Cometas são corpos celestes cujo brilho acende a curiosidade. Entre eles, um em especial é conhecido do grande público, o cometa Halley. No entanto, nem todo mundo tem a sorte de observá-lo: ele aparece a cada 75 ou 76 anos, em média, o que motiva a espera de muitos aficionados.
Para o professor Romário Fernandes, do Colégio dos Bombeiros, o Halley se destaca entre os outros cometas principalmente pelo percurso histórico de estudos em torno dele, o que se refletiu no nome do astro.
O cometa tem esse nome em homenagem ao astrônomo Edmond Halley, o primeiro a constatar a periodicidade da aparição desses objetos, percebendo isso com o referido corpo celeste.
"O astrônomo estimou que o Halley era o mesmo que já havia passado pelo menos três vezes antes, em séculos anteriores, em passagens que haviam sido catalogadas, devidamente registradas, mas não associadas como o mesmo cometa voltando", salienta.
Conforme o professor Ednardo Rodrigues, da Seara da Ciência da Universidade Federal do Ceará (UFC), o cometa está entre um dos objetos astronômicos mais fascinantes já vistos, caracterizado por uma longa cauda de poeira e gás. Esse é um dos principais motivos que o diferencia de asteroides, mas não o único.
Diferenças entre cometas e asteroides
De acordo com Romário Fernandes, asteroides e cometas são objetos eminentemente rochosos que orbitam em torno do Sol. Os dois tipos de objetos se formaram por agregação de partículas menores desde o início do Sistema Solar, em um processo "bem aleatório".
"As partículas vão se aglutinando de forma bem desordenada, o que origina objetos de formatos completamente irregulares, como é o caso da maioria dos cometas e dos asteroides também", destaca o professor.
Tal ocorrência, ainda segundo Fernandes, é muito comum com objetos sem tamanho suficiente para ser um planeta, que vão de dezenas a poucas centenas de quilômetros (km) de diâmetro. Assim, as formas chegam a ser bem variáveis e irregulares.
Os asteroides, porém, são feitos basicamente de rocha e metal, este em proporção menor, enquanto os cometas possuem maior porção de água — na forma de gelo, na maior parte do tempo —, além de componentes voláteis e orgânicos.
Além disso, a órbita de cometas é distinta: os asteroides têm trajetórias mais circulares em torno do Sol, sem grande variação de distância em relação à estrela. O professor ressalta que, apesar disso, existem asteroides que não orbitam diretamente o Sol, ficando apenas em torno dele com distância relativamente homogênea.
Já os cometas têm uma órbita extremamente alongada. "Eles têm órbita chamada de altamente excêntrica, porque não mantêm uma distância homogênea em relação ao Sol durante sua trajetória", explica o professor. "Isso faz com que eles estejam ora muito mais distante, ora muito mais perto do Sol do que qualquer asteroide".
Características do Halley
Segundo Romário Fernandes, o Halley tem dimensões de 15 km por 8 km, com diâmetro médio de 11 km. A forma dele, porém, é bem alongada: "ele tem uma forma meio irregular, que mais parece um paralelepípedo do que uma esfera", assinala.
Em relação à órbita, o cometa tem trajetória extremamente excêntrica, elíptica e aguda, a mesma peculiaridade dos outros corpos celestes da categoria. "Eles vêm, muito frequentemente, de muito mais longe do Sol do que o planeta Plutão e mergulham muito mais perto do que o planeta Mercúrio está do Sol", pontua, frisando que nem sempre eles passam perto da Terra no percurso.
"A Terra pode estar do outro lado e ele pode não passar exatamente do lado do planeta, mas ele vai cruzar a órbita dele, porque o caminho orbital da Terra está entre o Sol e as regiões mais distantes de onde eles vêm", continua Fernandes.
No trajeto de aproximação da Terra, o cometa passa por processos físicos devido à temperatura do Sistema Solar, que varia conforme à distância do Sol. Quando próximo à estrela, o gelo existente no cometa passa por uma sublimação — vai do estado sólido diretamente para o gasoso —, desprendendo partículas de poeira e rocha.
"O material, solto do cometa, acaba refletindo a luz do Sol, que é o que gera a cauda do objeto e o torna visível da Terra, diferentemente do asteroide".
Apesar de ser conhecido pelo brilho, a Nasa, a agência espacial norte-americana, classifica o cometa como um dos objetos menos refletidores no Sistema Solar. Conforme a instituição, o Halley só reflete 3% da luz que incide sobre ele.
Visualização a olho nu
O astro, ainda segundo o professor Romário Fernandes, pode ser visível a olho nu na Terra durante suas aproximações. Quando próximo do planeta, o cometa se apresenta como uma estrela.
