Pouco antes das 10h de terça-feira (14), os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE-CE), reunidos no edifício sede da Corte, localizado na região central de Fortaleza, já tinham um parecer sobre quem sucederá o atual presidente do órgão de controle estadual a partir de janeiro de 2024. De maneira unânime, graças a 7 votos depositados de forma breve e secreta em uma urna, foi eleito para o posto o conselheiro Rholden Botelho de Queiroz.
Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC), doutor e mestre em Direito Constitucional pela mesma instituição, o escolhido para tal investidura integra o colegiado desde junho de 2012, quando se tornou o primeiro Procurador de Contas a ocupar a vaga destinada constitucionalmente a integrantes do Ministério Público de Contas (MPC).
Ele exerceu desde a instalação do Ministério Público Especial, em 2007, a função de procurador-geral. Reassumiu esta atribuição em 2011 e em 2014 se tornou corregedor do Tribunal de Contas. Já esteve na vice-presidência, auxiliando o então presidente Edilberto Pontes.
Agora eleito para o posto máximo do TCE-CE, Queiroz também será o responsável por inaugurar outro marco, o de ser empossado após os trabalhos do Comitê de Transição de Gestão da Presidência, instituído pelo atual dirigente em setembro deste ano.
Em seu discurso de agradecimento, ele ressaltou sua trajetória e a estima pela instituição que irá gerir pelos próximos dois anos. "Eu já estou aqui há 16 anos nesse Tribunal. Já assumi várias funções desde procurador, contas, procurador-geral, corregedor, vice-presidente. Só posso dizer, presidente, que do fundo do meu coração quero muito bem a esse Tribunal", disse.
No tempo que dedicou ao rito pós-eleição, ele também lembrou de uma frase do Papa Pio XI, a quem disse se inspirar e que elencou a política como "a mais alta forma de caridade". "Tenho certeza que não estarei só, conto com todos e estarei aberto para ouvir e tentar acertar", prometeu ao se dirigir aos presentes.
Mais jovem entre os demais conselheiros do Tribunal, o presidente eleito deu entrevista ao Diário do Nordeste e disse saber dos desafios que estão postos para ele no cumprimento do seu mandato. Entretanto, ponderou que bandeiras como a sustentabilidade e o impacto social deverão ser frentes de trabalho durante sua atuação. "O que a gente precisa agora é dar a nossa visão. Pretendo ter como enfoque questões mais impactantes para a sociedade", pontuou.
Além de Rholden Queiroz, farão parte do quadro de dirigentes do biênio 2024-2025 os conselheiros Valdomiro Távora (vice-presidente), Edilberto Pontes (corregedor) e Patrícia Saboya (ouvidora).
Confira a entrevista completa:
Diário do Nordeste: Logo após o resultado o senhor comentou que teria um cuidado maior com a sustentabilidade durante o seu mandato na presidência. Queria lhe pedir que destrinchasse o que já vem planejando como parte das suas ações nesse campo.
Rholden Queiroz: Acho que a gente tem que estar antenado com o que ocorre no planeta. E temos visto ondas de calor no Brasil inteiro, queimadas, enchentes. Mas apesar desse aspecto ambiental ser importante, não queria tratar da sustentabilidade apenas por esse viés. Já temos auditorias do Tribunal tratando, por exemplo, da desertificação no Estado do Ceará, fiscalizando as políticas públicas de combate a esse fenômeno. Esse é um tema.
Mas a sustentabilidade envolve vários outros aspectos, que vão desde o combate à pobreza, desigualdade, até a equidade de gênero. Tudo isso envolve políticas públicas que o Tribunal pode fiscalizar e o objetivo da fiscalização é aprimorar elas, fazendo com que cheguem ao seu destino da forma correta, sem desvios e de forma adequada, eficaz e eficiente. Temos aí ações no que toca a educação, o cuidado com a primeira infância, tem a questão dos lixões que precisa ser aperfeiçoada. São esses pontos que a gente quer enfatizar, e vários outros que iremos delimitar melhor neste mês que iremos tomar pé da situação e planejar nosso mandato.
DN: Em seu discurso de agradecimento pela votação unânime foi destacada a sua trajetória de 16 anos na Corte e seu perfil é de um conselheiro jovem, o mais novo entre seus pares. Numa análise mais subjetiva, ao que deve sua escolha pelos colegas?
Rholden: Essa é uma pergunta boa de se fazer para eles. Mas suspeito que eles devem ver minha dedicação. Entrei como procurador do Ministério Público de Contas, tive a honra de ser o procurador-geral, foi um período muito interessante, com dificuldades, mas elas fortalecem e fazem com que a gente tenha até mais vínculo com o Tribunal. Depois consegui tomar posse como conselheiro, assumi corregedoria e vice-presidência. Acredito que tudo isso vai solidificando um "querer bem" pelo Tribunal, por todo esse potencial do que ele pode trazer para a sociedade, e nos empolga. Talvez os conselheiros vejam essa minha empolgação e pensem que eu possa fazer um bom mandato. Penso que tenha sido por isso. Foi uma eleição unânime e fiquei muito feliz.
