A francesa Gisèle Pélicot, 71, dopada pelo marido por 10 anos para ser estuprada por dezenas de homens na França, falou pela primeira vez sobre tudo que viveu, nesta quinta-feira (5), durante julgamento do caso. A história que horrorizou o país foi revelada quando Dominique Pélicot, 71, foi preso em 2020, filmando por baixo das saias de clientes de um shopping. Na época, policiais encontraram imagens da esposa sendo violentada no computador de Dominique.
Agora, o homem, que já confessou ser culpado de todas as acusações, além de 50 homens, com idades entre 26 e 74 anos, respondem pelos crimes em julgamento que deve durar até dezembro. Dezoito deles estão em prisão preventiva.
Nos computadores, HDs e pen drives usados por Dominique, foram encontrados quase 4 mil fotos e vídeos da vítima, visivelmente inconsciente, enquanto era estuprada por dezenas de estranhos.
Gisèle e Dominique ficaram casados por 50 anos. Apesar de os crimes terem acontecido desde 2011, a vítima só descobriu que estava sendo drogada para ser violentada em 2020
"Meu mundo está desabando, tudo está desabando, tudo que construí durante 50 anos", disse Gisèle, no tribunal criminal de Avignon, no sul de França, nessa quinta-feira (5). "Estou inerte, na minha cama, e estão me estuprando. São cenas bárbaras", relatou aos cinco magistrados sobre os estupros organizados pelo pai dos filhos dela.
Durante audiência no tribunal, que chegou ao quinto dia nesta sexta (6), a vítima se recusou a ver as filmagens encontradas pelos investigadores dos cerca de 200 estupros sofridos, primeiro na região de Paris e depois em Mazan, no sul de França, até 2020. "Eu me pergunto como aguentei", disse ela, que acrescentou que foi "sacrificada no altar do vício".
Violência sexual e ISTs
Conforme relato da vítima, na maioria dos atos de violência, os homens não usavam preservativo. "Por um extraordinário golpe de sorte (...), se livrou do HIV, sífilis e hepatite", declarou a especialista médica Anne Martinat Sainte-Beuve, acrescentando que a mulher contraiu quatro infecções sexualmente transmissíveis.
Alguns acusados alegam que não sabiam que o marido administrava comprimidos para a mulher dormir e que pensavam que se tratava de um casal libertino, o que a vítima negou no início do depoimento. "Nunca pratiquei (…) troca de parceiros. Gostaria de deixar claro", disse a mulher, que reafirmou pouco depois, ao ser questionada pelo presidente do tribunal, Roger Arata: "Nunca fui cúmplice [nem] fingi que estava dormindo".
Dos homens que a estupraram, ela só reconhece um, que foi à casa do casal para falar sobre ciclismo com o marido. "Às vezes eu o encontrava na padaria e o cumprimentava. Não passava pela minha cabeça que ele me estuprou", explicou.
Julgamento segue até dezembro
O julgamento deve durar até 20 de dezembro. Na próxima semana está marcado o primeiro interrogatório do marido da vítima, com quem ela está em processo de divórcio. Os réus podem pegar até 20 anos de prisão.
"Será explicado, será justificado, se houver justificativa, porque é imperdoável", declarou à AFP a advogada Béatrice Zavarro, indicando que o cliente dela, que acompanhou de cabeça baixa o depoimento da sua mulher, "desmaiou" durante o intervalo.