A Defensoria Pública do Ceará (DPCE), por meio do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC), realizou pela primeira vez, nesta sexta-feira (26), a retificação de nome e gênero no registro civil de uma pessoa menor de idade.
Por conta de uma ação registrada pela DPCE ainda na semana passada, os documentos de Lara Mendes Magalhães Torres, de 16 anos, podem, em breve, carregar os dados em acordo com sua identidade de toda uma vida, no feminino.
A identidade de gênero como direito humano é reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) desde março de 2018. Por isso, pode ser obtido apenas através de uma autodeclaração, não sendo mais necessário apresentar tratamento hormonal, laudos médicos ou comprovantes de cirurgias. Basta ir diretamente ao cartório de registro para realizar essa modificação.
A supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da DPCE, Mariana Lobo, explica que o reconhecimento a identidade de gênero é um direito que advém da Constituição Federal e dos pactos internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.
Mais de 300 ações
Antes da decisão do STF, os pedidos eram solucionados por decisão de um juiz. Entre 2017 e 2021, até agora, o NDHAC deu entrada em 339 ações judiciais de retificação de nome e gênero no registro de nascimento de pessoas transexuais.
Ainda segundo a defensora Mariana Lobo, o procedimento de Lara poderia ser feito de forma administrativa diretamente no cartório após sua maioridade.
O fato de sua família ter procurado a Defensoria antes, no entanto, poupará mais de um ano de constrangimento da jovem, além de ser "importante para que outros adolescentes possam ter a Lara como referencial e encontrar na Defensoria esse porto seguro”, comenta a defensora.
Transfobia na escola
Mesmo com apoio da família, a caminhada de Lara até o reconhecimento não foi fácil. A jovem relembra os atos de transfobia sofridos na escola em que estudava desde os dois anos, por parte de alunos, pais e até mesmo de professores, funcionários, coordenadores e diretores.
No fim do ano letivo de 2017, a instituição chegou a negar sua matrícula para o ano seguinte, alegando que a família procurasse uma escola em condições de “atender às necessidades” da adolescente. O caso foi denunciado à Delegacia de Combate a Exploração da Criança e Adolescente (Dececa) como transfobia. Após o incidente, a escola pediu desculpas à família.
O caso ganhou repercussão na imprensa, e a mãe de Lara, a jornalista Mara Beatriz Mendes Magalhães, hoje é uma das vozes ativas da Associação Mães pela Diversidade no Ceará. Para ela, a retificação de gênero da filha é agora uma realidade que se traduz em esperança de um mundo com mais amor e respeito.