que funciona na sede do governo estadual.
O Governo estadual afirma que o Mausoléu, inaugurado em 1972, segue abrigando os restos mortais nas urnas mortuárias de Castelo Branco e de Argentina Vianna Castello Branco. No Ceará, circularam rumores de que não estariam mais lá. Sem entrar no mérito da retirada em si anunciada pelo Governo, a neta, Helena Alvim Castello Branco, disse ao Diário do Nordeste que a família quer recuperar os restos mortais do avô e da avó e informou que a gestão ainda não fez contato oficial sobre o destino ou para estabelecer o traslado do material.
“Nós (os netos) também não estamos informados sobre os restos mortais, se já foram retirados. A Luísa (Cela, secretaria de Cultura do Ceará) chegou a falar comigo pelo Instagram, quis me ligar. Eu disse: liga na segunda-feira, e ela não ligou mais”, relata Helena ao Diário do Nordeste, registrando que a tentativa de contato, via rede social, foi feita em dezembro de 2023.
O Diário do Nordeste, na última sexta-feira, 12 de janeiro, entrou em contato com a Casa Civil e a Secretaria da Cultura do Estado (Secult) sobre o assunto. Um dos questionamentos foi justamente o contato com a família. Na quarta-feira (17) o Governo respondeu e informou que, por meio da Secult e da Casa Militar, “foi estabelecido contato com uma das netas para tratativas sobre as urnas mortuárias”.
Aguardando informações
“A gente ouviu falar dessa decisão do Governo de acabar com o Mausoléu e transformá-lo em um momento aos abolicionistas e retirar tudo de lá. O que a gente gostaria era de ter os restos mortais de volta. Para enterrar no cemitério”, relata Helena.
Questionada se a família não teria já feito essa retirada em anos anteriores e os levado para uma propriedade particular no Rio de Janeiro, como chegou a ser divulgado pela imprensa no Ceará, ela disse não ter conhecimento desse processo.
“Sobre os restos mortais, eles não estão aqui. Não vieram para o Rio de Janeiro. A gente até pensou em acionar o Exército para fazer alguma mediação (junto ao Governo do Ceará). Mas, estamos aguardando os acontecimentos para tomarmos alguma posição. Temos jazigo no cemitério São João Batista. Antigamente, antes de ir para o Ceará, eles ficavam nesse cemitério. Não temos nenhuma propriedade da família para usar nesse sentido (de ser usada para enterrar os restos mortais)”, acrescentou.
Helena é filha de Paulo Vianna Castello Branco (falecido) que, assim como o pai Castelo Branco, também foi militar. Na época da construção do Mausoléu na década de 1970, o capitão Paulo foi um dos responsáveis pela articulação do traslado dos corpos dos pais.
Antes de serem abrigados no Ceará, os restos mortais estavam no jazigo da família no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. O que, agora, pode ser a opção de desfecho da situação após a desocupação do Mausoléu, diz Helena.
Castelo Branco ocupou o cargo de presidente na ditadura de abril de 1964 a março de 1967. Ele morreu no dia 18 de julho de 1967, meses após deixar o cargo, em um acidente aéreo.
Helena relata que Castelo Branco teve 7 netos, e destes, 4 estão vivos. Além dela, a irmã Heloisa Alvim Castello Branco - que não mora no Brasil - e dois primos, filhos Antonietta Castello Branco Diniz (que inclusive foi tratada como primeira-dama, visto que quando ocupou a presidência na ditadura, Castelo Branco, já era viúvo), são eles: João Paulo Castello Branco Diniz e Antônio Luiz Castello Branco Diniz.
Ela contou ainda que, embora a família não tenha grande proximidade, os primos estão reunidos em um grupo de conversas e já discutiram esse ponto. “Tomamos a decisão de aguardar os acontecimentos e gostaríamos de ter os restos mortais de volta”.
Como é o Mausoléu Castelo Branco?
O Mausoléu, localizado na sede do poder Executivo do Ceará, na Avenida Barão de Studart, em Fortaleza, é uma grande estrutura em concreto armado com um balanço de 30 metros suspenso, que se projeta sobre o espelho d’água. O monumento integra o projeto arquitetônico da sede do Governo do Estado, um clássico da arquitetura modernista do Brasil.
A sede foi fundada em 4 de julho de 1970 e o Mausoléu é de 1972. Ele foi projetado pelo arquiteto Sérgio Bernardes. Na época, o capitão Paulo Castelo Branco, filho de Castelo Branco foi um dos responsáveis pelo traslado e na inauguração do prédio em Fortaleza entregou oficialmente os restos mortais dos pais à gestão estadual, conforme registra a edição do Jornal do Brasil do dia 19 de julho de 1972.
Quando inaugurado, a câmara funerária foi situada no monumento na extremidade final do balanço e era antecedida por galerias que abrigavam a exposição de documentos e objetos de Castelo Branco.
Conforme registros do Diário do Nordeste da década de 1990, além dos restos mortais, o Mausoléu abrigava itens de uso pessoal de Castelo Branco, entre os quais a faixa presidencial, a espada de General do Exército Brasileiro, a Carteira de Identidade e um relógio de pulso.
O Governo também foi indagado sobre esses pertences, e informou que “o Mausoléu abrigava pertences pessoais do ex-presidente na ditadura militar Humberto Castelo Branco. No começo dos anos 2000, foram solicitados pelos familiares, tendo sido entregues pelo Governo do Ceará”.
Onde estão os itens?
Edições do Diário do Nordeste de 1990 apontam que ainda na década anterior, o Mausoléu passou por uma reforma, e nessa intervenção, esses pertences teriam sido transferidos para o Museu da República, no Rio de Janeiro, a pedido de familiares, segundo os jornais à época.
O Diário do Nordeste também entrou em contato com o Museu da República para saber se esses itens estão abrigados na instituição. Em nota, o Museu informou que os objetos citados não “se encontram no equipamento”. O único objeto que a instituição tem de Castelo Branco, diz a nota, “é um busto de bronze de autoria do Luiz Bartolomeu Paes Leme, que era funcionário do Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro”, doado por Paulo Castelo Branco.
Em que será transformado?
Quando anunciou, em agosto de 2023, que o Mausoléu passará a homenagear abolicionistas, Elmano disse que uma das ideias é levar para o local os restos mortais de Dragão do Mar. Na época, o governador anunciou que a sua vontade era começar a realizar a mudança até o dia 11 de dezembro (de 2023), Dia Internacional dos Direitos Humanos.