Após a declaração do senador Marcos do Val (Podemos-ES), que disse ter sido coagido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para se aliar a ele em um golpe contra o Estado, detalhes dessa conspiração foram revelados pela revista Veja, na manhã desta quinta-feira (2), e confirmadas pela Globonews e pelo g1.
Conforme veiculado na imprensa, a trama foi anunciada por Bolsonaro, no último dia 9 de dezembro, em reunião com Marcos do Val e com o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) — que foi preso nesta quinta.
Naquele dia, Lula ainda não havia sido diplomado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o até então presidente da República reapareceu em um breve pronunciamento no cercadinho do Palácio da Alvorada, após mais um mês recluso, sem admitir o resultado das eleições.
Após dizer que seu futuro dependia dos apoiadores e de exaltar sua ligação com as Forças Armadas, Bolsonaro participou da reunião, na qual revelou o plano para anular o resultado das eleições, impedir a posse de Lula e permanecer no poder.
Segundo a Veja, a trama — que recebeu apoio de um grupo muito restrito — consistia em: alguém de confiança do presidente se aproximar do presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, e, devidamente equipado para gravar as conversas do magistrado, captar algo comprometedor que servisse como argumento para prendê-lo. Esse seria o estopim que desencadearia uma série de medidas que provavelmente atirariam o País numa confusão institucional sem precedentes desde a redemocratização.
Detalhes dessa operação foram dados por Bolsonaro e Daniel Silveira ao senador Marcos do Val, que, dias depois, se recusou a participar do esquema, motivo pelo qual os planos não foram concretizados.
Plano que 'salvaria o Brasil'
A reunião com o presidente teria durado cerca de 40 minutos. No encontro, Silveira disse que o senador Marcos do Val era uma pessoa de sua confiança e pediu ao presidente que apresentasse a ideia que “salvaria o Brasil”.
Após explanar o plano de prender o ministro, impedir a posse de Lula e anular as eleições, do Val quis saber como isso seria feito. Bolsonaro, então, disse que os equipamentos de espionagem necessários seriam fornecidos após acerto dele com o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), órgão responsável pela segurança do presidente e que tem a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) sob seu organograma.
Caso aceitasse a missão, do Val ficaria com a tarefa de gravar Alexandre de Moraes. A escolha dele seria porque o senador conhecia o ministro há mais de uma década e poderia se aproximar dele sem levantar suspeitas. O senador pediu um tempo para pensar, mas, no dia seguinte, passou a ter a resposta cobrada por Daniel Silveira, via mensagens de texto.
Uma das mensagens acessadas pela Veja foi enviada por Marcos do Val a Alexandre de Moraes em 12 de dezembro. Nela, o congressista pede para falar pessoalmente com o magistrado, diante da gravidade do que havia tomado conhecimento. O encontro com o ministro foi agendado para dois dias depois.
No dia 14 de dezembro, na reunião agendada com Moraes, detalhou o plano. Somente na noite deste dia, após o encontro com o ministro, do Val respondeu às mensagens de Silveira. “Irmão, vou declinar da missão”, escreveu, sem dar maiores explicações. O deputado assentiu: “Entendo, obrigado”.
Procurado pela Veja para falar sobre o caso, o agora ex-deputado Daniel Silveira informou, via advogados, que estava impedido pela Justiça de falar com jornalistas. Ele foi preso nesta quinta, por determinação de Alexandre de Moraes. O ministro, também através da assessoria, disse que não comentaria o caso.
Jair Bolsonaro viajou para os Estados Unidos alguns dias depois da reunião no Palácio da Alvorada e não foi encontrado para falar sobre o caso.
Já Marcos do Val confirmou ter participado da reunião com o então presidente, admitiu ter ouvido os detalhes do plano e ter relatado a Alexandre de Moraes. Também nesta quinta-feira (2), o senador anunciou que renunciaria ao mandato. A Polícia Federal deve tomar depoimento de Do Val nos próximos cinco dias, após autorização de Moraes.
Mudou versão
Horas após a repercussão em rede nacional, porém, do Val alterou a primeira versão contada da história e suavizou a participação de Bolsonaro. Disse que o então presidente apenas "ouviu" o plano de Silveira e que iria pensar sobre.
Ele também se confundiu sobre o local da reunião com Bolsonaro e Silveira. Inicialmente, era no Palácio do Alvorada, a residência oficial do presidente. Depois, mencionou a Granja do Torto, residência de campo oficial.
O depoimento do senador à PF é necessário para que as autoridades investiguem as informações prestadas. Principalmente porque ele afirmou em suas redes sociais ter "informações relevantes" sobre a tentativa de golpe.