Em cuidados paliativos, paciente realiza desejo de ir à praia no CE: 'amo o mar e minha família'

Izabel Loiola foi diagnosticada com leucemia e deve permanecer internada no hospital onde recebe acompanhamento multidisciplinar; ocasião celebra alegria transmitida a todos pela paciente

Na correnteza, do mar e da vida, somos levados por caminhos incertos. Em alguns pontos, fica em questão: qual o sentido? O de Izabel Loiola, de 48 anos, segue no rumo de compartilhar o tempo com a família tendo o mar como cenário.

A paciente, em cuidados paliativos por um tipo de leucemia sem cura, deixou o leito do o Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), do Complexo Hospitalar da UFC/Ebserh (CH-UFC), por algumas horas, para encontrar parentes vindos do interior do Ceará e de outros estados, na Beira-Mar de Fortaleza, na tarde desta terça-feira (8).

Ainda no local onde está internada desde dezembro, Izabel agradeceu à equipe de médicos, enfermeiros, técnicos e psicólogos antes de entrar na ambulância. Cercada do amor que ressalta em suas palavras, destacou a importância da ida ao mar.

Esse é um dos momentos mais felizes da minha vida, porque eu amo o mar, amo minha família e o carinho de pessoas que cuidam de mim e que eu nem pensava que gostavam tanto de mim
Izabel Loiola
Paciente

“As vezes eu estava tão cansada, porque todo dia é igual no hospital e eu dizia ‘quero tanto ir para a praia, me deixem ir’, aí na segunda internação, quando eu terminei a quimio, peguei Covid”, lembra. O pedido, ainda que complexo, não foi esquecido pela equipe.

Como surpresa, o médico Yuri Nassar contou que o desejo constantemente compartilhado na rotina do tratamento se tornaria real. “Dr Yuri disse: ‘Izabel estou achando você muito triste. Tenho uma surpresa: vamos te levar para a praia’”, relata sobre o que ouviu.

"Na minha primeira internação eu vivia falando para o dr. Yuri, que quando eu estivesse curada faria questão de levar ele para a praia. Eu sou dessas, que convido. ‘Dr. Yuri, vou para a praia com a minha tia e eu faço questão que o senhor vá com a sua esposa, porque o senhor precisa conhecer Águas Belas, que é uma das praias mais lindas que eu já conheci", rememora.

A ocasião em Fortaleza marca o reencontro com a beleza do mar e do apoio vindo de Tauá, no Sertão dos Inhamuns, onde Isabel mora com os pais e a irmã e também do Rio Branco, no Acre, de onde vem uma sobrinha.

“Fiquei tão feliz, estou tão feliz, já tinha combinado com a minha família de a gente se encontrar. Convidei minha família inteira”, na soma até o membro mais novo da família está na reunião.

Na água salgada do mar, onde quem entra relata ter a alma lavada, Izabel também demonstra fé. “Como é que eu não estou feliz? Claro que estou. Ia ser um luau, mas transformei num culto e em um batismo”, destaca.

Descoberta da doença

Em exames de rotina, em março de 2021, Izabel descobriu uma anemia leve e começou a fazer tratamento. “Eu sempre fui uma pessoa acima do peso, apesar disso sempre fui saudável, sempre gostei de pedalar. Eu gosto de comer, mas o mais saudável possível”, pondera.

Na sequência, nódulos no pescoço começaram a surgir e causar dor. Os linfonodos também incharam o rosto da paciente e foram confundidos com um quadro de caxumba. Só em setembro, a doença foi analisada com maior precisão ao vir para a Capital com a tia.

“Já não conseguia dormir, porque minha cara estava muito inchada, sentia muita dor. Fui ao HGF (Hospital Geral de Fortaleza), porque se eu não fosse internada, pelo menos algum remédio iriam me dar”, diz. No entanto, foram cerca de 20 dias no hospital.

Com a intensificação da dor e febre persistente, foram necessárias duas biópsias até identificar a leucemia. Izabel foi transferida, então, para o Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC).

“Comecei o tratamento e a primeira quimio que eu fiz não deu certo. A segunda diminiu os blastos, mas a imunidade não subiu e as plaquetas sempre baixas”, compartilha.

Eu sinto um pouco de dor, mas é uma dor suportável, eu sempre agradeço por isso. O mais difícil é ficar longe da família
Izabel Loiola
Paciente

Distância amenizada, porque “minha sobrinha está internada aqui comigo, ela é o meu anjo”, como resume Izabel. “Quando viram que eu estava muito triste, falaram com a minha sobrinha e ela veio, mesmo correndo o risco de pegar Covid. Para você ver como é minha família…”

Os sobrinhos também se uniram para criar campanhas virtuais e em rádios como forma de mobilizar pessoas a doarem sangue e medula óssea. Izabel, que hoje precisa de transfusões, cumpriu por 20 anos o papel de doadora.

“Toda vez que eu pego uma bolsa de hemácias eu falo ‘meu Deus, tudo que eu já doei estou pegando de volta’”, reflete com uma risada de quem não esperava um dia precisar daquilo que sempre esteve disponível em oferecer. “É vida que uma pessoa dá para outra”, resume sobre o ato.

Cuidados paliativos

No Hospital Universitário, Izabel é atendida por equipe de hematologia e de cuidados paliativos, dedicados à quem recebe o diagnóstico de doença que ameaça à vida.

“No caso dela, a doença continua agindo e não há possibilidade de cura pelos recursos atuais da medicina como a quimioterapia ou transplante”, explica a médica geriatra e paliativista Cinara Franco, coordenadora do Serviço de Cuidados Paliativos do HUWC.

Para realizar o desejo da paciente foi necessário avaliar os riscos, preparar uma ambulância e contar com apoio de profissionais da saúde. “A Izabel não tem uma perspectiva de alta, porque mesmo sem quimioterapia ou transplante, ela está usando antibióticos, profilaxias e transfusões e precisa ficar internada”, detalha.

Cinara define a paciente como especial em que as demonstrações de força ensinam a todos na rotina do tratamento. “Foi isso que mais ela pediu para a gente, e as equipes se mobilizaram para realizar o desejo dela. Pode parecer pouco, mas para ela era muito importante”, frisa.

Hoje, o olhar de Izabel se volta para o movimento das ondas e das pessoas com quem compartilha essa memória. “Na vida a gente tem que agradecer todos os dias, quando acorda, quando vai dormir, não precisa pensar em coisas ruins. Mesmo no meio da tribulação, sempre tem o bom. E a gente sempre agradece pelo bom”, conclui.