Atriz pioneira no teatro lança livro de memórias em que resgata o Ceará de outros tempos

Glice Sales Alcântara passeia entre Aquiraz e Fortaleza resgatando pessoas, paisagens e acontecimentos culturais marcantes. Evento acontece neste sábado (22), na Casa de Juvenal Galeno

Voltar no tempo para vivenciar o Ceará antigo será mais fácil a partir deste sábado (22). É quando acontece o lançamento de “Passagem para Mussambê”, novo livro da atriz, poeta, comunicadora e escritora Glice Sales Alcântara. O evento acontece na Casa de Juvenal Galeno e promete transportar o público para paisagens tão íntimas quanto coletivas.

Nas páginas, a artista – uma das pioneiras do teatro cearense, sobretudo por protagonizar radionovelas e interagir com alguns dos maiores nomes das Artes Cênicas, a exemplo de João Ramos, Carla Peixoto e Nadir Papi Saboya – nos leva para a localidade do título. Mussambê, na verdade, era um rio de Aquiraz, Região Metropolitana de Fortaleza.

Nele, Glice se banhou, estreitou amizade com outras crianças e degustou um dos melhores pedaços da vida. “Esse rio deve estar extinto hoje em dia, mas foi o rio da infância dela”, conta o filho, o ator Domingos de Alcântara. Segundo ele, apesar de a mãe ter nascido em Fortaleza, foi no município dos antepassados onde ela passou os primeiros anos.

A experiência se tornou motivo suficiente para que a própria mergulhasse com vigor nessas memórias e agora as narrasse em livro. “Passagem para Mussambê”, não à toa, lança mão de um relato em primeira pessoa para descortinar aspectos não apenas relacionados à infância de Glice, mas reminiscências referentes à cena cultural cearense.

A atriz foi esposa de José Domingos Alcântara – falecido, também referência do rádio cearense – e participou de comerciais, montou peças para adultos e crianças e integrou a geração que implementou a televisão no Ceará. Emiliano Queiroz, Aderbal Freire Filho e Haroldo Serra foram contemporâneos dela e, juntos, realizaram grandes projetos.

“Ela fundou o teatro de comédia no Ceará, sempre envolvida com alguns dos nomes mais importantes da cena. Uma turma que fez teatro experimental e que começou a atuar sobretudo nos anos 1950 e 1960”. A boa surpresa é que, para além de ocupar o tablado, Glice gosta muito de escrever e nunca deixou de se dedicar à literatura.

Foi assim que graduou-se em Letras pela Universidade Estadual do Ceará; tornou-se professora de Língua Portuguesa e Artes Dramáticas em vários colégios de Fortaleza; e alçou-se a membro titular de algumas academias literárias – entre elas a Ala Feminina da Casa de Juvenal Galeno e a Academia de Ciências, Letras e Artes de Columinjuba.

“Também é declamadora e sempre escreveu poesia, embora tenha sido retardatária em publicar um livro solo. O primeiro, ‘O Porto dos Olhos’, veio há 10 anos. Agora chega este novo para festejar esse tempo todo de memória – da infância e da vida dela no geral”, celebra Domingos, residente no Rio de Janeiro, mas com presença confirmada no lançamento.

Aniversário entre letras

A ocasião do lançamento da obra também servirá para apagar as 90 velinhas de Glice, em pleno estado de graça. No posfácio do livro, ela mesma escreve: “Perdi a contagem do tempo. Sou antiga. Sou da idade do tempo. Coleciono, com a mais grandiosa profundidade, os dias da minha infância nessa Fortaleza amada, quando muito chovia”.

No mesmo texto, destaca a paixão pela arte, sobretudo quando realizada em palavras. “Nasci com o lápis atrás da orelha. Muito me comove o livro e a escrita. Estudei com o inesquecível e amado mestre, Clodomir Girão, a quem devo o despertar do amor à Língua Portuguesa e à Arte Literária, no Instituto Rui Barbosa, fundado por ele”.

Para Domingos de Alcântara, essa capacidade da mãe de falar sobre si remontando a inúmeros fatos, pessoas e acontecimentos é um dos maiores trunfos da obra, publicada pela editora paulista Matrix. “Tenho a impressão de que o maior valor desse livro está na certeza de que, quando narramos sobre nós mesmos, nos tornamos universais”, dimensiona.

“Isso traz uma nova dimensão a essas memórias, que são sobre esse espaço de Aquiraz, vivido entre os anos 1930 e 1940 – quando a cidade que ainda tinha uma importância estratégica para o Ceará – e registros que nos remontam à nossa própria ancestralidade. Ela faz com que a gente se perceba, se identifique. Trata-se de memória-base, que é coletiva”.

Com poemas espalhados em meio à prosa, prefácio da escritora Francilda Costa, texto de orelha do poeta Arthur Eduardo Benevides e homenagem a Cândida Maria Santiago Galeno – mais conhecida como Nenzinha Galeno, neta de Juvenal –, “Passagem para Mussambê” tem todos os ingredientes para ingressarmos em um verdadeiro portal. Um mais bonito e delicado.

Faz parte do expediente de Glice, captado pela belíssima foto de Celso Oliveira na capa do livro, com as dunas do Ceará: “Amo as estrelas, as danças, as libélulas, as buganvílias e os flamboyants de Maranguape. Gosto do azul e de sapatos vermelhos”.


Serviço
Lançamento do livro “Passagem para Mussambê”, de Glice Sales Alcântara
Neste sábado (22), a partir das 16h, na Casa de Juvenal Galeno (Rua General Sampaio, 1128 - Centro). Editora Matrix, 216 páginas, R$35. Contato: (85) 3252-3561