DN: Como o senhor, que vai gerir o Tribunal pelos próximos dois anos, visualiza o potencial do TCE em orientar os entes para poderem ter boas práticas no quesito da sustentabilidade?
Rholden: Acho importante que o Tribunal dê o exemplo. Ele tem que ser uma referência de sustentabilidade. O [conselheiro] substituto Itacir [Todero] preside o comitê de sustentabilidade e tem feito um grande trabalho nesse período, durante a gestão do conselheiro Valdomiro. O TCE tem sido reconhecido fora do Ceará como um órgão de excelência nessa área. No uso da água e da energia solar... temos várias iniciativas nesse sentido. Pensamos em fortalecer o exemplo e irradiar para os municípios pelas práticas.
Uma delas é o selo, que até já existe um para práticas sustentáveis. Queremos aprofundar isso. E a gente pode também ver o que se coloca em termos de análise das contas de governo, incluindo a questão da sustentabilidade, vendo como se trata o lixo, se tem tratamento adequado, de que modo acontece o manejo da água e vários outros pontos. Isso precisa ser discutido entre os colegas, mas é trazer esses elementos, não só para um reconhecimento positivo - como os selos -, mas também pelo lado da fiscalização. Com isso a gente consegue direcionar a política para este fim.
DN: Um advento que está em vias de implementação é a Reforma Tributária, porque deve impactar diretamente a gestão dos municípios. Aqui no Estado, por exemplo, vemos uma dependência de muitos deles quanto ao repasse de recursos arrecadados mediante a cobrança de tributos federais. O TCE está acompanhando isso? De qual maneira?
Rholden: O Tribunal tem um setor muito importante, instituído durante a gestão do conselheiro Edilberto [Pontes], que é o monitor fiscal. E isso tem sido até replicado no Brasil inteiro. Ele acompanha vários pontos da gestão, como está a previdência, receita... já temos até estudos que podem ser consultados pelos cidadãos, um deles é sobre a reforma tributária, como ela vai impactar nos estados. É algo que o TCE está atento. Claro, é algo muito sensível, mas está sendo monitorado para ver como os estados e municípios irão reagir para manter o nível de arrecadação.
DN: Em 2024 nós teremos eleições municipais. Há alguma estratégia de julgamentos para o ano eleitoral? O que muda?
Rholden: Os julgamentos já seguem uma sistemática comum. Acho que o maior efeito nessas circunstâncias são das contas de governo, que são analisadas, a sociedade vê como ele gastou e vão depois para as câmaras municipais, que dão o parecer final. E nisso tudo a análise do Tribunal tem muito peso, porque é técnica. Temos tentado diminuir, desde que recebemos a extinção do TCM, o tempo que essas contas passam para ser julgadas. Ainda temos um estoque de contas antigas. Entretanto, fazemos o esforço de julgá-las logo no ano seguinte ao recebimento. Fazemos isso para que o cidadão tenha a condição de avaliar, no momento do voto, com a opinião bem fundamentada e técnica do Tribunal, se aquele gestor merece continuar à frente do Município, fazer seu sucessor ou decidir se a oposição tem razão.
DN: Temos acompanhado que o TCE tem feito um trabalho de prevenção de irregularidades nas prefeituras, evitando contratos irregulares e desperdícios. Essa prática será estimulada para o próximo biênio?
Rholden: Digo que o Tribunal avançou e tem avançado muito. Tenho que reconhecer o excelente trabalho do conselheiro Valdomiro. É nítido o avanço em todas as áreas, tanto na estrutura interna/administrativa quanto na fiscalização. Temos uma rotina muito proficiente e o TCE está atuando preventivamente nos municípios. Claro que isso é um ponto fora de dúvida. Vamos continuar atuando e, se possível, fazer mais. O que todos nós queremos é evitar o erro, porque depois que o leite foi derramado fica mais difícil. É só punir? Fazer a crítica e punir? Tudo bem que isso tem um efeito, mas não tanto quanto se agirmos antes.
DN: Quais são os desafios que estão em seu raio de visão, considerando a ocorrência deles em curto, médio e longo prazo?
Rholden: É difícil falar em longo prazo, porque são apenas dois anos. É muito rápido. Tenho a sorte de pegar um Tribunal que está bem montado. Isso facilita muito o trabalho. O que a gente precisa agora é dar a nossa visão. Pretendo ter como enfoque questões mais impactantes para a sociedade.