Manassés de Sousa, o músico autodidata de Maranguape que ganhou o mundo e segue inquieto aos 70 anos

Violonista realiza show comemorativo neste domingo (1º) no Cineteatro São Luiz; na carreira, quase 200 canções e muita história para contar

Manassés de Sousa tinha três anos de idade quando pegou pela primeira vez num violão. Aos quatro, já tocava. O instrumento era do irmão mais velho, Messias, e atraía primeiro por satisfazer aos caprichos do caçula; depois, pelas possibilidades que ofertava. “Meu pai era agricultor e, mesmo com muita dificuldade, comprou esse violão”, recorda.

Apesar do ciúme de Messias e da necessidade de autorização do genitor para lidar com o instrumento, o pequeno Manassés não se fez de rogado. Tocou direitinho “Terezinha de Jesus” – aquela velha cantiga de roda –, recebeu aprovação do pai e nunca mais parou. Ali transformava a vivência em Maranguape, cidade-natal, em algo digno de ganhar o mundo.

Essa e tantas outras histórias serão contadas pelo próprio garoto-prodígio em “Nas Cordas do Tempo - Manassés de Sousa, 70 anos”. O show acontecerá neste domingo (1º), às 18h, no Cineteatro São Luiz. O clima, claro, será de festa. A ideia é que o repertório transite entre as principais composições do multi-instrumentista e reúna também convidados especiais.

É o caso de Rodger Rogério, Téti, Humberto Pinho, Adelson Viana, Edmar Gonçalves, dentre outros. Cada um escreveu um capítulo bonito na história de Manassés – cuja carreira-solo, segundo ele mesmo, começou efetivamente há 10 anos. Antes, apesar de lançar projetos, estava diretamente ligado a uma parceria fixa, o que eclipsou alguns movimentos.

“Sempre gravei meus discos, sempre compus. Mas não tinha liberdade para focar no meu trabalho como faço agora. Pra você ter uma ideia, de 10 anos pra cá eu fiz mais shows do que os 30 anos que passei tocando em parceria fixa. Chegar aos 70 dessa forma me diz que essa é uma idade perfeita”, calcula, depois de iniciar o novo ciclo no último 26 de julho.

De fato, o homem segue inquieto. Além de ocupar palcos Brasil afora, continua compondo, fazendo trilhas sonoras para cinema e TV, produzindo iniciativas próprias e de terceiros, além de todo um arsenal criativo que apenas cresce dia após dia. É reflexo de trajetória autodidata. E, em consequência, sem amarras. 

Entre o Ceará e o planeta

A entrega profissional se reflete em números. Ao todo, são 16 discos gravados e quase 200 canções – muitas gravadas por cantoras e cantores cearenses, parceiros de longa data. Fora outros intérpretes brasileiros, a exemplo de Chico Buarque, Gal Costa, Luiz Gonzaga, Belchior e Nara Leão, com quem o maranguapense trabalhou de pertinho. 

Apesar do alcance, Manassés não se considera compositor de Música Brasileira. A canção dele vai mais longe: bebe da fonte do mundo. Saiu do Ceará e atravessou São Paulo, França, boa parte da Europa e da África do Norte. Conheceu gente, expandiu conhecimentos, ouviu sons. Na volta – e ele sempre volta – pôs tudo em relevo no próprio fazer.

Para alguém que ganhou o primeiro violão de uma loja ao lado do Cineteatro São Luiz, em plena Praça do Ferreira, exibir uma estrada assim dá orgulho. “Fui agraciado porque nasci numa família pobre e Deus me deu o dom da música. Tanto que as composições que eu faço são coisas que vêm na minha cabeça, do nada. É coisa de Deus mesmo”, reflete.

Diria que minha música é universal. Não é querendo me gabar, não, mas é uma coisa de vivência musical. A minha foi muito grande, muito rica também, de ouvir, visitar países e tirar proveito da boa música de cada um”. Embora diante de um legado tão extenso, consegue eleger três canções que mais marcaram a carreira.

São “Morena Penha”, uma das mais conhecidas do instrumentista, feita em parceria com Petrúcio Maia; “Palavra de Amor”, com Fausto Nilo; e “Flor do Algodão”. Nelas, o esforço sempre presente de entregar o melhor ao público e permitir que a criatividade flua em espirais sonoras. Foi assim desde o começo.

Aos 10 anos, Manassés passou a tocar em rádios, participar de programas de auditório e, com o tempo, integrou bandas como “Só de Garotos” e “Dissonantes”, ambas de Maranguape. Entre um passo e outro, gostava de ouvir Piazzolla e de se sentir mais próximo daquele universo capaz de desenhar um futuro possível.

A guinada aconteceu com “Chão Sagrado”, show ocorrido em 1974 no qual ele dividiu o tablado com Rodger Rogério e Téti. “Foi o pontapé pra mim. Ali passei de músico de baile – algo que era muito legal, porque ensinava bastante a tocar todo tipo de instrumento – e passei a conviver com esses grandes artistas munido de um violão de 12 cordas”.

Cinquenta anos depois, a trupe se reúne novamente no palco – dessa vez para celebrar a nova década de Manassés e o fato de ele atrair tanta gente ao redor da música, do bom papo e da liberdade. O artista prepara, inclusive, homenagem a Chico Pio, um dos ícones do movimento Massafeira Livre. “Cantaremos uma música chamada ‘Estradas’ para lembrá-lo”.

Livro e mais

Passado o show, a próxima estação inclui outras viagens ao Ceará até o fim do ano em diferentes eventos, e também o desenvolvimento de um livro. Neste, Manassés passeia pela própria estrada a fim de recordar grandes momentos, diferentes composições e causos de bastidores sempre imperdíveis de saber.

Os detalhes ele conta por telefone diretamente da casa onde reside, em Goiás. A propriedade integra o vilarejo Olhos D’Água, descrito pelo músico como um “verdadeiro paraíso”, a 100 quilômetros de Brasília e com 1500 habitantes. Foi para onde ele se mudou há alguns anos e é onde diariamente se refaz na vida e na música.

“Montei um estúdio aqui em casa. Meu grande problema era ter que sair pra trabalhar em Brasília. Então, com esse estúdio, passei a me conectar com o Brasil inteiro aqui”, diz, destacando que o projeto tem dado sustentação financeira e possibilidade de amplas conexões com outros nomes da música.

Enfatiza também outro desejo ao mencionar que não pensava em chegar aos 50, aos 60 e nem aos 70. Agora com os dois pés na idade – e, por que não, no mundo, como todo bom filho maranguapense – brada em alto e bom tom: “Meu sonho é acordar no dia seguinte com saúde. Isso é suficiente”.

 

Serviço
Show “Nas Cordas do Tempo - Manassés de Sousa, 70 anos”
Neste domingo (1º), às 18h, no Cineteatro São Luiz (Rua Major Facundo, 500, Centro). Ingressos: R$ 60 (inteira)/ R$ 30 (meia). Vendas disponíveis neste link. Mais informações pelas redes sociais do Cineteatro