Notícia triste para amantes dos livros. Em comunicado no último domingo (3), a Livraria Cultura anunciou o encerramento temporário das atividades em Fortaleza, após ter fechado as portas da unidade no dia 30 de setembro.
A decisão foi publicada nas redes sociais da empresa, que destacou a esperança de retornar em breve para a Capital. "Somos muito gratos aos dedicados colaboradores da loja de Fortaleza e aos clientes que sempre demonstraram muito carinho", expressa o texto.
Ex-diretora da Associação Nacional de Livrarias (ANL) e importante nome da militância livreira no Ceará, Mileide Flores observa que a situação enfrentada pelo empreendimento nos últimos anos agravou a permanência dele na cidade, bem como em outros locais do País.
Uma das maiores redes de livraria do Brasil, a Cultura entrou em processo de recuperação judicial em 2018, com dívidas na ordem de R$285 mi. Junto a ela, outra gigante do varejo, a Saraiva – igualmente com filial em Fortaleza – também passa pela mesma situação.
Ambas já fecharam 54 lojas (38% do total) desde 2017 e demitiram 2.451 funcionários (47,8%). Mesmo com essas medidas, continuam a operar no vermelho. “Qualquer notícia de fechamento de livrarias me entristece. Isso empobrece a cidade culturalmente dentro do viés cidade-leitura. Deixa de existir a consciência cidadã se você não entende o que está vendo, o que está se passando. Para mim, isso é muito doído”, dimensiona Mileide Flores.
Trâmites do setor
Estudiosa da área, ela defende o investimento na criação de redes de livrarias locais – em detrimento das grandes lojas nacionais de comércio do livro – e a presença de livreiros nesses estabelecimentos. Por outro lado, situa que a extinção do Ministério da Cultura e, consequentemente, de políticas públicas de apoio ao livro tornam todo o panorama insustentável para muitos negócios no segmento.
“Eu não acredito que todo o nosso problema iniciou porque surgiu o livro virtual. Já há um problema desde as nossas origens, a começar pela própria definição de livraria. Hoje, percebo que ela é muito mais uma prestadora de serviços”, observa, ao mesmo tempo que traz à superfície outra importante pauta da área na contemporaneidade: a reforma tributária que prevê a taxação de livros no Brasil.
A proposta do Executivo prevê tributo com alíquota de 12%. O Governo Federal alega que a cobrança afetaria os mais ricos e que recursos poderiam ser direcionados para políticas públicas voltadas aos mais pobres. “Não é possível um país desenvolvido se não existe uma população leitora. Os erros são muitos. A gente paga muito caro pela nossa ignorância”, defende Mileide.
Valendo-se do recente acontecimento envolvendo a Livraria Cultura e no posto de proprietária de um empreendimento do ramo que fechou as portas em 2016 – a Feira do Livro – a pesquisadora nos auxiliou a montar uma lista de outras lojas da área que também encerraram as atividades na Capital. Confira algumas:
Livraria Lua Nova
Localizada na Avenida 13 de Maio, no bairro Benfica, a Livraria Lua Nova fechou as portas em meados de 2016. A loja era conhecida pelo grandioso acervo, sobretudo na área de Ciências Humanas, além do aconchegante espaço ofertado ao público. Em 2015, na ocasião do aniversário de 15 anos de existência, uma campanha de arrecadação tentou estender, sem sucesso, a permanência das atividades do empreendimento.
Siciliano
Fundada em 1928 na cidade de São Paulo, a rede de livrarias Siciliano deixou de operar em Fortaleza por volta de 2009, após a compra do negócio pela Saraiva em âmbito nacional. Com unidade no Shopping Iguatemi, a empresa comercializava, além de livros, materiais escolares para as diferentes modulações de ensino, do Infantil ao Superior, com vasta papelaria. Também vendia discos, DVDs e outros artigos do gênero.
Livraria Livro Técnico
Fundada em 1961 e possuindo diferentes endereços na cidade, a Livraria Livro Técnico abrigou a última morada no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC). No espaço da loja, ocorreu o lançamento de importantes obras, a exemplo de “A Praça do Ferreira - República do Ceará Moleque”, do cronista, poeta e historiador Juarez Leitão, a qual empreende um resgate dos fatos pitorescos e históricos do logradouro em questão.
Feira do Livro
De propriedade da livreira Mileide Flores, a Feira do Livro fechou as portas em 2016 após seis décadas de dedicação ao segmento editorial em Fortaleza. Nascido como uma banca de revistas, na primeira fase da vida o estabelecimento recebeu personalidades da grandeza de Jorge Amado (1912-2001) e Jean-Paul Sartre (1905-1980). Com o crescimento, expandiu para o interior do Ceará e também para o Rio Grande do Norte. Após reestruturações, em 2002 a loja passou a funcionar no quintal da família fundadora.
Uma das unidades da Saraiva
Uma das unidades da livraria Saraiva encerrou as atividades no shopping Iguatemi Fortaleza em agosto de 2011. Localizada no piso térreo, a loja tinha porte menor que o da Saraiva MegaStore, ainda em funcionamento na entrada principal do shopping. O estabelecimento operava no espaço desde 1998, quando se chamava Siciliano, e era mais especializada em livros técnicos e de não-ficção.