Ainda ao longe, eles conseguem notar a aproximação de humanos. Olhares atentos que rapidamente se escondem na vegetação densa. Apesar do comportamento arredio, natural das espécies, cervídeos e antílopes conseguem viver com qualidade de vida quando bem tratados. Mamíferos exóticos, eles precisam de espaço aberto, dieta específica e água em abundância. É desta forma que vivem 104 animais selvagens na Fazenda Haras Claro, em Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza, numa área de 10 hectares.
Embora as espécies - antílopes e cervídeos - sejam nativas da África do Sul e Índia, os animais que habitam a Fazenda Haras Claro nasceram no Brasil. Os bichos foram comprados em criadouros comerciais registrados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no Maranhão e em Goiás. Por terem vindo de climas áridos, não tiveram problemas de adaptação no Ceará, mas os cuidados com alimentação recebem atenção redobrada.
"São todos animais pastadores e têm uma dieta vegetariana diversificada. Nós usamos ração de equinos balanceada devido aos níveis de proteínas que esses herbívoros precisam, por isso que não é a bovina", descreve o médico veterinário Leandro Rodrigues. Ainda segundo o profissional, o ambiente onde eles vivem precisa ser aberto, ter zonas de fuga e vegetação coberta para que eles se sintam seguros e consigam se refugiar.
A propriedade em que os animais habitam, em Caucaia, tem pasto natural (arbustos e capim) entremeado com pés de juazeiro que servem de sombra e os frutos viram comida quando caem. Ao fundo do recinto, há também um açude usado habitualmente por algumas espécies para o banho.
A única dificuldade, porém, é sentida na hora da avaliação clínica. Como os animais são arredios e não toleram a presença de pessoas, já que as consideram como potenciais predadores, os cuidadores precisam utilizar instrumentos de observação: binóculos e câmeras com zoom. Quando eles precisam de soro ou medicação, o veterinário utiliza um rifle que dispara dardos anestésicos. "Nessa hora, eu aproveito para fazer exame de sangue e ultrassom", pontua o veterinário.
Resgate
Na contramão do comportamento arisco dos animais, laços afetivos entre bicho e veterinário foram criados. Há três anos, "Miúda" perdeu a mãe vítima de tétano causado por uma bactéria que a contaminou possivelmente na hora do parto. O cervídeo tinha apenas vinte dias de vida. Totalmente dependente da mãe, ela tinha alto risco de não resistir à ausência da genitora. O veterinário da fazenda Haras Claro e a bióloga Suzete Bastos decidiram insistir nos cuidados e tiveram êxito.
"Os dois primeiros dias foram críticos. Achamos que ela ia morrer, porque toda vez que entrávamos para dar leite, ela se jogava, pulava na parede, berrava, se feria inteira e até machucava a gente. Com pouca idade, ela já tinha 40kg e era um animal de muita força".
No terceiro dia, porém, tudo mudou. "O tratador entrou no recinto e ela, voluntariamente, se aproximou e começou a mamar. A partir daí, a gente conseguiu alisar e fez amizade. Foi um caso de sucesso", detalha o médico veterinário. Carinhosamente batizada por "Miúda", a cervídeo já foi introduzida ao bando e reproduziu.
Variação
Dos 104 animais na propriedade, 70 são cervos ou veados, como são popularmente conhecidos, divididos em quatro espécies: Russa, com 42 bichos, Dama (12), Axis (11) e Nobre (5). Eles possuem grandes orelhas, rabos pequenos, pernas longas e finas, além de pelagem marrom e lisa, com áreas brancas no peito e na garganta. Já os antílopes somam 34.
A espécie Waterbuck (11) é aquática e a pele é oleosa adaptada para água. Enquanto os machos da espécie Capri (16) são preto com branco e têm chifres que podem medir até um metro de comprimento em forma de espiral, as fêmeas são revestidas de pelos bege e branco. O Eland (7) é considerado o maior animal africano nas regiões desérticas e pesa até 900kg, quase uma tonelada.
"Nos cervídeos, só os machos têm chifres, que crescem o ano inteiro para que possam lutar e competir pelas fêmeas. Quando passa a época da reprodução, a galhada suntuosa cai e começa a crescer, porque eles têm células que sintetizam a matriz do chifre. Algumas espécies de antílopes não têm chifre. A galhada não cai e é formada por um prolongamento do osso do crânio", acrescenta Leandro Rodrigues, diferenciando as características principais das duas espécies da propriedade.