A história de Fortaleza, mesmo sem o devido zelo, resiste em diversos pontos e até escorre pelas torneiras. Do Riacho Pajeú, onde os primeiros habitantes conseguiram formar moradia, até as estruturas modernas com reservatório de 30 mil metros cúbicos de água embaixo da Praça da Imprensa, no Dionísio Torres, lugares guardam fatos contados em um passeio histórico.
Pela primeira vez, a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) promove a visita guiada “Conhecendo Nossa Cidade” realizada em quatro espaços históricos sobre o abastecimento de água na cidade, com acontecimentos datados há quase 400 anos. A programação gratuita acontece nos dias 17, 24 e 31 de janeiro.
O Diário do Nordeste percorreu à convite da Cagece dois dos quatro espaços por onde a população pode conhecer estruturas e fatos curiosos de como a água sai dos açudes e chega até ao encanamento das residências. Saiba como participar da visita guiada no fim desta reportagem.
- Praça da Imprensa: reservatório subterrâneo e caixa d’água elevada
- Parque Pajeú: Riacho e placa de de mármore da seca de 1877 a 1879
- Avenida Beira-Mar: Obra do Interceptor Oceânico
- Centro de Controle Operacional da Cagece (Vicente Pinzon): estrutura de supervisão
Reservatórios embaixo de praças
"Vocês sabem que debaixo dos seus pés está correndo água tratada?", questiona Valnete Mesquita, geógrafa e educadora ambiental, na Praça da Imprensa. Ela se refere aos 30 mil metros cúbicos do recurso extraído do Açude Gavião, em Pacoti, interligado aos açudes Ererê, Pacajus, Pacoti e Riachão. Esse é o grupo responsável pelo abastecimento de Fortaleza.
"Se nós contássemos só com a água da chuva que o açude Gavião consegue armazenar para o abastecimento de água, em 45 dias o açude secaria", explica Valnete. Além dos demais açudes, há uma conexão com o Castanhão, maior reservatório do Estado, para evitar a falta de água.
Após o tratamento, a água é bombeada até o Morro do Ancuri, 100 metros acima do nível do mar, de onde é distribuída na cidade por meio da gravidade – o que dispensa o uso intenso de energia elétrica. Além da Praça da Imprensa, parte da água vai para a Praça da Bandeira, onde há um reservatório subterrâneo ainda maior, com 40 mil metros cúbicos.
Quem passa pela praça do Dionísio Torres consegue observar a caixa d’água em uma das extremidades que possui uma função importante. “O reservatório tem capacidade 30 vezes maior do que a caixa d'água, que serve para controlar a pressão. A água é monitorada por um centro de controle operacional e há vários pontos de recloração (para manter a boa qualidade) pela cidade”.
As caixas d’água foram construídas pelo governador César Cals (1971-1975) e, nos bastidores da política cearense, conta-se que os reservatórios foram feitos no formato de cálice em associação ao sobrenome do chefe de estado.
“Placa escondida”
Ao avançar para o Parque Pajeú, no Centro de Fortaleza, os participantes encontram uma placa de mármore feita para registrar a seca de 1877 a 1879, que estava no Colégio Militar e foi levada para o local na década de 1980, quando foi feita uma intervenção pública no Riacho. No entanto, a placa ficou esquecida no local e só foi redescoberta na última semana, durante a preparação para o evento.
“Essa é uma placa alusiva a uma tragédia, hoje os sistemas hídricos evitam e isso é conhecer a nossa realidade. A população de Fortaleza está carente da sua própria história”, explica o historiador P.A. Damasceno, colunista do Diário do Nordeste.
Com um período tão longo de seca, a gestão pública passou a avaliar novas formas de abastecer a cidade. O historiador contextualiza que os mais abastados conseguiam manter o próprio abastecimento, mas a população de modo geral “se virava como podia".
Com o crescimento de moradores, o Riacho Pajeú passou a não ser mais suficiente e foram popularizadas as cacimbas e chafarizes.
“O primeiro registro de abastecimento público de água foi feito em 1866, quando tiravam águas dos poços do Benfica e o saneamento básico ainda era feito pelos escravizados que saíam retirando os dejetos e não se tinha uma preocupação de separar as águas”, acrescenta P.A.
Esse movimento de trazer a população para conhecer a história tem interesse público no momento em que a gestão da água é fundamental para o planeta. Se você não entende tudo que se constrói para que a água chegue ali, quantas vidas se gastaram até chegar na torneira.
A iniciativa, portanto, acontece para levar conhecimento à população sobre o contexto histórico e o esforço para levar água tratada. Essa logística abrange a cidade e promove saúde pública, diferente de outros períodos em que a cólera, por exemplo, se disseminava na cidade pela água.
“Recebemos alunos de ensino médio e universitários, algumas visitas foram do Rio Grande do Norte e da Paraíba. Essa é uma visita técnica e guiada e nós montamos os roteiros para, por exemplo, alunos de química que aprendem a teoria em sala e a prática aqui”, conclui Valnete sobre as demais atividades.
Como participar
Para participar é preciso preencher um formulário on-line para cada pessoa com interesse de acompanhar a visita guiada. São 40 vagas por dia com a disponibilidade de um ônibus para transporte do grupo.
- Data: 17, 24 e 31 de janeiro
- Hora: 9 horas
- Saída: Praça da Imprensa, no Dionísio Torres.