"Dependendo do quão brilhante ele for, vai parecer uma estrela com aquela cauda, só que você o vê parado no céu", diz, complementando que ele mudará de posição junto às estrelas, que vão de leste a oeste no céu noturno.
Apesar de o cometa ter velocidade de milhares de quilômetros por hora (km/h), o movimento do objeto é imperceptível em solo terrestre, dado que a distância entre o planeta e o corpo brilhante é de milhões de km. "A gente não percebe o cometa mudar de posição ao longo dos minutos ou das horas. [...] Agora, de um dia pro outro, você percebe que ele mudou de posição", diz o professor.
Ednardo Rodrigues enfatiza que, embora ainda siga em órbita ao redor do Sol nesse período, quem deseja observar o cometa Halley neste momento não vai conseguir: o corpo celeste está além do último planeta do sistema solar, Netuno, a 36 unidades astronômicas.
Para se ter uma ideia, uma unidade dessa medida, segundo o docente da Seara da Ciência, equivale à distância média da Terra ao Sol, cerca de 150 milhões de km.
"Não é possível vê-lo nem com o maior telescópio do mundo em construção no Chile, o Extremely Large Telescope (ELT), com 39 metros (m) de diâmetro", pontua Rodrigues, acrescentando que seria necessário um telescópio de 611 m para vê-lo.
Como se a distância não bastasse, há outro aspecto a ser considerado na observação do Halley: no momento, ele não tem a mesma aparência pela qual ficou conhecido pelos seres humanos.
"Quando o Halley está longe do Sol, ele fica inativo, ou seja, sem cauda", acrescenta o professor da UFC, em consonância com o outro docente. "Nos resta apenas esperar o ano de 2061 para ele se aproximar do Sol e formar sua cauda nos presenteando com um desfile espetacular no céu".
Passagens próximas à Terra
A última passagem do cometa, de acordo com Ednardo Rodrigues, se deu a partir do fim de 1985, ano em que o professor veio à luz. Ele nasceu em dezembro, quando o cometa começou a ser visto a olho nu na Terra. O objeto atingiu o periélio — o ponto mais próximo do Sol — em 9 de fevereiro de 1986.
Essa aparição, conforme o docente do Colégio dos Bombeiros, foi considerada menos impactante se comparada à penúltima, 76 anos antes — àquela época, a aproximação foi percebida pela população de outra forma.
Isso porque, em 1910, o mundo ainda não era tão iluminado com as luzes artificiais como é hoje, e os céus eram mais negros. Devido à menor claridade, o cometa se destacou e chamou atenção de muitas pessoas, assinala Fernandes.
"Em 1910, a passagem dele foi espetacular. Passou muito mais perto da Terra do que os outros cometas normalmente passam e acabou sendo visualmente muito impactante", afirma, pontuando que o estado do mundo, em si, contribuiu para a diferença de percepção.
Ednardo Rodrigues sinaliza que, embora a visualização do cometa tenha sido menor na última passagem, as melhores imagens em cores já registradas do Halley até hoje foram as captadas na ocasião.
Menor visualização
Os dois professores ressaltam um aspecto: o Halley ficará mais difícil de ser visto com o passar dos anos. Ednardo Rodrigues reforça que outros cometas geralmente não retornam porque se desintegram nas aproximações do Sol. Esse não é o caso do Halley, que, contudo, não está imune ao fato.
"Ele resistiu a diversas voltas pelo sistema em torno do astro-rei. Mas a cada periélio, o Halley perde massa", explica, situando que a Terra atravessa o rastro de poeira deixado pelo cometa duas vezes: nos meses de outubro a novembro, o que causa a chuva de meteoros Orionidas, e em maio, quando ocorre a Eta Aquáridas.
O Halley, ao se dirigir para as regiões mais afastadas do Sol, não recupera totalmente o gelo perdido, segundo Romário Fernandes. Assim, ele perde mais gelo ao se aproximar da estrela do que o repõe ao se afastar.
"Isso faz com que eles tenham menos material para volatilizar, para sublimar, e originar os detritos que vão refletir a luz do Sol causando o espetáculo visual", aponta. "Foi perfeitamente visível a olho nu em 1910, mas já foi muito mais difícil de ver em 1986, por essas questões".
Como será o Halley da próxima vez
O professor do Colégio dos Bombeiros afirma que o brilho exato do cometa na próxima vez em que se aproximar da Terra é imprevisível. "A gente sabe como o cometa se comportou visualmente da última vez em que passou, mas isso não é nenhuma garantia de como ele vai se comportar visualmente na próxima passagem".
Mesmo com a possibilidade de Halley se mostrar menor que da última vez, Ednardo Rodrigues se mantém esperançoso quanto ao retorno do objeto espacial, cujo periélio é previsto em 28 de julho de 2061: "Pelo menos não pretendo perder esse evento".