Morte de mulher no Carlito Pamplona: versões se contradizem, e faltam respostas da Segurança Pública

Ninguém foi preso, apesar de três homens encapuzados terem sido levados à delegacia pela Polícia Militar do Ceará. A Polícia Civil investiga o caso

A morte da vendedora Mayane Lima, de 28 anos, em uma desocupação de um terreno no bairro Carlito Pamplona, em Fortaleza, na última terça-feira (10), segue sem respostas, passadas 48 horas. Ninguém foi preso, apesar de três homens encapuzados terem sido levados à delegacia pela Polícia Militar do Ceará (PMCE).

O Diário do Nordeste questionou à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) por que os homens encapuzados foram liberados pela Polícia Civil do Ceará (PCCE) depois de prestarem esclarecimentos; e o que eles disseram na delegacia.

Entretanto, a Secretaria respondeu apenas que, "durante as investigações, três pessoas já foram identificadas e ouvidas. A PCCE segue apurando a participação dessas pessoas nos crimes. Mais detalhes serão repassados em momento oportuno para não comprometer os trabalhos policiais em andamento".

O governador Elmano de Freitas já havia publicado, no início da tarde da terça (10), que "três suspeitos de envolvimento no caso já foram identificados", mas na ocasião disse que "dois deles (foram) conduzidos à delegacia para prestar depoimento". "Determinei ao nosso secretário da Segurança Pública rigorosa apuração deste lamentável episódio", enfatizou o chefe do executivo.

As autoridades ainda não esclareceram quem matou Mayane, por que tiros foram efetuados e quem são os homens encapuzados que invadiram o terreno na madrugada de terça-feira (10). Sem respostas, familiares e amigos velaram o corpo da jovem, nesta quarta (11). Entre eles, a filha de apenas 4 anos e o companheiro da vítima.

A sogra da vendedora, Cristina Gomes, pediu por justiça, em entrevista concedida na última terça (10). "A gente quer justiça. Alguém tem que pagar por isso! Eles estavam fazendo isso (ocupação de um terreno), mas não eram errados. Esperamos que (os autores dos disparos) sejam identificados e responsabilizados por essa ação. Pois desestruturaram uma família. A filhinha dela tinha apenas 4 anos, não tem nem noção do que aconteceu", lamentou.

A SSPDS informou que a investigação do caso "está a cargo da 4º Delegacia do Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP), unidade especializada da PCCE que realiza diligências para elucidar o fato".

Desocupação testemunhada por PMs?

A empresa Fiotex confirmou que é proprietária do terreno que foi o motivo do conflito, no bairro Carlito Pamplona, na última terça-feira (10). Em nota, a empresa afirmou que, naquela madrugada, "adotou as medidas para cessar a demarcação ilegal. Não havia moradores no terreno. A ação foi testemunhada por policiais militares e ocorreu de forma pacífica por quase duas horas".

Porém, líderes comunitários e outros moradores da ocupação Deus é Amor, além da Defensoria Pública do Ceará, afirmaram à reportagem que cerca de 500 famílias moravam no terreno de 33 mil metros quadrados, há cerca de 15 dias, e a maioria dormia lá, em barracos, naquela madrugada, quando mais de 20 homens armados chegaram ao local e exigiram, com um trator, que as pessoas se retirassem da propriedade.

A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social e a Polícia Militar do Ceará não confirmaram a presença de policiais militares na ação de desocupação do terreno. Nenhuma ordem judicial foi apresentada à comunidade. A SSPDS afirmou, em nota, que a desocupação "teria sido iniciada por seguranças contratados pela empresa privada".

Já a PMCE ponderou, "quanto à possibilidade da presença de viaturas e/ou policiais militares no local, anteriormente ao acionamento da Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops), na manhã desta terça-feira (10), os fatos serão averiguados por meio do procedimento pertinente".

Na nota, a Fiotex informou que, na última sexta-feira (6), "foi oficiada pela Polícia Militar que seu terreno no bairro Carlito Pamplona estava sendo alvo de demarcação irregular". "De imediato, ainda no mesmo dia, registrou um boletim de ocorrência no 34º Distrito Policial", acrescentou.

A Polícia Militar confirmou, também em nota, que, "por meio do comando do policiamento local responsável pela área da ocorrência, o bairro Carlito Pamplona - Área Integrada de Segurança 8 (AIS 8) de Fortaleza, e sob a perspectiva das ações preventivas de segurança pública, oficiou a empresa proprietária do terreno que o mesmo estaria sendo alvo de demarcações irregulares, bem como orientou como a empresa proceder em caso de solicitação de medidas judiciais, portanto, legais".

Reação com ataques criminosos

A desocupação e a morte de Mayane Lima gerou protestos e ataques criminosos, na região do Carlito Pamplona, na manhã da última terça-feira (10). Dois ônibus foram apedrejados, e passageiros ficaram feridos. Houve uma tentativa de incêndio a um terceiro veículo. Manifestantes também colocaram fogo em "barricadas", no meio de vias. Os protestos foram controlados pela Polícia Militar por volta de 10h10 daquele dia.

A SSPDS destacou que "o 1º Distrito Policial (DP) também apura ocorrências registradas nessa terça-feira (10), no bairro Carlito Pamplona (AIS 4). Conforme as primeiras informações, pessoas invadiram um terreno privado na região. Durante a desocupação que teria sido iniciada por seguranças contratados pela empresa privada, outros indivíduos colocaram fogo em entulhos e vegetação em vias do bairro. Os focos de incêndio foram controlados por equipes do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará (CBMCE). Dois ônibus também foram danificados".

A Fiotex afirmou que a equipe que realizou a desocupação do terreno "foi surpreendida por agressores vindos de fora do terreno, arremessando pedras, ateando fogo e realizando disparos contra todos que se encontravam no local e seus arredores. O trator utilizado na ação foi destruído e incendiado, e dois colaboradores ficaram feridos e levados para um hospital particular".

Na nota, a empresa garantiu que "não compactua com atos de violência" e que "está à disposição dos órgãos de segurança para colaborar com as investigações e se solidariza com a família da vendedora Mayane Lima e com todas as outras vítimas". A Fiotex acrescentou que é proprietária do terreno há mais de 20 anos, com registro em cartório.