Com avanço do mar, cidades do litoral do CE têm até 45% das praias com risco de erosão; veja mapa

Subida do nível da água associada às alterações climáticas aumentam a probabilidade de danos ecológicos, sociais e econômicos

Com os impactos causados pelo avanço do mar, 18 dos 20 municípios costeiros do Ceará têm algum risco de erosão nas praias. Em alguns deles, como Beberibe, até 45% da costa está ameaçada pela dinâmica ambiental, conforme um novo estudo do Programa Cientista-Chefe Erosão Costeira, da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) em parceria com a Secretaria da Infraestrutura (Seinfra).

O relatório “Mapas Integrados de Risco e Evolução Costeira”, ao qual o Diário do Nordeste teve acesso, foi submetido à Funcap no início deste mês e tem como objetivo subsidiar projetos e discussões da Seinfra quando for necessário intervir no litoral, além de “orientar e disciplinar a utilização dos recursos naturais da Zona Costeira do Estado do Ceará”.

De acordo com Fábio Perdigão, pós-doutor em Geografia, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e membro da equipe técnica do Programa, todos os pontos de erosão no litoral cearense já foram levantados na primeira etapa. A segunda deve ser de escuta das populações diretamente afetadas.

“Vamos conversar com as comunidades locais, empresários, donos de barracas, moradores e pescadores para entender qual é a melhor solução para aquele lugar. A partir do que eles quiserem, vamos fazer os projetos adequados a esses problemas”, ressalta.

O planejamento para Icapuí - cidade do Litoral Leste com 29% da costa comprometida - está incluído nessa programação, garante o cientista. Neste mês, a Prefeitura da cidade anunciou a construção de um espigão para conter a erosão na Praia da Peroba.

Conforme o levantamento do Programa, os municípios com maior percentual de erosão consolidada ficam no Litoral Leste, sendo puxados por Beberibe (45%), Cascavel (34%) e Aracati (30%).

Apenas duas cidades aparecem sem nenhum tipo de erosão, até o momento: Cruz e Paraipaba, ambas no Litoral Oeste. Jijoca de Jericoacoara, conhecida mundialmente pelo turismo, tem apenas 3% de risco - mesmo percentual da capital, Fortaleza.

47%
da linha de costa do Ceará está sob processo erosivo, segundo panorama do Ministério do Meio Ambiente (MMA). No Nordeste, fica atrás apenas do Rio Grande do Norte (60%) e é seguido por Piauí (45%), Pernambuco (32%) e Sergipe (28%). 

Ponto de lazer

Conforme o relatório, à medida que os oceanos respondem ao aquecimento global, as águas do mar aquecem e expandem-se, e assim o nível do mar aumenta. Cada 1 grau de aumento na temperatura superficial do mar representa uma expansão de 20 cm no nível das águas.

A reportagem tentou contato com a Prefeitura de Beberibe, para entender como a gestão municipal lida com o problema, se já são percebidos impactos no turismo, na economia ou em serviços públicos, e se há planos de contenção já vigentes ou em estudo, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.

Para o professor Fábio Perdigão, a gestão integrada da zona costeira entre comunidade e poder público é essencial para a preservação desses espaços. “A praia é um dos poucos pontos de lazer da população gratuitos. Você toma banho, joga futebol, se diverte. A proteção desse patrimônio é importantíssima”, completa.

Além da Uece, integram o Programa Cientista-Chefe Erosão Costeira membros da Universidade Federal do Ceará (UFC),  do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) e da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab).

Plano de contingência

Também a nível estadual, o Programa Cientista-Chefe da Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima (Sema) trabalha na elaboração de um Plano de Contingência de Erosão Costeira. Segundo Davis de Paula, membro da equipe, o produto deve ser entregue até o fim de 2024 para nortear os agentes responsáveis em atenuar, trabalhar e estudar os problemas costeiros. 

“Municípios e Governo precisam trabalhar juntos em parceria, e a partir daí ordenar essa hierarquia de trabalho. Esses planos vão indicar estudos que devem ser realizados para atenuar o problema da erosão sem precisar de uma intervenção muito rígida, ou já partir para uma ação mais proeminente”, afirma o pesquisador.

Segundo o também doutor em Ciências do Mar, sociedade e poder público precisam entender “que eventos extremos estão cada vez mais presentes e intensos, associados às mudanças climáticas e também às ações humanas”. “Nossos trechos costeiros estão sendo ocupados de forma indevida: a ânsia de morar de frente para o mar traz seus riscos, como o nível do mar subir e a partir daí você ter marés cada vez maiores sobre o continente”.

Não apenas o Ceará ou o Brasil estão sujeitos à alteração dessas dinâmicas, mas as praias arenosas de países como Portugal, Espanha e Angola também vêm sendo fortemente erodidas. O desafio é alinhar essa contenção a “intervenções verdes”, ou seja, que reduzam os impactos ambientais.

Para auxiliar as discussões, o Ceará dispõe, desde 2022, da Plataforma Estadual de Dados Espaciais Ambientais (Pedea). O software oferece a visualização em mapas de informações  já estruturadas por órgãos ambientais e de fiscalização do Ceará, permitindo a identificação de ecossistemas, fauna, flora e comunidades na Zona Costeira para conhecimento e perspectivas de ocupação ou investimento econômico.