Uma cobertura vegetal de 1900 anos de idade. Parte dos 3% de mata nativa que ainda sobrevive em Fortaleza remete a este tempo, antes da fundação da capital cearense, e está compreendida na área do Parque do Cocó. Um ecossistema muito antigo e repleto de “paleodunas” - dunas integradas à floresta; e à fauna de insetos e outros animais raros para o olhar do fortalezense urbano.
Nesta quarta (17), em celebração ao Dia do Protetor das Florestas, um grupo de cerca de 20 empreendedores e ativistas ambientais promoveu uma trilha em prol da conscientização de preservação do espaço. A área é alvo de especulação imobiliária e conta com a ação da sociedade civil e do terceiro setor, para mobilizar as autoridades competentes em torno da gestão do local.
Segundo o biólogo Gabriel Aguiar, membro do Conselho Gestor do Parque do Cocó, a área corresponde ao último “campo de dunas parabólicas” da capital cearense. São 15 hectares raros. “Fortaleza já perdeu 83% dos seus campos de dunas. E de área verde nós já perdemos 97,1% de cobertura vegetal original. Essa perda aconteceu em poucas décadas: em 1970, a gente ainda tinha 68% dessa cobertura. Hoje temos 2,9% e diminuindo rapidamente”, alerta o ambientalista.
O percurso, com a entrada pela Avenida Padre Antônio Tomás (próxima ao cruzamento com a Rua Professor Otávio Lobo, no Papicu), exige a orientação de um guia autorizado da área. A trilha é repleta de mata fechada, com a presença de espécies como a formiga Dinoponera (cuja ferroada tem a força de três mordidas de uma abelha, conforme destaca Gabriel Aguiar), e variações no clima.
Com a mata mais fechada, o clima abafa durante a trilha e a característica do solo também muda. Em alguns trechos, é preciso fazer silêncio absoluto, por conta da sensibilidade dos animais habituados ao ambiente.
Para a advogada Beatriz Azevedo, presidente da ONG Instituto Verde Luz, a questão jurídica de preservação da área passa pela validação do espaço como uma unidade de conservação ambiental.
“Em 2017, a unidade foi revogada por uma lei de uso e ocupação do solo. É uma lei municipal de ordenamento geral da cidade, que regula até a largura de calçadas. Não tem a ver com unidade de conservação ambiental, que é regulada por legislação federal. Junto ao Ministério Público, conseguimos barrar isso. Mas, para além desse movimento, é preciso que a sociedade civil se mobilize pra floresta continuar de pé”, orienta Beatriz.
Amplitude
Para a jornalista e empreendedora sustentável Clara Dourado, a visita ao espaço não se restringe às questões específicas da área verde. "A gente tem um cenário de devastação ambiental no Brasil como um todo, no Nordeste e em Fortaleza também. E o Parque do Cocó e a Sabiaguaba correspondem a 70% das áreas preservadas que a gente ainda tem. São áreas muito relevantes”, destaca ela.
Clara percebe que o conhecimento da floresta leva cada cidadão a repensar seus hábitos de consumo e assumir seu papel individual na cadeia da sustentabilidade.
“Esse movimento é importante para entender de fato, em profundidade, porque precisa haver demarcações, licenças ambientais. Dessa consciência até a atitude de não jogar lixo nessas áreas, usar ecobags”, exemplifica.
Ela situa como o movimento ambiental atua em diversas frentes. Portanto, o momento envolve a unificação desses atores, a fim de alimentar a consciência da população em geral. “Temos as mudanças de hábito tanto de dentro pra fora, como de fora pra dentro. O movimento às vezes é solitário. Tem a galera lutando pra tirar o plástico dos oceanos, outros pela preservação do Cocó. Unificar é importante pra gente poder interseccionar e melhorar”, reflete.