Manter a saúde mental em meio à turbulência provocada pela pandemia da Covid-19 é um desafio para todos, especialmente para as grávidas. Além dos questionamentos comuns relacionados à saúde no período gestacional, agora as futuras mamães convivem com novas dúvidas e angústias específicas deste momento.
Entre os medos que as gestantes sofrem mediante o distanciamento social, o coordenador do serviço Psicomater - da Maternidade Escola Assis Chateaubriand, Igor Emanuel, destaca os mais frequentes: “Como serão minhas consultas de pré-natal?”; “Minha obstetra parou de atender nesse período, e agora?”; “Como ocorrerá meu parto no meio desta pandemia?”; “E se meu bebê pegar o coronavírus ao nascer?”.
Segundo Igor Emanuel, psiquiatra da Universidade Federal do Ceará (UFC), este é um pequeno fragmento da complexa realidade psíquica das gestantes no momento. Um estudo canadense, realizado em meio à pandemia, evidenciou que 37% das gestantes apresentaram sintomas clinicamente significativos de depressão, representando mais do que o dobro da taxa registrada antes da pandemia do novo coronavírus.
Já em termos de ansiedade, característica muito comum em gestantes, 57% das futuras mamães apresentaram níveis considerados, quase quatro vezes acima da taxa usual.
Exposto este cenário, é imperativo que as gestantes saibam identificar os sinais de alerta para depressão, discriminando-a de uma “simples tristeza”, sentimento este absolutamente esperado em um período tão delicado. Entretanto, há alguns indicativos de que o sentimento de tristeza pode estar evoluindo efetivamente para uma depressão.
A perda de prazer por várias atividades, por exemplo, incluindo aquelas ligadas à maternidade, bem como organizar o enxoval do bebê, pode ser uma evidência. Pensamentos negativos recorrentes, tais como culpa (arrependimento por ter engravidado), autocrítica excessiva, inclusive quanto à autoimagem, dadas as modificações corporais próprias da gestação, também podem fazer mal às futuras mamães.
Outro alerta é a persistente falta de energia, que comumente pode ser confundida com o próprio estado gestacional, pois é esperado que as mulheres se sintam mais facilmente fatigadas. De forma diversa, a apatia que a depressão promove é mais intensa, muitas vezes impactando até em atividades de autocuidado, a exemplo da higiene básica.
Escala
Conforme Igor Emanuel, que também é psiquiatra Membro da Comissão de Estudos e Pesquisa da Saúde Mental da Mulher da Associação Brasileira de Psiquiatria, existe um instrumento denominado de Escala de Depressão Pós-parto de Edimburgo, o qual avalia cientificamente o risco de padecer de depressão. Apesar de conter ‘pós-parto’ no nome, a escala foi validada na gravidez e pode ser autopreenchida pela gestante.
“A escala é composta de 10 itens contendo sintomas comuns na gestação, cada um deles com quatro respostas possíveis. Dependendo do escore total, pode indicar um risco maior de estar sofrendo de depressão, mas apenas uma avaliação profissional especializada pode determinar efetivamente este diagnóstico”, esclarece o médico.
Identificada a patologia, o tratamento deverá promover o bem-estar materno e a saúde do bebê em formação. O profissional alerta que a depressão não tratada, sobretudo quando grave, pode culminar em desfechos obstétricos negativos. Prematuridade e baixo peso ao nascer, por exemplo, são alguns dos riscos revelados na literatura científica. Nestes casos, a busca por ajuda psiquiátrica ou psicólogo é essencial para fomentar a saúde materno-fetal.
Nos casos mais leves, Igor Emanuel indica a terapia psicológica como o tratamento de primeira linha, especialmente a terapia cognitivo-comportamental (TCC) e a terapia interpessoal (TIP). As situações com maior gravidade podem necessitar de tratamento medicamentoso.
“Quando a terapia farmacológica é indicada de forma precisa, mostra-se indubitável ajuda à mulher em sofrimento, sendo os benefícios do tratamento notadamente superiores aos eventuais riscos que, porventura, possam existir em razão da exposição fetal”, conclui o psiquiatra.
Conhecido o referido ‘semblante’ da depressão durante o período gestacional, o especialista aconselha a gestante a adotar condutas para que as intensas vivências emocionais de adaptação à quarentena não evoluam para um quadro psiquiátrico mais impactante.
Para as que se encontram em estado de sofrimento, no qual não conseguem lidar, o médico e diretor clínico da I Psi Clinic, enumera algumas recomendações (veja o quadro ao lado) baseadas em evidências científicas, as quais podem amenizar consideravelmente os sentimentos negativos e tornar esse momento um mais leve e prazeroso.
Corpo e mente
ADAPTAÇÃO
Adapte-se ao mundo online. Hoje 70% da população brasileira tem acesso à internet, de tal forma que, escolher o enxoval do bebê, consultas de pré-natal, exercícios físicos e encontros sociais virtuais, podem ser adaptados à realidade da quarentena.
MOVIMENTO
Exercícios físicos funcionam como prevenção da depressão e até em tratamentos de casos mais leves. É recomendado às grávidas cerca de 20 a 30 minutos de exercícios aeróbicos, hidroginástica, pilates ou yoga por dia.
DIETA
Pesquisas indicam que certos estilos de alimentação, a exemplo da dieta mediterrânea e norueguesa, são importantes fatores de proteção no desenvolvimento da depressão.
EQUILÍBRIO
Meditação de atenção plena, também conhecida como mindfulness, é uma modalidade de autocuidado com pesquisas que já evidenciam a eficácia na prevenção e tratamento de depressão e ansiedade.
EMOÇÕES
Peça ajuda à sua rede de apoio por meio da comunicação efetiva. É comum que mulheres durante a gravidez sofram em silêncio suas dores emocionais, pois é socialmente desejado que as gestantes estejam plenamente felizes durante este período.
MÚSICA
Evidências científicas demonstram que ouvir música libera dopamina no cérebro, considerada uma das principais substâncias responsáveis pela experiência de prazer. Vale ressaltar ainda eficácia da musicoterapia no tratamento da depressão em um curto prazo.
Fonte: Igor Emanuel - Psiquiatra