Usuários do TikTok que atuam como trolls (praticantes de "trotes" online) e promovem cyberbullying têm uma nova razão para se preocupar. Isso por causa de um movimento surgido na rede social, chamado "O Grande Londini", As informações são da BBC.
Combinando o nome de Houdini, o mágico ilusionista, e o sistema operacional Linux, O Grande Londini se concentrou no TikTok sob uma máscara que virou símbolo do movimento. Nele, um homem mascarado de capuz preto fala diretamente para a câmera com uma voz distorcida de modo eletrônico.
A voz, que segue a linha de um filme de terror, não tem objetivo de assustar, a não ser que o usuário pratique uma das ações a serem evitadas pelo grupo. "Estamos tirando a rede social das mãos dos intimidadores, pedófilos, golpistas e trolls".
Em um dos vídeos, o indivíduo aponta para um comentário abusivo deixado no perfil de uma usuária da plataforma e questiona: "Se um estranho fizesse este comentário para sua filha, mãe, irmã, esposa, o que você faria?"
A resposta é singela: "Dizemos 'se você participa de jogos estúpidos, seus prêmios serão estúpidos'", afirmam em alusão a um ditado sobre escolhas e consequências, bordão do movimento. O "jogo" ao qual se refere é a trollagem on-line; o "prêmio", a perseguição pelo Grande Londini.
Atuação do movimento
Embora os trolls possam se esconder em perfis anônimos, o Grande Londini desafia os praticantes das ações problemáticas, pontuando não haver segurança nessa escolha — segundo o grupo, a verdadeira identidade do usuário pode ser descoberta rapidamente, com sete ou oito cliques.
Caso a pessoa seja uma criança, ele diz tentar contar aos pais ou à escola que o usuário está abusando de pessoas na rede social. Se for um adulto, a situação muda: o movimento predispõe uma denúncia, a ser feita ou para o empregador do usuário, ou à Polícia local.
Apesar de realizar uma moderação de vigilância, em que os próprios usuários da plataforma se encarregam de "limpar" o aplicativo, o TikTok não enxerga a ação com bons olhos. O Grande Londini já teve nove contas excluídas de forma permanente, e a décima foi suspensa várias vezes.
O movimento foi acusado de violar regras da plataforma, desde bullying e assédio on-line até mesmo violência extremista. Londini, porém, contesta as acusações.
"Até que todos os agressores, racistas e golpistas saiam deste aplicativo, não vamos a lugar nenhum", assevera o "representante do grupo" em vídeo.
Quem é o indivíduo
Apesar de tirar a máscara em lives no TikTok de vez em quando, a identidade de Leo, o homem envolvido no movimento, é desconhecida. O nome verdadeiro é um segredo bem guardado, dado que ele recebe ameaças de morte regularmente.
Leo é, na verdade, a face pública de um movimento de voluntários com experiência militar em segurança cibernética e hacking ético. Nas transmissões, ele se dispõe tanto a conversar com fãs quanto com difamadores dispostos a debater.
À BBC, Leo, sem revelar o local nos Estados Unidos de onde conversava, definiu o movimento como "antitroll". "Se você está aí, agora no TikTok, está sendo trollado", destacou, pontuando que a moderação de conteúdo não está sendo feita pela plataforma.
"Eles não estão fazendo [a moderação]", alega. "Contamos tudo ao TikTok. Enviamos ao TikTok todas as informações e denunciamos a conta".
A plataforma, por sua vez, diz fazer grandes esforços pela proteção dos usuários, além de introduzir novos recursos. Entre eles, estão a possibilidade de escolha sobre quem pode comentar em seus vídeos e filtrar certas palavras nos comentários.
"Sabemos que não há uma linha de chegada quando se trata de proteger nossos usuários, e é por isso que continuaremos investindo em nossas equipes, produtos e recursos para garantir que o TikTok seja um espaço seguro para nossa comunidade", destacou um porta-voz da rede social, que enfrenta uma tarefa gigante na moderação de conteúdo.
Conforme os próprios números do TikTok, 61 milhões de vídeos foram derrubados pela plataforma apenas no primeiro trimestre de 2021. Desse total, 91% foram retirados do ar antes de receberem denúncias de usuários.
Início do movimento
A atuação de Londini contra os praticantes de cyberbullying nasceu de uma tragédia ocorrida em 2020: o filho de um dos amigos de Leo cometeu suicídio aos 14 anos.
Após o luto, o pai do adolescente entrou em contato com o movimento e contou que parte da depressão do garoto foi causada pelo assédio nas redes sociais.
A pedido do pai, Leo e vários amigos rastrearam os responsáveis, até então anônimos, pelas tormentas do filho.
"Nós fomos capazes de dar as informações ao nosso amigo e dizer: 'faça o que você precisa fazer com isso'. E ele entrou em contato com os pais deles e conseguiu, em grande parte, um fechamento", ressaltou. O grupo, contudo, não parou por aí.
Empenho de fãs
Fãs do movimento são tão empenhados que marcam a conta em vídeos e comentários o tempo inteiro, com o intuito de que o troll seja perseguido pela equipe.
Alguns apoiadores, porém, são tão engajados que acabam se tornando intimidadores, violando não somente as regras do Grande Londini, mas, também, as Diretrizes da Comunidade do TikTok. O risco é de que o movimento possa se tornar, em algumas ocasiões, aquilo que despreza.
Usuária fez críticas a grupo
Uma usuária do TikTok identificada como Liz foi alvo de abusos na web após receber críticas do Grande Londini por vídeos sobre o Memorial Day, um feriado estadunidense.
Segundo Liz, ativista pela paz, a data na qual o país presta homenagem a homens e mulheres mortos em serviço militar é um "feriado inteiro dedicado apenas ao assassinato".
A resposta ao comentário da ativista foi furiosa: uma avalanche de usuários — vários deles nomeados com Londini — disseram que ela se matasse. Os usuários chegaram a contatar o ex-empregador dela para que a mulher fosse demitida do emprego.
"Parece hipócrita que eles sejam uma conta antibullying, mas muitos de seus seguidores estão intimidando as pessoas na plataforma", lamentou ela.
Leo, que serviu como fuzileiro naval dos EUA, manifestou pesar em relação ao ocorrido com a ativista. "Entendo a paixão deles, especialmente quando se trata de veteranos", afirmou ele sobre o movimento, que expulsa usuários de sua rede caso as regras do grupo sejam infringidas.
"Tentamos dar o exemplo. Não a atormentamos — desejo a essa mulher tudo de bom", finalizou.
Cyberbullying no Brasil
No Brasil, um caso de cyberbullying teve grande repercussão recentemente. A prática provocou a morte de Lucas Santos, filho da cantora Walkyria Santos. O adolescente, de 16 anos, foi encontrado sem vida após sofrer comentários homofóbicos no TikTok.
O caso motivou a criação de um Projeto de Lei (PL) na Câmara dos Deputados, denominado Lucas Santos. O PL busca prever a criminalização da prática de "haters" na web, com pena de multa e reclusão de um a quatro anos.