Lula x Bolsonaro: como a polarização política nacional pode impactar nas eleições municipais de 2024

Pleito deste ano também deve ter efeitos sobre a eleição do Congresso Nacional em 2026

Depois da acirrada disputa entre o presidente Lula (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em 2022, alguns dirigentes partidários, gestores públicos e parlamentares apostam no pleito municipal de outubro deste ano como uma espécie de “terceiro turno” entre as duas lideranças que mais arregimentam apoiadores no Brasil.

Para além do fortalecimento do petismo ou a manutenção do bolsonarismo, o pleito deve ter um efeito direto sobre as eleições parlamentares de 2026, ao menos é o que dizem analistas políticos ouvidos pelo Diário do Nordeste. No centro das atenções estarão os prefeitos, que movimentam bases locais e se aliam a parlamentares estaduais e federais — principalmente governistas — em busca de recursos para investimento nos municípios.

Para Emanuel Freitas, professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará, há uma expectativa de ambos os lados repetirem a polarização de 2018 e de 2022. Um dos casos citados pelo analista para reforçar essa tese é Fortaleza.

“O próprio caso do André Fernandes, que se apresentou naquelas peças publicitárias do ano passado como candidato do Bolsonaro, agora temos também o Evandro Leitão, que já apareceu em suas redes algumas vezes com o presidente Lula, desde que ele se filiou ao PT”, destaca.

“Então acho que, sim, será útil para ele e para a parcela da oposição repetir essa polarização, assim como para os partidos que estão fora dela também para acusar essa polarização como algo que não tem muito sentido para Fortaleza. De fato, os dois atores, Lula e Bolsonaro, deverão marchar, fazer campanha, gravar peças publicitárias e visitar as capitais, como é Fortaleza, se engajando totalmente nessa disputa"
Emanuel Freitas
Professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece)

Descrente de que a polarização possa chegar às pequenas cidades, a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres, considera que as capitais e grandes cidades podem ser tomadas pela nacionalização das disputas.

“Na política local, acredito que essa interferência não será tão grande, pelo menos não nos municípios médios e pequenos, mas talvez ela apareça nas capitais e em municípios maiores, com a população mais complexa. No geral, acredito que não vai ter tanto impacto porque o que conta nas eleições municipais é o buraco na rua, o posto de saúde sem médico, a escola que não abriu, a falta de iluminação na rua, são demandas mais do cotidiano e os eleitores estão cientes disso”, aponta.

“Me custa acreditar que a polarização se calcificou a esse ponto, eu acho que ela não terá tanta influência para as eleições municipais, pelo menos nos municípios de uma forma geral. Talvez, nas capitais, haja ali um ou outro nome que reforce, que puxe essa discussão, que tente nacionalizar o debate como tivemos na eleição para governador (do Ceará), mas eu acredito que, para as eleições municipais, o foco será o município, o cotidiano dos cidadãos”, conclui.

De olho nos municípios

Ainda no ano passado, o presidente Lula indicou que este ano o foco de seu Governo será nacional. Ao longo do ano passado, o petista visitou 19 estados brasileiros. 

"Se prepare, porque eu viajei muito para o exterior, em 2023, mas ano que vem quem tiver com saudade do Lulinha se prepare, porque eu e a Janja vamos percorrer esse País. Vou dar muito pulinho por aí, porque o país precisa de ânimo, de motivação", disse o petista durante live ainda no ano passado.

Na visita que fez a Fortaleza, no último dia 19 de janeiro, ele disse inclusive que iria separar uma semana para viajar pelo Brasil ao lado do ministro Camilo Santana. A meta do presidente é visitar todos os estados brasileiros ainda no primeiro semestre, cumprindo uma ampla agenda de entregas de obras, evitando que as inaugurações ocorram muitos próximas das eleições e possam sofrer limitações por conta da legislação eleitoral. O PT tem planos ambiciosos para ampliar o número de prefeituras sob seu comando, que em 2020 foram apenas 183, o pior resultado em mais de 15 anos.

Já o ex-presidente Jair Bolsonaro planeja começar, a partir de março, uma série de viagens pelo Brasil para apoiar pré-candidatos do PL. O roteiro do presidente, de acordo com interlocutores, deve começar no Sul, seguido do Centro-Oeste e do Norte do País. A meta do PL é chegar ao comando de mil prefeituras do Brasil. No último pleito, a sigla elegeu 349 prefeitos no Brasil.

No fim de janeiro, o ex-presidente lançou uma cartilha com temas obrigatórios para seus aliados nos municípios, incluindo combate ao aborto e à legalização das drogas e a defesa da liberdade de expressão e do armamento da população.

Impactos em 2026

Os parlamentares do Legislativo estadual e federal também irão acompanhar de perto o pleito deste ano.

“O Brasil sempre vive uma eleição pensando no que será a outra, em como a próxima eleição estará ligada a essa, dependente dessa. Desta vez, não será diferente, a eleição de vereadores e prefeitos é turbinada por verbas parlamentares, por prestígio de parlamentares e é disputada por parlamentares”, ressalta Emanuel Freitas, professor de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará.

O professor destaca que é com parte da influência de lideranças locais que parlamentares fortalecem suas bases nos pleitos seguintes, eleições essas que são fundamentais, no caso do Legislativo Federal, para a definição dos recursos partidários para disputar novas eleições.

“Servirá para os políticos medirem forças e, principalmente, para que os partidos com o número de assentos que conseguirem em cidades importantes, seja para a prefeitura, seja para o Legislativo, negociarem esses apoios aí para a eleição de 2026, especificamente para o cargo de senador, de deputado e de governador”, conclui.

Monalisa Torres, professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), também ressalta a importância deste pleito para as definições partidárias. 

“Os partidos precisam montar grandes bancadas na Câmara Federal porque isso reflete também no tempo de TV durante a campanha e nos recursos do fundo partidário, resulta em ampliação ou não dos recursos que o partido tem direito. E como é que isso é conquistado? A partir da eleição no maior número de parlamentares. E como é que isso tem relação com o nível local? Ora, se você tem um prefeito aliado, é esse prefeito que vai ser o intermediador na busca de votos para o parlamentar”, afirma.

“Ter prefeitos aliados agora e conquistar novos prefeitos em 2024 pode ser um importante ativo quando se pensa nas eleições de 2026 do ponto de vista de montagem da bancada, de uma base aliada maior que dê mais estabilidade para que o governo, seja ele estadual ou federal, tenha uma maior governabilidade. Obviamente, os partidos também estão interessados nisso, porque querem crescer (...) sobretudo no cenário em que temos regras eleitorais novas que estão enquadrando os partidos para que eles atinjam um determinado percentual de votação. Caso eles não consigam atingir esse percentual, correm risco de desaparecer”,
Monalisa Torres
Professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece)