O procurador de Justiça Militar Antônio Cerqueira, suspeito de ter agredido uma entregadora de aplicativo em um condomínio no Meireles, em Fortaleza, no último 24 de março, foi afastado cautelarmente de suas atividades por 120 dias. A decisão do corregedor nacional do Ministério Público, Ângelo Fabiano Farias, foi referendada por unanimidade nesta terça-feira (30), em plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). A defesa do investigado nega que ele tenha praticado qualquer crime.
Pela decisão, Cerqueira também fica proibido de acessar a sede da Procuradoria Regional Militar no Ceará e de manter contato com servidores do órgão e com testemunhas do fato em apuração.
A concessão de liminar pelo afastamento do procurador, segundo Farias, tem base no "fundado receio de dano de difícil reparação e grave repercussão ao Ministério Público, cuja credibilidade no seio social, sobretudo na localidade em que se deram os fatos, pode restar gravemente comprometida ante a manutenção do membro às suas funções".
O corregedor nacional considerou também o "uso indevido", por parte de Cerqueira, "da estrutura e dos serviços da Procuradoria Regional Militar para a prática de diligências pessoais, não condizentes com as atribuições do órgão, e que têm o potencial de manipulação das provas do ocorrido, em especial por serem produzidas unilateralmente, à revelia da ciência e participação dos órgãos oficiais responsáveis pela apuração".
Defesa nega crime
Em vídeo enviado ao Diário do Nordeste, o advogado de defesa de Cerqueira, Daniel Maia, alega que o procurador é "absolutamente inocente" das "levianas acusações que vem sofrendo e que estão repercutindo nas redes sociais". "Não temos dúvida nenhuma de que ele será absolvido, tanto no âmbito administrativo como no âmbito criminal, não tendo cometido nenhum crime contra essa moça, entregadora de aplicativo, nem contra qualquer outro cidadão", afirmou.
Cerqueira é investigado administrativamente na Corregedoria-Geral do Ministério Público — o processo corre sob segredo de Justiça — e criminalmente na Polícia Civil. O caso foi registrado pela vítima no 2º Distrito Policial da Capital, como crime de injúria.
Na cópia do Boletim de Ocorrência, acessada pela reportagem, a entregadora relatou ter sofrido agressões físicas e verbais por parte do procurador de Justiça Militar, que também teria agredido outro entregador que estava na portaria do condomínio no momento do crime.
O investigado, no entanto, desde o início, nega as acusações de agressão, mas confirma que se desentendeu com a trabalhadora.
Lembre o caso
No Boletim de Ocorrência, a vítima relatou que, durante uma entrega, no dia 24 de março, o cartão de crédito de uma cliente não funcionou — nem por aproximação, nem inserindo. A tentativa teria sido feita tanto na maquineta da mulher como na de outro entregador que chegou depois ao condomínio, com um pedido para a mesma pessoa.
"Eu busquei o pedido, fui até a residência [de entrega], informei para quem era, a cliente desceu, era a filha dele [Cerqueira]. Ela desceu com o cartão, passou na minha máquina, aí, em seguida, chegou outro entregador. Ela passou [o cartão] por aproximação, deu erro, eu disse: 'Seu cartão deu erro, deu recusado, tenta inserir, pode ser que seu cartão esteja bloqueado para aproximação'. Aí ela inseriu. E, quando inseriu, deu falha de novo. E como outro entregador chegou, eu disse: 'Passa seu cartão na máquina dele, para ver se é o seu cartão ou a minha máquina'. Ela passou na máquina do outro entregador, mas também deu erro. Aí ela ligou para o pai dela", lembrou a entregadora, em entrevista concedida ao Diário do Nordeste no dia 28 daquele mês. O nome dela será preservado.
Pelo interfone do prédio, ainda segundo a vítima, o pai da cliente, Cerqueira, perguntou os valores das compras. Ela disse o dela e o outro entregador disse o dele. "Só que eu informei à moça [filha do denunciado] que eu não receberia em dinheiro, o meu só dava para receber em cartão, pelo modo do pagamento. Aí ela subiu e disse: 'Vou pegar outro cartão'. Quando desceu, já desceu com o pai. E o pai já veio com raiva", continuou.
Nesse momento, a entregadora teria perguntado ao homem se o pagamento seria feito no cartão de crédito ou de débito. "Ele informou: 'Débito'. Mas já foi dizendo: 'Essa máquina é que não presta'. E eu falei: 'Senhor, não é a máquina, seu cartão foi recusado na minha e na desse rapaz [o outro entregador]'. E ele: 'Sua máquina não presta'. E eu: 'Senhor, se for gritar, eu vou voltar para o estabelecimento com o seu pedido'. E quando falei isso para ele, pronto, foi que se revoltou mais ainda", seguiu o relato.
Com gritos de "vá embora!", o procurador, então, teria puxado a entregadora pelo braço e tentado expulsá-la da portaria do condomínio com a mão conduzindo-a pela nuca. A entregadora teria ameaçado filmar a situação, e Cerqueira teria tentado tomar o celular dela. O outro entregador teria tentado interferir, mas o cliente teria feito o mesmo com ele para, também, expulsá-lo do local.
"Eu fiquei segurando o corrimão e gritei pela Polícia. Quando a Polícia veio, ele não quis saber de ninguém, disse que, se a Polícia entrasse, ia falar com não sei quem, ia mandar prender eles. E subiu [de volta para o apartamento]. E a Polícia informou que não poderia fazer nada", concluiu a vítima.
Parte da ocorrência foi filmada. Nas imagens, é possível ver Cerqueira expulsando os dois trabalhadores do prédio, enquanto a entregadora que registrou o B.O chama pela Polícia, o porteiro tenta conter o morador e a filha pede ao pai para ele relaxar. Assista: